Título: Presidente tenta conter insatisfação do PMDB
Autor: Costa, Raymundo
Fonte: Valor Econômico, 07/08/2006, Política, p. A6

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu para o PMDB governista apresentar um modelo de "coalizão de governo" a ser adotado em eventual segundo mandato. Trata-se de uma resposta de Lula à crescente insatisfação demonstrada pelo grupo pemedebista, que se vê como um ator secundário na campanha do presidente, embora faça parte de seu conselho político, e começa a desconfiar de que outra vez o PT não deixará que o partido exerça um papel central no próximo governo, como prometido.

A manifestação mais visível desse descontentamento ocorreu com a ausência de Renan Calheiros na última reunião do conselho político da campanha. O pemedebista justificou a falta por ser presidente do Senado, muito embora tenha participado de outras reuniões, nessa mesma condição. O representante do PMDB foi o deputado Jader Barbalho (PA). O ex-presidente José Sarney também participa - a idéia é estabelecer um rodízio.

A confirmação de Agenor Álvares no Ministério da Saúde, cargo reivindicado pelo PMDB, não chegou a causar maior comoção no grupo "pró-Lula", como os governistas se denominam, mas acendeu uma luz de alerta em relação ao comportamento do PT no futuro. A avaliação é que o partido deve deixar a negociação de espaço no próximo mandato para depois da eleição, quando, segundo acreditam, o PT sairá enfraquecido e o PMDB fortalecido no Congresso. Logo, com maior poder de fogo para negociar.

O grupo não tem queixas de Lula, mas do PT, partido que teria ficado "catatônico" depois de se envolver no mensalão. Tem várias críticas à campanha, como a preocupação que julgam excessiva com a candidata Heloísa Helena (P-SOL). Na avaliação dos pemedebistas, o voto de HH é o do eleitor descontente que não aceita o tucano Geraldo Alckmin. Ao atacar a senadora, por esse raciocínio, a campanha de Lula poderia ofender o eleitor de Heloísa Helena, que pode ser necessário, se a eleição tiver segundo turno.

O PMDB "pró-Lula" também detecta um movimento do PT para "reinventar o governo" durante a campanha, como a apresentação de um programa mirabolante de governo, quando bastaria a Lula, na opinião do grupo, ter um programa eleitoral, dizer o que fez até agora e o que pretende fazer num segundo mandato. "Lula não é um candidato comum. Ele é o presidente da República", diz, por exemplo, Jader Barbalho. O grupo defende também que o PT saia da defensiva e passe a questionar a autoridade da oposição na questão da ética.

Nesse quadro é que Lula encomendou um modelo de "coalizão" aos pemedebistas. O grupo ainda não tem idéia clara sobre a proposta a ser apresentada, mas pensa em algo como a Concertación chilena, a frente de centro-esquerda que governa o Chile desde a queda do regime ditatorial do general Augusto Pinochet. Ou como o acordo entre partidos que permitiu a formação do governo da chanceler Angela Merkel, na Alemanha, depois de uma eleição em que nenhum dos partidos conseguiu maioria no Parlamento.

O PMDB deve estudar também outras experiências. Entre elas, o Pacto de Moncloa, por meio do qual se deu a transição do franquismo para a democracia, na Espanha. Mas neste caso envolveu todos os partidos, inclusive os da oposição. Não é o caso do modelo a ser engendrado pelos pemedebistas, que pensam na formação de uma frente de centro-esquerda com os partidos que apóiam Lula formal e informalmente, a exemplo do próprio PMDB e do PSB, aliado tradicional de Lula mas que está fora da coligação oficial.

Segundo Renan Calheiros, o PMDB pretende apresentar a Lula um "modelo programático de coalizão, onde sejam ressaltados os interesses do país". Assim como compromissos com a estabilidade econômica e um "crescimento econômico mais significativo". A co-responsabilidade no governo seria estabelecida a partir desse documento. Ou seja, a divisão do espaço, que, de acordo com Renan, "deve ser conseqüência, jamais um pressuposto". Para o presidente do Senado, a relação atual do PMDB com o governo, da simples indicação de cargos, "é um modelo definitivamente esgotado".