Título: Reforma universitária propõe autonomia sob rédeas curtas
Autor: Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 10/07/2006, Especial, p. A12

Após três anos e meio de discussão, o governo conseguiu encaminhar ao Congresso um projeto de reforma universitária. Porém, com a proximidade das eleições e o grande número de emendas (368), dificilmente o texto será aprovado em 2006. Para especialistas em educação, a reforma não resolve tudo, como alardeia o Executivo.

A proposta tem três eixos: marco regulatório, autonomia econômica com base em financiamento consistente e consolidação da responsabilidade social da educação superior. O MEC se compromete a aplicar nas universidades federais pelo menos 75% da receita constitucionalmente vinculada à manutenção e desenvolvimento do ensino, por dez anos. Esse investimento será definido com base em critérios. "Serão levados em conta o desempenho em avaliações do MEC, produção científica, relação alunos/docentes e inclusão social", diz o ministro Fernando Haddad.

Para o especialista em educação Claudio Moura Castro, não adianta só falar de novos recursos. "Nossas universidades estão defasadas. O Brasil tem só uma universidade internacional numa lista de 400, a USP". Além disso, o intercâmbio de professores é ínfimo. "Formamos 10,5 mil doutores por ano e apenas 2 mil saem do país". Some-se a isso a insistência em cursos de longa duração. "O mercado exige profissionais formados com mais agilidade". Para ele, "os pontos críticos do ensino superior não estão contemplados".

O candidato do PDT à Presidência, Cristovam Buarque, também acredita ser fundamental uma maior interdisciplinaridade. "O mundo atual apresenta profissões que requerem habilidades de dois, três cursos. Eles não podem ser estanques, deveriam ser temáticos. Se a universidade não oferecer essa concepção, estará transferindo essa missão ao mercado de trabalho".

Para a ex-presidente da Associação Nacional dos Docentes de Ensino Superior, Marina Barbosa, o governo anuncia uma proposta de autonomia, mas mantém as universidades federais sob rédeas curtas. "O governo manteve a lista tríplice para que o presidente escolha o reitor. É um atraso". Nem mesmo a suposta autonomia financeira agrada a entidade. Estima-se, com a reforma, a injeção de R$ 7,2 bilhões nas universidades. "O governo propõe uma reforma para dar autonomia e sinaliza um repasse menor que o atual".

Outro ponto que assusta os profissionais da área é a propaganda sobre a expansão da rede universitária. "A maioria das universidades já existe, estão só mudando de nome, ou inauguram pedras fundamentais", critica Moura Castro. Marina denuncia que as federais existentes são obrigadas a ceder professores para as futuras extensões universitárias. "Nosso déficit de profissionais já é grande. Agora, fica maior ainda".

As quatro universidades anunciadas são: Recôncavo Baiano, ABC (SP), Dourados (MT) e Pampa (RS). Seis faculdades foram transformadas em universidades: Semi-Árido (RN), Vale do Jequitinhonha (MG), Triângulo Mineiro, Alfenas (MG), Ciências da Saúde (RS) e Tecnológica (PR).

Um dos pontos mais polêmicos da reforma, a definição de cotas para negros e alunos de escola pública, ficou de fora. Até o último momento a medida estava prevista, mas o MEC recuou e deixou que cada universidade defina sua política. (PTL)