Título: Comício só com políticos esfria ato petista em SP
Autor: Felício, César
Fonte: Valor Econômico, 07/08/2006, Política, p. A6

O fim dos showmícios , decretado pela mini-reforma eleitoral deste ano, mostrou neste final de semana a sua marca nos eventos públicos dos candidatos. Em seu primeiro comício em São Paulo, no bairro de São Mateus, no extremo da Zona Leste, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reuniu pouca gente em seu maior reduto paulistano.

O bairro de São Mateus serve como local de moradia para vários trabalhadores na região do ABC e acompanha o padrão de voto de Diadema, município próximo desta região da Zona Leste: o PT foi o mais votado em todas as eleições na localidade desde 1990, inclusive as eleições presidenciais de 1994 e 1998, vencidas nacionalmente pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e as municipais de 1992 e 1996, ganhas pelo malufismo. Em 2002, Lula teve na região 57% dos votos , seu melhor resultado em uma zona eleitoral paulistana. Em segundo lugar ficou Anthony Garotinho (PSB), com 17% e em terceiro José Serra (PSDB), com 16%. Em 2004, na eleição municipal, Marta Suplicy (PT) ganhou de Serra no bairro no primeiro e no segundo turno. Seus 400 mil moradores sobrevivem com metade da renda média da população paulistana.

A identificação do bairro com o PT é tão forte que foi no mesmo Largo de São Mateus do comício de sábado que Lula fez seu primeiro ato na campanha estadual em 1982, quando disputou o governo paulista. Mas neste final de semana, os comerciantes , consumidores e camelôs do grande mercado a céu aberto ao longo da avenida Mateo Bei não acorreram para escutar os discursos do presidente do PT, Ricardo Berzoini, da Câmara dos Deputados, Aldo Rebelo (PC do B-SP), da ex-prefeita Marta Suplicy, do senador Eduardo Suplicy, do candidato do PT ao governo paulista Aloizio Mercadante e do próprio Lula, entremeados pelas gravações das músicas da campanha de Lula e de Mercadante. Uma caminhada dos candidatos pela artéria comercial do bairro foi cancelada "para evitar tumulto", segundo informou a assessoria de imprensa do petista.

A diferença em relação a campanhas do passado é brutal: em 2004, a então candidata à reeleição Marta Suplicy chegou a reunir 80 mil pessoas na periferia da Zona Sul paulistana em um showmício com Zezé di Camargo & Luciano e Wanessa Camargo, em setembro. Em 2002, neste mesmo mês, Lula, alavancado por Zezé di Camargo & Luciano, levou 100 mil pessoas ao Farol da Barra, em Salvador.

Neste final de semana, Lula reuniu 2,8 mil pessoas no ato de São Mateus e aproximadamente o mesmo número no comício em Governador Valadares (MG). Em Sergipe, no município de Nossa Senhora da Glória (SE), o candidato tucano Geraldo Alckmin falou no sábado para 200 pessoas. Em Delmiro Gouveia, no agreste alagoano, a terceira colocada nas pesquisas, Heloisa Helena (P-SOL) reuniu quinhentos conterrâneos em uma cavalgada.

A maior parte do público concentrado no Largo visivelmente era formada por militantes de várias partes da cidade e da região metropolitana :vários grupos traziam faixas de candidatos de outras regiões , como João Paulo Cunha (Osasco) e Jilmar Tatto (periferia da zona Sul). Predominavam ex-assessores de Marta Suplicy que disputam uma cadeira na Câmara dos Deputados ou na Assembléia Legislativa.

A platéia não conseguiu lotar a praça: enquanto o presidente da República discursava, um homem dormia, estirado debaixo de uma árvore , a cerca de 50 metros do palanque. Ao lado, crianças brincavam em gangorras e balanços. Do outro lado da avenida, pessoas na calçada observavam de longe o falatório. O trânsito não chegou a ser interrompido.

Na véspera do comício na Zona Leste, Lula participou de jantar de arrecadação para a campanha no Jockey Clube, na zona sul de São Paulo, com 700 convites vendidos, entre mil oferecidos, a R$ 2 mil cada. O presidente sinalizou mensagens diferentes para seus financiadores na área nobre da capital e seus eleitores na periferia. Para os primeiros, prometeu austeridade nas contas públicas.

"Não fiz todo o sacrifício do ajuste, neste meu primeiro mandato , para, na hipótese de ser reeleito, começar um segundo mandato jogando fora as conquistas do Brasil. Sei que, pela nossa dívida alta e pela nossa história de fragilidade econômica e de muitas crises, teremos ainda que continuar fazendo determinados esforços", afirmou aos pagantes.

Para os segundos, indicou que o governo ampliará despesas na área social. "Tem gente que confunde investimento com gasto", afirmou, comentando em seguida que o governo de São Paulo deveria ter gasto mais na gestão de seu adversário, o tucano Geraldo Alckmin. "Se São Paulo tivesse investido no social como o seu Orçamento certamente permite, hoje seria um orgulho nacional, mas não é isso que vemos",disse.(com agências noticiosas)