Título: Pinheirinho ameaça lua de mel entre Dilma e Alckmin
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Fonte: Valor Econômico, 25/01/2012, Opinião, p. A10

No último domingo, a PM paulista amanheceu na área conhecida como Pinheirinho, no Vale do Paraíba, para executar um mandado de reintegração de posse decretado pela Justiça estadual. O que se viu nas horas e dias seguintes foram cenas de destruição, violência e oportunismo político capazes de abalar a lua de mel entre a presidente petista Dilma Rousseff e o governador tucano Geraldo Alckmin - mas também deixa lições e lança luzes sobre a relação direta da Presidência da República com os movimentos sociais.

O Pinheirinho é resultado da invasão de um terreno de 1,3 milhão de metros quadrados da massa falida do megaespeculador Naji Nahas. Tratava-se, portanto, da ocupação ilegal de uma propriedade que hoje pertence à massa falida e, portanto, aos credores de Nahas, ocorrida há oito anos sob a vista grossa das autoridades políticas.

Pinheirinho cresceu, ganhou equipamentos urbanos e abrigava uma população estimada em mais de 5 mil pessoas quando se deu a operação da PM. Evidentemente era uma operação de risco que precisava ser bem avaliada para evitar mais danos - além da perda do teto - a uma população já sofrida.

É preciso entender as causas do conflito para se evitar sua repetição. Na cena, a invasão cinematográfica da PM aparece em primeiro plano. Ao fundo, há personagens como o líder comunitário Valdir Martins, do PSTU. "Vamos nos organizar e fazer novas invasões", disse, ao constatar que a remoção era inevitável.

Mal explicada é a presença no local do secretário de Articulação Social da Secretaria Geral da Presidência da República, Paulo Maldos. Chefiada por Gilberto Carvalho, a Secretaria Geral é o órgão diretamente vinculado à Presidência da República encarregado da relação do governo com os movimentos sociais.

Maldos deveria deixar bem claro o que fazia em Pinheirinho. Era um militante ou servidor público em missão institucional? Qual era sua missão? Diz-se que o secretário tentava negociar uma solução pacífica para o conflito, o que na prática significava manter o "status quo" em Pinheirinho.

À primeira vista, Maldos, um servidor público federal, interferia na execução da ordem de reintegração, contra a decisão judicial e a favor dos invasores. Ação injustificável, mesmo admitindo-se que tenha havido excesso por parte da PM paulista. Maldos, aliás, foi atingido na perna por uma bala de borracha tucana.

Também é incompreensível a intervenção do chefe de Maldos, o ministro Gilberto Carvalho. Ele politizou a questão ao acusar a PM de transformar o terreno numa "praça de guerra".

"Eu não quero fazer uma crítica direta ao governo de São Paulo em respeito à autonomia [dos Estados]. Agora, definitivamente, esse não é o nosso método, o do governo federal", disse Carvalho. "Você provocar aquele trauma para devolver uma área para a massa falida de um grande especulador!".

Claro, o ministro não deixou de lamentar a "dor das famílias", como é de bom tom ao discurso político-oportunista.

Nunca é demais condenar a violência policial, seja ela de origem tucana ou petista; paulista ou carioca. Mas o que não se deve esquecer é que a decisão da Justiça deve prevalecer. De um modo geral, os especialistas concordaram que a ação de reintegração de posse ocorreu nos termos do ordenamento jurídico brasileiro, como é basilar no Estado de direito.

Talvez fosse o caso de se esperar uma decisão do Superior Tribunal de Justiça sobre a liminar concedida pela Justiça Federal sustando a reintegração, o que ocorreu já na noite de domingo: não sendo a União parte do processo, a competência de julgar era mesmo da Justiça estadual.

Como bem observou o professor de Direito Constitucional da PUC-SP, André Ramos Tavares, uma lição deixada por Pinheirinho talvez seja a de que a Justiça, nesses casos, precisa tomar providências com relação ao impacto social e procurar preservar as pessoas envolvidas nas decisões. A expectativa que fica é sobre o futuro da "parceria estratégica" entre Dilma e Alckmin em São Paulo, bombardeada pelo ministro Gilberto Carvalho sem que o governador tucano esboçasse maior reação.