Título: Limpeza de pauta não reduz volume de condenações
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 26/01/2007, Brasil, p. A2

A limpeza que o Cade está fazendo nas denúncias antigas de cartel não significa que todo o caso vai para o arquivo. Nos últimos anos, o Cade condenou empresas nos setores de construção civil (o "cartel das britas"), de siderurgia (o "cartel do aço"), de aviação, portos e combustíveis. Há investigações em curso nos setores de carnes, laranjas, hemoderivados, cimento e vitaminas.

Na mesma sessão em que concluiu seis "esqueletos", o órgão antitruste condenou, por unanimidade, o cartel dos taxistas de Porto Alegre. Apesar de não ser um caso de repercussão nacional, o cartel dos taxistas é um retrato de como os conselheiros estão agindo com relação às denúncias de cartel. Para eles, não basta que as empresas aumentem os seus preços na mesma época e em percentuais parecidos. São necessárias provas de que houve acordo prévio entre os empresários para realizar o cartel.

Os taxistas da capital gaúcha só foram condenados porque o Cade obteve atas de reuniões nas quais foram definidas as tarifas e as formas de descontos. "Eles dominavam 100% do mercado e fixavam os preços de forma explícita", disse o conselheiro Abraham Sicsú.

Os taxistas especificaram os valores das tarifas em atas de reuniões feitas em 2001 e 2003. O curioso é que, pressionados pelo Cade, eles alegaram que tiveram prejuízos com o cartel e, por isso, não deveriam ser condenados. Mas, os conselheiros rechaçaram essa tese e multaram as companhias de táxis de Porto Alegre em 5% de seus respectivos faturamentos.

O advogado Ivo Teixeira Gico Junior, do escritório Barbosa, Müssnich & Aragão, explicou que, no passado recente, o Cade chegou a punir empresas em casos em que não foi comprovado que houve discussão de preços e de condições de venda entre elas. Ele deu o exemplo o cartel da ponte-aérea. As companhias aéreas TAM, Varig, Vasp e Transbrasil foram condenadas, em setembro de 2004, por terem anunciado reajustes na mesma época e em percentuais semelhantes. Mas, houve divisão no conselho: quatro votos pela condenação e dois - incluindo o da presidente, Elizabeth Farina - pela falta de provas. Uma empresa pode acompanhar reajustes das rivais, sem necessariamente ter feito acordo de preços, disse Elizabeth.

Teixeira analisou o caso da ponte aérea em sua tese de doutorado na USP e concluiu que a melhor solução seria regular o setor, restringindo o uso de códigos que as companhias aéreas usam para transmitir mais informações para concorrentes. "Tenho sérias dúvidas se o Cade condenaria este cartel hoje", afirmou o advogado sobre a nova tendência do Cade de não condenar cartéis sem provas concretas.

Teixeira avaliou que este foco nos cartéis tem razões históricas. Nos anos 90, na época da restruturação da economia, o Cade centralizou as suas atenções em grandes fusões e aquisições, como a união da Brahma com a Antarctica, a compra da Kibon pela Gessy Lever e a aquisição da Kolynos pela Colgate. "Com a diminuição dessas operações gigantescas, as autoridades migraram as suas atenções para os cartéis."