Título: Indecisão do STF deixa candidatos no limbo
Autor: Iunes, Ivan
Fonte: Correio Braziliense, 24/09/2010, Política, p. 2

Após empate em 5 x 5 na avaliação da aplicação da Lei da Ficha Limpa para estas eleições, Corte suspende julgamento por tempo indeterminado. Retomada da discussão não está condicionada à nomeação de um novo ministro

Encerrada na madrugada de hoje após quase onze horas de julgamento, a sessão do Supremo Tribunal Federal (STF) que protelou por tempo indeterminado uma definição sobre a validade da Lei da Ficha Limpa nestas eleições coloca reticências na candidatura de Joaquim Roriz (PSC) ao Governo do DF (leia mais nas páginas 23 a 28). Além disso, mantém em aberto a porteira para todos os políticos que ainda apostam no adiamento da validade da legislação para tentar a redenção pelas urnas. Os ministros não condicionaram a retomada da discussão à nomeação do 11º ministro da Corte, ausente desde a aposentadoria de Eros Grau. Com o entendimento guiado pelo empate em cinco votos, permanecem as incógnitas em pelo menos sete estados.

Em tese, permanecem inseridos no cercado eleitoral os condenados Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), Expedito Júnior (PSDB-RO), Jackson Lago (PDT-MA), João Pizzolatti (PP-SC), Maria de Lourdes Abadia (PSDB-DF), Marcelo Miranda (PMDB-TO) e Paulo Maluf (PP-SP), além de Paulo Rocha (PT-PA) e Jader Barbalho (PMDB-PA), que entraram no rol dos enrolados por haver renunciado aos mandatos de deputado federal em 2005 e senador em 2001, respectivamente.

Desses candidatos, Lima, Expedito, Lago, Pizzolatti, Maluf, Miranda e Rocha ainda têm uma cartada a usar: o julgamento do TSE. Mesmo assim, manterão o binóculo apontado para o plenário do Supremo. Os sete firmaram defesa pautada em uma não aplicação da lei neste ano. Em alguns casos, tribunais regionais absolveram, em primeira instância, alguns deles (veja quadro). Serão diretamente impactados pela futura decisão do STF Abadia e Jader, que já esgotaram os recursos no TSE e recorreram à corte suprema para manter os registros ao Senado.

Outras candidaturas questionadas, mas absolvidas em primeira instância ou por decisões iniciais do TSE, como as de Heloísa Helena (PSol-AL), Ivo Cassol (PPS-RO) e Roseana Sarney (PMDB-MA), se firmam como favoritas, já que dificilmente serão enquadradas na Ficha Limpa.

Entre os que estão enrolados, a maioria tem candidaturas favoritas ao Senado. O quadro no Pará, sem Jader e Rocha, ficaria em aberto, o que favoreceria o atual senador Flexa Ribeiro (PSDB) e o candidato Marinor Brito (PSol), terceiro e quarto na corrida eleitoral, segundo as pesquisas. Enquanto não sai a decisão do STF, petista e peemedebista mantêm a toada rumo à Casa Alta. Com disputa apertada para tentar levar a eleição ao governo maranhense no primeiro turno contra Jackson Lago (PDT) e Flávio Dino (PCdoB), a atual governadora Roseana Sarney mantém a atenção sobre o Supremo. Sem o pedetista na disputa, ela teria a vida facilitada.

Da mesma forma, a saída de Expedito Júnior da corrida em Rondônia pode sacramentar o segundo turno entre João Cahulla (PPS) e Confúcio Moura (PMDB). Na Paraíba, a porteira fechada a Cássio Cunha Lima (PSDB) na disputa pelo Senado garantiria assento para Vitalzinho (PMDB) e jogaria uma até então improvável reeleição no colo de Efraim Moraes (DEM), alvejado por denúncias de contratação de funcionários fantasmas.

Futuro incerto

Expedito Júnior (PSDB-RO) Teve a candidatura a governador de Rondônia cassada pelo TRE, por condenação anterior: ele perdeu o mandato de senador acusado de compra de votos e de abuso do poder econômico. Barrado, recorreu ao TSE e aguarda uma definição da Corte.

Cássio Cunha Lima (PSDB-PB) Governador cassado da Paraíba por abuso de poder econômico e político, o tucano teve a candidatura ao Senado negada pelo Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba. Espera julgamento de recurso protocolado no TSE.

Jackson Lago (PDT-MA) Governador cassado do Maranhão por abuso de poder econômico, Lago teve a tentativa de retornar ao posto aceita pelo TRE-MA. O Ministério Público (MP) recorreu ao Tribunal Superior Eleitoral. O julgamento está pendente.

Paulo Rocha (PT-PA) Envolvido no escândalo do Mensalão, Rocha renunciou ao mandato na Câmara em 2005, para escapar do processo de cassação. O TRE-PA aceitou sua candidatura ao Senado, mas o Ministério Público recorreu ao TSE, que ainda não julgou o caso.

Jader Barbalho (PMDB-PA) O deputado federal tenta voltar ao Senado, de onde saiu após renunciar ao mandato em 2001. Como a decisão visava escapar de processo de cassação, Jader foi enquadrado na Ficha Limpa. Absolvido pelo TRE-PA, foi barrado pelo TSE e recorreu ao STF.

João Pizzolatti (PP-SC) Candidato à reeleição na Câmara, foi condenado pela Justiça de Santa Catarina por ilegalidade em um contrato com a prefeitura de Pomerode (SC). Ficou inelegível por decisão do TRE-SC e recorreu ao TSE. O julgamento parou em 3 a 1 contra Pizzolatti.

Marcelo Miranda (PMDB-TO) Ex-governador cassado por abuso de poder político, ele teve a candidatura ao Senado aceita pelo TRE-TO. O MP recorreu ao TSE. A questão está na pauta de votações da corte e ainda será analisada pelos ministros.

Paulo Maluf (PP-SP) Condenado por improbidade administrativa por superfaturamento em uma compra de frangos quando era prefeito de São Paulo, o deputado federal teve a reeleição à Câmara bloqueada pelo TRE-SP. Aguarda recurso contra a decisão protocolado no TSE.

Ponto crítico

A Lei da Ficha Limpa deve ser aplicada nesta eleição?

Sim » Ophir Cavalcante

A Lei da Ficha Limpa é uma demanda urgente da sociedade. Ela é sustentável juridicamente e não fere princípio constitucional algum. Não vai de encontro ao princípio da anualidade, por exemplo, porque não estabelece desequilíbrio entre candidatos ou partidos, apenas fixa parâmetros para elegibilidade. Ninguém é obrigado a ser candidato, mas aqueles que quiserem devem se submeter ao interesse coletivo. Não há retroatividade, já que ela fixa uma norma futura, não atinge normas para os mandatos atuais. Apenas diz que quem quer se candidatar precisa obedecer a parâmetros éticos e de correção. Ainda há que se destacar que inelegibilidade não é pena. A lei não fere a questão da culpabilidade. Julgados anteriores do Supremo já afirmavam um entendimento nessa direção, de que não é pena. Essa lei é resultado de uma luta que mudou conceitos, culturas e evidentemente fez despertar na sociedade um sentimento de maior brasilidade e luta pelos seus interesses e direitos. É uma chama que deve permanecer acesa.

Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)

Não » Erick Wilson Pereira

O clamor social não pode ser requisito de interpretação constitucional. A decisão mais correta enfraquece a Ficha Limpa, porque normativamente ela não tem força para entrar em vigor nesta eleição. Em pelo menos quatro aspectos a legislação não se coloca já para 2010. Primeiro, há o princípio da anualidade. Se você introduz no ordenamento político um direito negativo, você precisa respeitar a anualidade. A segunda questão é a retroatividade. A norma jamais pode retroagir para prejudicar alguém. Há ainda um terceiro aspecto que é a questão da soberania popular. Não se pode decretar juridicamente a morte política de um cidadão. Só a soberania popular pode fazer essa depuração antecipada. Não cabe aos tribunais antecipar isso. Por último, há a discussão da não culpabilidade. Não se pode dizer que uma inelegibilidade decorrente de uma sanção é mera condição de elegibilidade. Ela decorre de uma aplicação com força de pena.

Advogado e professor de direito da PUC-SP