Título: Nos agronegócios, colheita é de software
Autor: Rosa, João Luiz
Fonte: Valor Econômico, 16/06/2006, Empresas, p. B2

As empresas de agronegócios nunca foram consumidoras ávidas de tecnologia da informação (TI) no Brasil. Ao contrário, enquanto o setor representa 30% do PIB - segundo critérios que incluem todo o ciclo de produção e venda -, sua participação nos investimentos em TI é de apenas 2%. Mas esse cenário está mudando, com um esforço crescente dessas companhias para buscar a atualização tecnológica. É o que mostra uma pesquisa inédita, feita pela consultoria IDC, com 75 empresas de pequeno, médio e grande portes.

O relatório mostra que, em média, os orçamentos das companhias do setor devem aumentar 11% neste ano em comparação com 2005, repetindo o desempenho do ano passado, mas sobre uma base de comparação maior. "É um crescimento de dois dígitos e que apresenta ritmo constante", diz o analista André Rossini, do IDC. "Para o setor, trata-se de um número muito bom."

O estímulo aos investimentos vem basicamente da competição cada vez mais acirrada que as empresas de agronegócios enfrentam, tanto no Brasil como no mercado externo. O setor tem enfrentado uma de suas piores crises mundiais, principalmente o segmento de grãos, confrontado não só pelo câmbio desfavorável - algo comum às demais culturas -, como pelo preço ruim, provocado pelo excesso de estoques.

É exatamente para tornar-se mais eficientes e superar as dificuldades conjunturais que as companhias do setor buscam apoio na tecnologia. Segundo o levantamento do IDC, são três as prioridades no topo das intenções de investimento: a implantação de sistemas de gestão empresarial, um movimento feito há muito tempo em setores como bancos, telecomunicações e manufatura; segurança dos dados e voz sobre IP. Com esta última, a intenção é reduzir custos com o uso da internet nas ligações telefônicas.

No caso dos softwares de gestão (ERP, na sigla em inglês) - o principal foco dos investimentos -, o IDC detectou uma curiosa inversão em relação aos demais setores de atividade. Em geral, as empresas começam a automatizar primeiro atividades administrativas e financeiras, como contas a pagar e a receber e folha de pagamento, para só depois chegar às áreas ligadas à produção. Já as empresas de agronegócios estão percorrendo o caminho inverso, diz Rossini.

Para crescer, muitas companhias do setor adotaram softwares ligados às operações em si - como produtos que controlam as fases de plantio e colheita, no caso da agricultura, ou de corte, na pecuária. A maioria desses produtos foi desenvolvida dentro de casa ou adquirida de pequenos fornecedores especializados.

Agora, à medida que expandem seus negócios - o que muitas vezes significa instalar unidades de produção em vários lugares - essas empresas enfrentam dificuldades para integrar produtos diferentes e começam a adotar programas comerciais, de marcas estabelecidas, para fazer a integração.

É uma chance para os fornecedores de software de gestão, como a americana Oracle, a alemã SAP e a brasileira Totvs, entre outros concorrentes do mercado. A maioria dos investimentos, diz Rossini, está sendo feito por grandes empresas de agronegócios, o que significa a possibilidade de conquistar contratos consideráveis.

Segundo o IDC, 25% das empresas pesquisadas têm orçamentos entre R$ 90 mil e R$ 230 mil especificamente para os softwares de gestão. Mas o levantamento leva em consideração companhias de todos os portes, ressalva Rossini. Há uma parte considerável desse universo que tem orçamentos superiores, assim como um número de companhias de menor porte que pretendem gastar menos que a média.

Para ganhar acesso a esse mercado, porém, as companhias de ERP provavelmente terão de aproximar-se dos fornecedores dos softwares específicos ligados aos agronegócios, que já têm um relacionamento com os clientes. "Aquisições são possíveis, mas é muito difícil prever sua probabilidade", afirma Rossini. "Os fornecedores de ERP podem desenvolver produtos internamente ou comprar a tecnologia, mas isso depende da estratégia da empresa e da importância dada ao setor."