Título: Apesar das críticas de setores do PT, Lacerda mantém boa avaliação
Autor: Moura,Marcos
Fonte: Valor Econômico, 06/01/2012, Política, p. A6

O prefeito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda (PSB), entra em seu último ano de mandato com o caminho aberto para a reeleição. Pesa a seu favor o fato de ele praticamente governar sem oposição, de que deverá novamente ter PSDB e PT ao seu lado e de que sua imagem perante boa parte do eleitorado é bastante positiva. O andamento das obras para a Copa também parece ajudar a colar nesse ex-empresário que nunca havia tido um cargo eletivo a estampa de gestor público eficiente.

Críticos, no entanto, dizem que apesar de estar num partido socialista, Lacerda enfraqueceu os instrumentos de participação popular presentes nas gestões de governos anteriores. Dizem também que, no melhor estilo de políticos tachados de direitistas, o prefeito põe o interesse público em risco com o seu projeto de atrair a iniciativa privada para gerir com a prefeitura escolas e postos de saúde municipais.

Em dezembro, Lacerda foi apontado como o prefeito mais bem avaliado pelos eleitores em uma pesquisa do Ibope encomenda pelo Grupo Bandeirantes de Comunicação. De nove prefeitos, Lacerda foi o que teve mais avaliações ótimo e bom, 54%, seguido por seu colega de partido, Luciano Ducci (Santa Catarina) e pelo pemedebista Eduardo Paes (Rio), ambos com 46%. A mesma pesquisa apontou que 68% contra 24% dos entrevistados em Belo Horizonte aprovam o governo de Lacerda.

Sua popularidade já o coloca no centro de cálculos partidários e de especulações para as eleições para governo do Estado de 2014. A sensação de muitos no meio político e empresarial em Belo Horizonte é que em 2012 a fatura já está liquidada pelo prefeito.

Nas propagandas da prefeitura na TV, a ênfase nos últimos meses tem sido as obras. Algumas sem uma relação direta com a Copa, como a ampliação de avenidas e estruturas para contenção de enchentes. Para a Copa, dos 54 projetos, 8 se destacam como os mais caros e visíveis. Trata-se da construção de um conjunto de corredores de ônibus (os BRT, bus rapid transit, como os de Curitiba e São Paulo) e a reforma de ruas e avenidas importantes da cidade. A conta dessas oito intervenções é de R$ 1,38 bilhão. A maior parte disso, R$ 1,023 bilhão, foi financiada pelo governo federal via o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para a mobilidade urbana. Como contrapartida, Estado e município arrematam os investimentos com um total de R$ 365,5 milhões.

Um dos slogans da publicidade oficial é "BH nunca viu tanta obra assim". Lacerda assumiu com um orçamento de R$ 6,17 bilhões e chega ao seu último ano com uma proposta orçamentária de R$ 8,66 bilhões.

O prefeito gaba-se de que a capital mineira foi a primeira cidade-sede da Copa a assinar com o governo federal a tomada de um empréstimo para as obras. Isso aconteceu em junho de 2010, no ano seguinte à escolha da cidade. Outra marca alardeada pela prefeitura é que das obras financiadas pelo PAC para mobilidade nas cidades-sede, nove estavam em andamento neste fim de ano - cinco delas em Belo Horizonte.

Até outubro, quem presidia o comitê executivo da Copa na cidade era Tiago Lacerda, filho do prefeito. O Ministério Público argumentou que se tratava de um caso de nepotismo, mesmo que o rapaz tivesse aberto não do salário do cargo. Tiago acabou renunciando. Lacerda assumiu o posto, num episódio que parece não ter causado grandes estragos à imagem do prefeito.

Mas além das obras relacionadas à Copa, Lacerda conseguiu no ano passado um impulso para outro projeto: o metrô. Há duas décadas, a ampliação do curto trecho de metrô de superfície da cidade era um assunto que vinha sendo objeto de promessas de governos e de cobrança dos belo-horizontinos. Em setembro o governo federal anunciou a liberação de R$ 3 bilhões para o projeto. A prefeitura diz que as obras poderão começar em 2012. Se avançarem, será mais um trunfo que tende a dar pontos extras a Lacerda em sua campanha pela reeleição.

Mas se as obras ajudam sua imagem com uma fatia do eleitorado, Lacerda é fartamente criticado por alas do PT descontentes com o que consideram ser um governo conservador e privatizante. Uma das críticas é em relação à suposta falta de diálogo com setores da sociedade. Os antigos conselhos setoriais perderam espaço. E embora o Orçamento Participativo (OP), marca do PT, continue em seu governo, petistas dizem que na prática o processo também tem sido esvaziado. Um exemplo, afirmam, foi o fim do OP para a habitação logo no início do mandato de Lacerda. O resultado, apontam os críticos, está nas ocupações de prédios e terrenos. Seriam 6 mil pessoas vivendo em áreas ocupadas atualmente.

Para os críticos no PT, outro pecado de Lacerda é o que consideram ser a visão privatizante de seu governo. Uma ala do partido condena como um grave equívoco o projeto do prefeito de tentar atrair empresas privadas para, por meio de parcerias público-privadas (PPPs), construir e ampliar escolas e postos de saúde da cidade. O projeto prevê que um investidor privado construa e opere serviços não pedagógicos de 32 Unidades Municipais de Ensino Infantil (Umeis) e 5 escolas municipais de ensino fundamental. Na saúde, a mesma receita. Com o edital publicado no dia 30, a prefeitura busca empresas privadas para construir ou reformar 168 unidades primárias de saúde e para gerir funcionários que não sejam os da saúde. É privatização da educação e da saúde como poucos governos de direita ousaram fazer, dizem críticos do prefeito.

Um dos lemas de campanha de Lacerda, eleito em 2008, era "continuar e melhorar". Numa referência à gestão de Fernando Pimentel (PT) que o antecedeu. Em seu programa de governo, Lacerda prometia atuar em 12 áreas - saúde, educação, mobilidade, segurança, sustentabilidade, cultura, entre outras. A prefeitura mantém um site em que discrimina os estágios de todas elas. Na saúde, por exemplo, mostra as obras de um hospital que terá 300 leitos prometido este ano; na educação, o aumento de 15 mil para 43 mil o número de alunos em escolas com período prolongado de nove horas; na construção de moradias populares, a prefeitura admite ter erguido até 2011 apenas a metade das 6,7 mil unidades a que se propunha até este ano; na desburocratização, a redução dos prazos para alvarás de construção e abertura de empresas.

Para o sociólogo e analista político Rudá Ricci, muito mais do que qualquer obra, Lacerda desfruta de apoio de boa parte do eleitorado porque capitaliza a aproximação que tem do senador Aécio Neves e do governador de Minas, Antonio Anastasia - ambos do PSDB -, e de Fernando Pimentel, ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, amigo de Dilma e atualmente o principal nome do PT mineiro.

"Lacerda ganha ao ter Aécio como aliado porque isso o ajuda a manter uma boa imagem com os setores anti-PT do eleitorado e ganha também pela proximidade com Pimentel", diz Ricci. Segundo o sociólogo, no entanto, esse apoio de PT e PSDB pode passar por um ajuste em breve. "Nos bastidores, o que tem sido falado é que Lacerda já teria discutido um acordo com o PT para ser vice na chapa de Pimentel na disputa pelo governo do Estado de Minas em 2014." A assessoria de Lacerda descarta essa hipótese como absurda.

A campanha eleitoral esteve no ar na cidade durante boa parte do ano passado. A pergunta mais repetida era se o PT continuaria fazendo parte do governo Lacerda juntamente com o PSDB. Uma ala de petistas da cidade, liderada pelo presidente do diretório municipal e vice-prefeito, Roberto Carvalho, prega a candidatura própria. Ele mesmo se apresenta como um possível nome.

Em novembro, a crise estourou: Lacerda exonerou funcionários do gabinete do vice-prefeito alegando que não estavam não estavam seguindo a determinação aos servidores "para que a sucessão eleitoral do próximo ano não prejudique a administração da cidade". O episódio, no entanto, parece ter isolado Carvalho e seus aliados. O apoio a Lacerda nas eleições deste ano conta ainda com a simpatia da cúpula do PT.

Lacerda diz que tem o jeito tucano de gestão com o coração social petista. O PT tem a vice-prefeitura e os dois partidos têm cargos no primeiro escalão. Lacerda governa com uma aliança 15 partidos e desconhece o que é dor de cabeça com o Legislativo. Em tese, o principal partido de oposição é o PMDB. Mas dos quatro vereadores da legenda, três sempre votam com o governo.