Título: EUA culpam países em desenvolvimento por impasse em Doha
Autor: Balthazar, Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 10/07/2006, Brasil, p. A4

Os Estados Unidos atribuíram no fim da semana passada grande parte da responsabilidade pelo impasse nas negociações da rodada Doha de liberalização do comércio mundial aos países em desenvolvimento, devido à maneira como eles têm hesitado em ampliar a abertura de seus mercados para produtos industriais e serviços estrangeiros.

Países como o Brasil e a Índia resistem a avançar nesse campo porque muitas de suas indústrias teriam problemas com o aumento na competição com os estrangeiros. Além disso, eles querem que americanos e europeus eliminem as barreiras que travam o comércio agrícola antes de exigir novas concessões dos países em desenvolvimento.

Para a representante comercial dos Estados Unidos, Susan Schwab, países mais avançados como o Brasil, a Índia e a China "gostariam de se esconder atrás dos menos desenvolvidos e mais pobres" para evitar concessões e assim manter seus mercados protegidos contra a concorrência estrangeira.

Ela se referiu com ironia aos críticos, que consideram tímida a posição americana nas negociações e exigem avanços na área agrícola. "Talvez o resto do mundo esperasse que os Estados Unidos aparecessem oferecendo mais em agricultura e recebendo menos em termos de abertura de mercados", disse. "Não há equilíbrio nessa equação."

Schwab reconheceu as dificuldades políticas que os países envolvidos nas negociações de Doha têm enfrentado para fazer concessões e conciliar interesses econômicos divergentes em casa. "Não estou levantando questões sobre os motivos de qualquer um dos nossos parceiros comerciais, porque sei que o que eles estão fazendo é tão difícil para eles politicamente quanto é para nós", disse.

Mas ela argumentou que só será possível vencer a oposição dos grupos prejudicados construindo um acordo que compense o prejuízo com vantagens substanciais para outros setores. Foi uma maneira de dizer que ela só poderá driblar a resistência que o Congresso americano impõe na área agrícola se o acordo incluir uma maior abertura dos mercados em outras áreas.

Schwab disse ter esperança de que o encontro de líderes mundiais marcado para a semana que vem em São Petersburgo, Rússia, abra caminho para desfazer o impasse. A Rodada Doha será um dos temas principais da reunião do G-8, grupo que reúne Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão, Reino Unido e Rússia.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o primeiro-ministro indiano, Manmohan Singh, foram convidados para participar das conversas.

"Não se pode negar o valor de ter seu líder dizendo, volte à mesa de negociações e termine esse trabalho", disse Schwab. Mas ela reconheceu que, mesmo que se alcance algum resultado em São Petersburgo, será preciso resolver muitos detalhes técnicos antes de concluir as negociações.

Outra razão para esperanças, segundo ela, vem das conversas que ela teve durante a última reunião de nível ministerial em Genebra, onde fica a sede da Organização Mundial do Comércio (OMC). "Há uma diferença entre a retórica em público e as conversas privadas", afirmou Schwab. "Acredito que há potencial suficiente para fazer um bom acordo, mas não é fácil."