Título: Fujimori é "presença fantasma" na eleição
Autor: Braga, Paulo
Fonte: Valor Econômico, 01/06/2006, Internacional, p. A12

Mesmo fora do país, o ex-presidente Alberto Fujimori se converteu numa "presença fantasma" na eleição peruana de domingo. Os dois candidatos, o ex-presidente populista Alan García e o nacionalista Ollanta Humala, se acusam mutuamente de ligação com Fujimori, ao mesmo tempo em que tentam se afastar da imagem do ex-presidente, cujo governo acabou num escândalo de corrupção.

Nos últimos dias surgiram uma série de denúncias envolvendo os dois candidatos. Partidários de Humala, vencedor do primeiro turno, com 30,6% dos votos, apresentaram emails supostamente trocados entre García e um ex-assessor de Fujimori que indicariam haver um pacto entre os dois, com o objetivo final de anistiar o ex-presidente, que está em liberdade condicional no Chile, onde foi detido a pedido da Justiça peruana.

Já Vladimiro Montesinos, que chefiou o serviço de inteligência de Fujimori e está hoje preso no Peru, divulgou um livro em que ataca Humala, afirmando que sua candidatura foi orquestrada pelo presidente venezuelano, Hugo Chávez, e pelo líder cubano, Fidel Castro.

"Junto com os dois candidatos, há duas grandes presenças fantasmas, Fujimori e Montesinos, com funções de protagonistas", afirma o analista político e jornalista Gonzalo Gorriti. "Enquanto Montesinos quer influenciar o resultado, Fujimori é mais conservador e seu objetivo é tentar conseguir a impunidade no próximo governo", diz Gorriti, que foi preso em 1992 após o autogolpe dado por Fujimori, que suspendeu a Constituição e dissolveu o Congresso.

Montesinos era considerado o "homem-forte" do regime de Fujimori. Ele está preso desde 2001. Entre as acusações que responde estão violações de direitos humanos, ligação com o narcotráfico e enriquecimento ilícito.

A outra grande figura da campanha eleitoral peruana tem sido Chávez, que declarou apoio a Humala e lançou ataques contra García. As ofensas do presidente venezuelano são usadas pelo candidato social democrata para tentar conseguir mais votos. García voltou a dizer ontem que os peruanos têm de escolher "entre Chávez ou o Peru". Nos últimos dias Humala vem tentando se desvincular do venezuelano.

Para Gorriti, ao aparentar simpatia por García, Montesinos deseja na verdade favorecer a Humala. O analista não descarta, inclusive, que os nacionalistas venham a governar com o apoio do partido fujimorista AF (Aliança para o Futuro), cuja sigla é curiosamente a mesma do nome do ex-presidente.

Isso porque um eventual governo de Humala pode ter vida difícil no Congresso. Espera-se que o resultado oficial da votação parlamentar de 9 de abril seja divulgado hoje, mas estimativas parciais publicadas pelo jornal "El Comercio" indicam que o UPP, de Humala, conseguiu 45 das 120 cadeiras.

O partido nacionalista deve ter dificuldade em conseguir apoio do Apra, de Alan García, que tem 36 deputados, assim como de partidos de centro, que seriam os aliados parlamentares prováveis em um governo de García.

Desta forma, o apoio dos fujimoristas seria importante para que Humala tente construir uma maioria. Estima-se que o partido, liderado pela filha de Fujimori, Keiko (que foi a deputada mais votada em todo o país), terá 13 representantes no Congresso.

Entre a infinidade de acusações não provadas feitas nos últimos dias, também surgiu, por parte dos humalistas, a denúncia de que Keiko teria se reunido com García na semana passada.

Há um clima animosidade entre partidários dos dois candidatos e denúncias de atentados contra comitês de campanha. O Apra denunciou que nos últimos meses estão entrando no país cidadãos venezuelanos e cubanos, cujo objetivo seria gerar distúrbios no dia da votação para favorecer a Humala.

Os candidatos têm feito campanha protegidos por um forte esquema de segurança, o que não impediu que García fosse atingido no final da semana passada por um ovo atirado por um simpatizante de Humala, provocando um ferimento superficial no seu rosto.