Título: Mercado interno puxa alta de 3,4% no PIB
Autor: Santos, Chico
Fonte: Valor Econômico, 01/06/2006, Brasil, p. A3

O crescimento de 1,4% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro no primeiro trimestre deste ano em relação ao quarto trimestre do ano passado - já livre dos efeitos sazonais de cada período -, foi liderado pela demanda interna, com grande impulso dos investimentos. Pelo lado da oferta, a indústria foi a grande responsável pelo desempenho do PIB, que teve alta de 3,4% na comparação com o primeiro trimestre de 2005.

O crescimento de 1,4% em relação ao quarto trimestre de 2005 foi o maior crescimento na série com ajuste sazonal desde o terceiro trimestre de 2004 (1,5%). Na comparação com igual período do ano anterior, o último resultado melhor do que o divulgado ontem pelo IBGE foi o do quarto trimestre do mesmo 2004 (4,7%), ano no qual a economia brasileira experimentou uma expansão anual de 4,9%. Nos quatro trimestres encerrados em março, o PIB cresceu 2,4%, um pouco acima dos 2,3% dos quatro trimestres encerrados em dezembro de 2005.

Para a economista Rebeca Palis, gerente de Contas Nacionais Trimestrais do IBGE, a expansão do primeiro trimestre se explica por uma série de fatores, incluindo queda da taxa de juros básica (Selic), expansão do crédito (35,2% para pessoa física), aumento de 4,9% da massa salarial e da ocupação (2,3%), estímulo à construção civil via crédito habitacional, recuperação das estradas (operação tapa-buracos) e importações de máquinas e equipamentos proporcionada pelo dólar barato.

A indústria, que na metodologia do PIB inclui a construção civil, cresceu 1,7% na comparação com o fim de 2005 (com ajuste sazonal) e 5% em relação ao mesmo trimestre do ano passado, completando nove trimestres consecutivos de resultado positivo nesta última forma de comparação. A forte expansão foi determinada pela indústria extrativa mineral, liderada por petróleo e minério de ferro, que cresceu 12,6%, seguida da construção, com 7% e dos serviços industriais de utilidade pública (luz, água e esgoto), com 4,3% e, por último, a indústria de transformação, que tem maior peso no conjunto (cerca de 60%), com 3%, após dois trimestres seguidos de desempenho negativo na comparação contra o mesmo período do ano anterior.

O destaque negativo entre os setores produtivos foi a agropecuária que foi até recentemente um dos motores da economia. Ela cresceu 1,1% em relação ao trimestre anterior, mas caiu 0,5% na comparação com o primeiro trimestre de 2005. O resultado foi decorrente de maus desempenhos de lavouras típicas do período, como arroz, algodão e amendoim, além do impacto da febre aftosa sobre a pecuária bovina. Rebeca alertou que o número do período não deve servir de base para definir o desempenho da agropecuária no ano, já que no segundo trimestre, por exemplo, é esperado bom desempenho de lavouras típicas do período, como a do café.

Pela ótica da demanda, o crescimento dos investimentos (formação bruta de capital fixo) de 3,7% em relação ao trimestre anterior e de 9% na comparação com o mesmo trimestre de 2005 foi o destaque. O crescimento da construção civil liderou a expansão, aliado à produção e, principalmente, às importações de bens de capital.

O analista Eduardo-Velho, sócio e economista-chefe da Mandarim Gestão de Ativos, mesmo considerando que os investimentos ainda não são suficientes para sustentar um crescimento acima de 4%, destacou o fato deste ser o segundo trimestre consecutivo de crescimento em relação ao trimestre anterior.

Fabio Giambiagi, do Ipea, disse também que os dados sobre o investimento foram "animadores", mas lamentou que persistam "os gargalos" para investimentos do setor público, o que torna mais difícil alcançar padrões consistentes de investimentos compatíveis com sua necessidade de crescimento. Os analistas avaliam, em geral, que o Brasil precisa investir cerca de 25% do PIB por ano para crescer de 4% a 5% por um longo período.

A valorização do real em relação ao dólar americano fez com que pela primeira vez desde o quarto trimestre de 2003 as exportações de bens e serviços crescessem menos do que as importações. As vendas cresceram, respectivamente, 3,9% e 9,3% em relação ao trimestre anterior e ao mesmo trimestre do ano passado, enquanto as importações aumentaram 11,6% e 15,9% na mesma comparação. A expectativa dos analistas é de que em 2006, pela primeira vez desde 2000, o setor externo contribua negativamente para o PIB.

O consumo das famílias, apesar de contribuir para o PIB, aumentou só 0,5% na série com ajuste, após crescer de 1% a 1,2% nos três trimestres anteriores. Sobre o mesmo trimestre de 2005, a alta foi de 4%. Rebeca, do IBGE, considerou o número ajustado "uma acomodação". Carlos Thadeu de Freitas, economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC) disse que o consumo das famílias foi prejudicado pelo elevado endividamento, pelo preço do álcool, dos impostos e da educação.