Título: Draghi sinaliza BCE mais ativo e proposta de novo tratado sai na 2ª
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Fonte: Valor Econômico, 02/12/2011, Finanças, p. C2

A um mês no cargo, o novo presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi, sinalizou ontem que está pronto para adotar medidas adicionais para enfrentar a crise da dívida da zona do euro, afirmando que os riscos à economia aumentaram e as pressões sobre o setor bancário são um mau prenúncio para os próximos meses. Em discurso no Parlamento Europeu, Draghi deu a entender que se os governos da região costurarem uma nova aliança fiscal, a autoridade monetária poderá desempenhar um papel mais abrangente no encaminhamento de uma solução, recomprando bônus e aliviando a política monetária.

O presidente da França, Nicolas Sarkozy, por sua vez, prometeu para segunda-feira uma proposta detalhada para mudar o tratado da União Europeia. Entre as reformas que serão apresentadas juntamente com a primeira-ministra da Alemanha, Angela Merkel, em Paris, estarão regras orçamentárias mais rígidas e sanções automáticas para países que não respeitarem os preceitos definidos dentro da união monetária.

"A França, junto com a Alemanha, vai propor um novo tratado europeu para refundar e repensar a organização da Europa", disse o presidente francês. "Se queremos que o euro sobreviva, não temos escolha: precisamos contrapor uma solidariedade perfeita contra todos aqueles que duvidam da viabilidade do euro e especulam sobre a sua fragmentação", disse.

O presidente francês disse que o processo de reforma "será longo e difícil", mas necessário para proteger o lugar da Europa no mundo. Qualquer mudança no tratado europeu terá de ser aprovado por todos os 27 membros da UE, sendo que dez países não usam o euro.

Sarkozy confirmou que o BCE vai desempenhar um papel vital no enfrentamento da crise. Embora tenha destacado a independência do banco, o presidente francês sugeriu que a instituição vai adotar medidas para evitar uma brutal recessão. "Eu estou convencido que, diante do risco deflacionário ameaçando a Europa, o BCE vai agir", disse o presidente francês.

Mais cedo, destacando a iniciativa do BCE e outros bancos centrais na quarta-feira, para fornecer liquidez em dólar ao mercado, Draghi disse que o BCE quis se certificar de que a inflação não saiu fora da meta (para mais ou para menos), de pouco menos de 2%.

Para o mercado, isso e os alertas de agravamento das perspectivas econômicas apontam para um segundo corte nas taxas de juros oficiais na reunião de política monetária do BCE na semana que vem. Essa perspectiva derrubou a cotação do euro ontem.

"A política monetária do BCE é constantemente guiada pela meta de manutenção da estabilidade dos preços na área do euro no médio prazo - e isso se aplica à estabilidade dos preços nas duas direções", disse Draghi. "As perspectivas negativas para a economia aumentaram."

Draghi observou que estava falando num período pré-reunião do BCE e suas palavras não deveriam ser interpretadas em termos de decisões futuras de política monetária. Mas muitos investidores interpretaram os comentários como uma maior chance de um corte nas taxas de juros na semana que vem, sobre o qual os analistas estão divididos. O BCE cortou o juro referencial para 1,25% no mês passado.

"Os comentários abrem a possibilidade de um corte dos juros", disse Jeremy Stretch, diretor de estratégia de câmbio da CIBC World Markets. "Na semana que vem teremos as previsões do staff do BCE e certamente teremos uma queda substancial nas previsões de crescimento e inflação. Tudo isso leva a expectativas de um corte no juro pelo BCE e uma extensão de medidas heterodoxas. Os mercados ficarão muito frustrados se não tiverem isso na semana que vem."

"Acho que os próximos dias serão muito importantes para nos dizer se progredimos nisso", acrescentou Draghi posteriormente, pressionando os líderes da União Europeia (UE) para que cheguem a um acordo na reunião crucial que promoverão em 9 de dezembro. Alemanha e França prometeram apresentar propostas para uma maior integração fiscal da zona do euro na reunião - que ocorrerá um dia após a próxima reunião do BCE.

Ao dizer que "outros elementos poderão se seguir", Draghi pareceu deixar aberta a possibilidade de uma atuação maior do BCE no combate à crise, que está fazendo os investidores fugirem do mercado de bônus da zona do euro, alimentando dúvidas em relação à sobrevivência da moeda única. O BCE até agora resistiu às pressões políticas de alguns países para intensificar seu programa de compra de bônus (SMP, na sigla em inglês), para reduzir as pressões sobre os governos que estão sendo mais prejudicados pela crise.

"Em suas observações sobre o SMP, Draghi pareceu apoiar implicitamente a proposta de um ritmo significativamente maior nas compras de títulos de dívida sob o SMP e outras potenciais medidas, desde que os governos da zona do euro se comprometam com um novo pacto fiscal", escreveu Callow em uma nota a investidores. Draghi disse que o plano de compra de bônus é um meio de "reparar os canais de transmissão monetária", acrescentando que: "Em nosso ponto de vista, a coisa mais importante a ser feita agora pelo BCE é reparar o canal de crédito".

Uma pesquisa do BCE divulgada separadamente, ontem, mostrou que as pequenas e médias empresas da zona do euro acreditam que seu acesso aos empréstimos bancários vai piorar no futuro próximo. Embora tenha sido a primeira participação de Draghi em uma sessão plenária do Parlamento Europeu, poucos de seus 736 parlamentares compareceram.

Para os que estiveram presentes, Draghi emitiu uma mensagem sóbria sobre as perspectivas econômicas: "Temos observado um sério aperto de crédito no período mais recente, o que combinado com o enfraquecimento do ciclo dos negócios não é um bom prenúncio para os próximos meses", disse ele.