Título: Infraero pretende fechar o cerco à Varig
Autor: Rittner, Daniel
Fonte: Valor Econômico, 16/06/2006, Empresas, p. B2

A Infraero, empresa responsável pela administração dos aeroportos brasileiros, pretende fechar o cerco à Varig. A partir do início da próxima semana, os aviões da companhia aérea só vão decolar mediante o recolhimento das tarifas de embarque à estatal, antes de cada vôo. O pagamento terá que ser feito à vista, com depósito em cada aeroporto, nas agências bancárias locais ou diretamente nos escritórios da Infraero. Sem o depósito, os vôos serão cancelados. "A Varig está fazendo uma apropriação indébita", disse ao Valor o presidente da Infraero, brigadeiro José Carlos Pereira.

Uma carta-ofício será enviada à direção da aérea entre hoje e amanhã. A cobrança à vista começará entre segunda e terça-feira, reduzindo ainda mais o frágil fluxo de caixa da Varig. As tarifas de embarque, cobradas no momento da emissão dos bilhetes, constituem uma taxa paga pelos passageiros para utilizar as instalações aeroportuárias. Nos principais aeroportos do país, a tarifa está fixada em R$ 19,62. Os recursos pertencem à Infraero, sendo as aéreas apenas repassadoras do dinheiro recolhido. Ocorre que a Varig não repassa esses recursos há mais de um mês, usando-os indevidamente para pagar as suas operações, acusa a Infraero.

Só a dívida acumulada em tarifas de embarque atrasadas chega a cerca de R$ 35 milhões, segundo o brigadeiro. Apesar de o valor diário ser relativamente pequeno para uma empresa do porte da Varig - eram R$ 800 mil, mas o montante tem caído com o alto número de cancelamentos de vôos e a redução do volume de passageiros -, a Infraero poderá encontrar dificuldades no recebimento. "Esse dinheiro existe, é pago todos os dias pelos passageiros. Mas acredito que teremos problemas e vai dar confusão", afirmou Pereira.

Para ele, "como o dinheiro não é dela, não deveria afetar em nada" o caixa da Varig. A última vez que a Infraero se viu obrigada a adotar esse tipo de medida foi há quase dois anos, quando a Vasp deixou de repassar as taxas de embarque.

Além da cobrança, Pereira disse que pretende enviar hoje um novo pedido ao Ministério Público Federal para a abertura de processo contra o presidente da Varig, Marcelo Bottini, pelo crime de apropriação indébita.

A dívida total da aérea com a Infraero já soma mais de R$ 540 milhões. Apesar de insatisfeito com os rumos da recuperação judicial da Varig, o brigadeiro afirmou que ainda não é hora de adotar o mesmo tratamento da cobrança à vista das tarifas de embarque para as tarifas aeroportuárias - de pouso, decolagem e navegação aérea -, que a companhia não paga desde setembro. Os credores estatais têm sido pacientes com a Varig - a BR Distribuidora não vem cobrando o fornecimento de combustível.

A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) convocou novamente os presidentes de algumas companhias aéreas para uma reunião hoje, às 10 horas, em Brasília. Na quarta-feira, executivos das principais empresas discutiram detalhes do plano de contingência para o caso de paralisação da Varig, bem como a redistribuição das linhas nacionais e internacionais. O encontro foi interrompido à noite porque diretores da Anac foram chamados à Casa Civil da Presidência.

As companhias têm travado uma guerra pelos "slots" (horários de pouso e decolagem nos aeroportos) que hoje pertencem à Varig. "Todo mundo está de olho em tudo", afirmou o diretor de uma empresa. O maior problema enfrentado pelas aéreas para assumir as rotas é a restrição de aviões disponíveis. Todas elas, entretanto, tiveram conversas informais com as "lessores" (companhias que alugam os jatos).

A demanda mundial por aeronaves está em alta, com o aquecimento do setor aéreo. Segundo comenta um executivo, porém, as "lessores" tendem a preferir manter os aviões no Brasil. A adaptação das cabines para uso das aeronaves na Europa ou nos Estados Unidos exige uma reconfiguração interna muito grande, o que eleva os custos e atrasa a entrega das aeronaves para outras empresas aéreas.

Em caso de falência da Varig, a expectativa de uma das aéreas brasileiras é completar o reforço da sua frota até outubro, ocupando os destinos deixados de lado pela companhia em recuperação judicial.