Título: Investigações contra procuradores terão acesso liberado
Autor: Basile,Juliano
Fonte: Valor Econômico, 08/02/2012, Política, p. A5

Depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) abrir para o público os julgamentos de juízes suspeitos de irregularidades e de corrupção realizados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), chegou a vez de o Ministério Público tomar essa atitude.

Conhecido por fazer investigações contra autoridades, o MP vai ter regras para permitir o acesso a informações que envolvem desvios, irregularidades e casos de corrupção por procuradores da República e promotores de Justiça.

Pela proposta de resolução que está em discussão no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), qualquer pessoa poderá ter acesso aos documentos que envolvam investigações internas da conduta de procuradores. Essa regra vale tanto para processos em que a pessoa que fizer a requisição estiver diretamente envolvida quanto para os casos "de interesse coletivo". Com isso, qualquer cidadão que fizer um pedido vai ter vista às investigações internas do MP.

"A publicidade e o direito à informação constituem regra geral e devem ser sempre interpretados favoravelmente aos indivíduos", defendeu o conselheiro Mario Luiz Bonsaglia, autor da proposta. Segundo ele, os procuradores devem ser julgados publicamente por supostas irregularidades que cometem no exercício da função. "A exceção à publicidade e ao direito à informação não deve preponderar sobre o dever administrativo de transparência e de divulgação dos assuntos que a todos interessam", completou o conselheiro, que é procurador no Estado de São Paulo.

A proposta de Bonsaglia foi levada a julgamento na sessão de abertura do ano no CNMP, em 31 de janeiro. Ela não foi votada porque o conselheiro Fabiano Silveira pediu vista. Silveira chegou há pouco tempo no CNMP e ainda não conhecia o texto. O novo conselheiro, que é representante do Senado, pediu um tempo de análise, alegando que gostaria de contribuir com a futura resolução.

A proposta prevê que todos os julgamentos disciplinares do MP sejam públicos. Isso significa que procuradores suspeitos de irregularidades serão julgados internamente em sessões com amplo acesso à população. Esses julgamentos vão ser transmitidos pela internet, ao vivo. Para quem não puder acompanhar "em tempo real" será possível solicitar os áudios e atas das sessões.

O sigilo nesses julgamentos será exceção. As sessões só vão ser fechadas ao público após decisão fundamentada que tenha o objetivo de preservar a intimidade dos envolvidos. Nesses casos, antes de decidir a respeito do sigilo nas sessões, o MP vai ter que verificar qual o valor maior no caso específico: a intimidade de quem está sendo julgado ou o direito de o público saber a respeito do julgamento.

Se decretar sigilo de um julgamento, o MP terá de justificar minuciosamente as razões e comprovar que a proteção da intimidade do procurador suspeito é maior do que o interesse público de obter informações sobre o caso. A regra geral é que todos os julgamentos sejam abertos.

O STF fez uma discussão parecida, na semana passada, ao decidir sobre a publicidade dos julgamentos de juízes suspeitos de irregularidades e de corrupção. Por nove votos a dois, os ministros do STF concluíram que o interesse em saber as razões pelas quais os magistrados estão sendo investigados e, eventualmente, punidos é de toda a sociedade. Com isso, os julgamentos disciplinares de juízes feitos pelo CNJ foram abertos ao público.

Na avaliação de Bonsaglia, a proposta de resolução para abrir os julgamentos disciplinares de procuradores foi fortalecida com essa decisão do STF. Como o Supremo abriu para o público os julgamentos de processos administrativos envolvendo juízes, o mesmo deve ser feito, por extensão, para membros do MP. "Houve um pronunciamento expresso, reafirmando a própria jurisprudência do STF no sentido de se prestigiar amplamente o princípio da publicidade", enfatizou Bonsaglia. "A aprovação da resolução pelo CNMP será importante para orientar todos os Ministérios Públicos quanto à necessidade de uma observância radical desse princípio."

A proposta também segue a diretriz geral dada pela Lei de Acesso à Informação (nº 12.527), que foi sancionada pela presidente Dilma Rousseff, em 18 de novembro do ano passado. Essa lei determinou que os órgãos públicos devem assegurar "gestão transparente da informação" e orientar o público sobre os procedimentos para fazer requisições de documentos, garantindo o amplo acesso.

"A recente Lei de Acesso à Informação foi considerada quando fizemos a primeira apresentação da proposta de resolução, em 2001, e também na versão final, na última sessão do CNMP", disse Bonsaglia. A resolução deve ser votada na próxima sessão do CNMP, em 28 de fevereiro.