Título: BCE deve manter juro num momento em que euro fraco estimula economia
Autor: Atkins ,Ralph
Fonte: Valor Econômico, 12/01/2012, Finanças, p. C2

Não espere que Mario Draghi, o presidente do Banco Central Europeu (BCE), vá dizer isso depois da reunião de definição da taxa de juros de hoje, mas a zona do euro está sendo significativamente ajudada pela fragilidade da moeda. Novas quedas serão bem-vindas pelas empresas de toda a região, de 17 países.

As taxas de câmbio são indicadores importantes do grau de confiança nos sistemas econômicos, governos, políticos - e dirigentes de bancos centrais. A queda do euro, que se acelerou no fim de 2011 e se manteve no novo ano, equivale a um voto de não confiança da parte dos mercados financeiros na capacidade dos líderes da zona do euro de administrar crise da dívida da região, em escalada.

No entanto, embora se preveja que o BCE manterá sua taxa referencial de juros em 1%, e se absterá de tomar novas providências para gerenciar a crise, a queda do euro pode estar atenuando o que poderia ser uma prolongada e profunda recessão da zona do euro. Principalmente no sul da Europa, onde as medidas de austeridade fiscal estão restringindo a demanda interna, o impulso aos exportadores pode ter chegado na hora certa.

A queda do euro foi modesta, do ponto de vista histórico. Mesmo depois dos últimos recuos, que o levaram a recordes de baixa em 16 meses no câmbio com o dólar, o euro segue significativamente mais valorizado em relação à divisa americana do que antes do fim da crise financeira, em meados de 2007. Sua fragilidade se reduz a nada comparativamente aos primeiros anos após o lançamento da moeda, em 1999, quando a moeda única despencou aceleradamente para níveis inferiores à paridade de 1 para 1 em relação ao dólar.

No entanto, o impulso dado às perspectivas de crescimento da zona do euro pode se revelar significativo.

No câmbio com o dólar, o euro caiu cerca de 14% desde seu pico. Em termos ponderados pelo comércio exterior, a queda foi menor, de cerca de 8%, mas suficiente para fazer diferença. Um cálculo aproximado é de que uma queda ponderada pelo comércio exterior de 10% no valor do euro aumenta o crescimento da economia da zona do euro em pouco menos que 1 ponto percentual, com o início desse efeito começando a ser sentido depois de seis meses. Para alguns países da zona do euro, isso pode ser suficiente para fazer frente ao impacto negativo das reduções dos gastos públicos e das elevações dos impostos.

No entanto, essa ajuda pode não estar indo para onde é mais necessária. A Grécia enfrenta problemas de competitividade e de ordem fiscal profundamente arraigados, que um euro depreciado praticamente não alterará. Um dos principais beneficiários, em vez dela, será a Alemanha, que exporta o equivalente a 50% de seu PIB.

O resultado pode ser um avanço do ressentimento nos outros países da zona do euro. Embora Berlim esteja concordando a contragosto em ajudar os países mais fracos da união monetária, a economia da Alemanha voltou a lucrar com a sua crise - as empresas e consumidores do país também estão se beneficiando das taxas de juros excepcionalmente baixas, com escassos indícios de um grave "aperto do crédito".

Mas os efeitos podem ser maiores na Itália, onde o sucesso do novo governo em tirar o país de sua crise pode se mostrar decisivo para o futuro da zona do euro. Embora respondam por uma participação menor no PIB do que na Alemanha - menos de 30% -,as exportações da Itália são mais sensíveis à taxa de câmbio do euro, o que reflete as desvantagens de custo da Itália e os tipos de produtos que exporta.

A magnitude do impulso total à economia da zona do euro vai depender, em grande medida, das iniciativas do BCE e das percepções sobre sua disposição em tomar providências excepcionais para sustentar o crescimento da zona do euro. O euro caiu pressionado pelas expectativas dos mercados financeiros de que Draghi vai reduzir a taxa de juros oficial mais do que seu predecessor, Jean-Claude Trichet, que nunca permitiu que a taxa referencial do banco caísse para níveis inferiores a 1%.

Alguns economistas consideram que Draghi terá de ir mais longe - e abrandar a política monetária do "afrouxamento quantitativo" ("quantitative easing") de estilo americano ou britânico a fim de evitar que a zona do euro mergulhe numa espiral deflacionária.

Mas a queda do euro poderá se interromper se a desaceleração da economia da zona do euro se mostrar menos severa do que normalmente se prevê, ou se o BCE for percebido como hesitante em suas medidas de combate à crise, principalmente em comparação com o Federal Reserve, dos EUA.

Por enquanto, o impulso dado pelo euro depreciado na zona do euro não vai pesar sobre o destino da união monetária. Mas qualquer pouquinho ajuda.