Título: IPCA calculado com nova metodologia pode reduzir inflação, mostra estudo
Autor: Durão, Vera Saavedra
Fonte: Valor Econômico, 11/08/2006, Brasil, p. A4

A inflação de julho medida pelo IPCA, a ser divulgada hoje pelo IBGE, já será calculada pela estrutura de gastos de consumo da nova Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) 2002/2003. Até junho, o índice, juntamente com o INPC, era computado com base na pesquisa de 1995/1996. A mudança poderá beneficiar o IPCA do segundo semestre com redução entre 0,1 a 0,15 ponto percentual devido a pesos menores da carne e do álcool combustível, produtos normalmente sujeitos a reajustes nos últimos quatro meses do ano por causa da entressafra.

A avaliação feita por Elson Teles, economista-chefe da Concórdia Corretora de Valores faz parte de um estudo sobre o impacto da nova POF na inflação. Segundo ele, a queda estimada para o segundo semestre não deverá ser captada em julho. Na projeção da Concórdia, o IPCA do mês passado fechará com alta de 0,15% a 0,18%, ante uma deflação de 0,21% em junho. A elevação da taxa mensal é atribuída pelo economista ao fim da deflação dos grupos de alimentação e transportes, destacando frutas e combustíveis. Na nova POF as frutas dobraram de peso, a gasolina ampliou sua ponderação e o gás veicular foi incluído na cesta do IPCA.

As principais mudanças nos pesos dos produtos que compõem a cesta básica do IPCA (que abrange famílias com renda de 1 a 40 mínimos), ocorreram pela incorporação à POF de novos hábitos de consumo da população, que alteraram a composição do orçamento doméstico. O brasileiro passou a gastar mais com DVDs, acesso à internet, cursos variados (pós-graduação, seletivo, preparatório, de idiomas, de informática), ginástica, despesas com manutenção e pequenos reparos na moradia (material de construção e serviços de mão-de-obra), comida fora de casa e compra de carro.

Nas contas de Teles, o grupo alimentação e bebidas perdeu 0,8 ponto percentual, transportes caiu 1,5 p.p. e habitação encolheu 3 p.p. Os que ganharam peso foram educação (2,1 p.p.), comunicação (2,6 p.p.) e vestuário (1 p.p.). Os demais não apresentaram alterações significativas.

O menor peso das despesas com alimentação no domicílio (menos 2,5 p.p.) resultou de maiores gastos com refeições fora de casa (mais 1,7 p.p.). O aluguel residencial também reduziu sua fatia no bolso das famílias em 1,1 p.p. e o imposto predial foi retirado do cálculo da inflação, ajudando a retrair a participação do grupo habitação no índice. O grupo transportes foi impactado para baixo com o crescimento da ponderação do carro próprio e diminuição das despesas com transporte público, no caso o ônibus urbano. Ainda neste grupo, a gasolina ganhou peso (0,3 p.p.) e o álcool combustível perdeu (menos 0,8 p.p.).

As alterações nos pesos dos produtos do IPCA causarão impacto direto na classificação adotada pelo Banco Central - de preços livres e administrados - , para medir o comportamento do índice. No caso, o BC terá de recalcular a participação dos dois tipos de preços na inflação. Teles procurou se antecipar à autoridade monetária. Ele prevê elevação da participação dos preços livres na nova estrutura, de 66,4% para 69% e, conseqüentemente, declínio do peso dos administrados, de 33,6% para 31% do total.

A mudança dos preços livres vai refletir principalmente o aumento da fatia dos serviços nos gastos familiares. Nas contas de Teles, os produtos não transacionados no exterior vão ampliar sua presença (ponderação) de 31,2% para 35,3%. Os itens que podem ser negociados com o exterior (também dentro dos preços livres) vão pesar menos, caindo de 35,1% para 33,6%, empurrados pela queda da ponderação do subgrupo alimentação no domicílio (que encolhe de 13,5% para 10,9% na nova estrutura de consumo das famílias).

Teles destaca que o IPCA passará a ser menos vulnerável ao câmbio e mais influenciado pelos serviços. "O 'pass-through' (coeficiente de repasse da variação na taxa de câmbio sobre a inflação) será menor nessa nova estrutura", diz. E adverte que poderá haver maior pressão dos serviços sobre a inflação se a atividade econômica apresentar forte recuperação.