Título: Conselhos buscam a experiência dos executivos seniores
Autor: Giardino, Andrea
Fonte: Valor Econômico, 12/04/2006, Eu & Investimentos, p. D6

O executivo Walter Janssen deixou a presidência da Weg nos EUA para se tornar um conselheiro independente O intenso movimento de abertura de capital das empresas brasileiras nos últimos dois anos e as rígidas exigências da lei Sarbanes-Oxley estão criando novas oportunidades de trabalho para executivos com mais de 50 anos, próximos de se aposentar e donos de uma invejável bagagem profissional, para atuarem como conselhos de administração. Atualmente, as companhias, principalmente as familiares, encontram uma certa dificuldade em encontrar profissionais com o perfil desejado para ocupar seus "boards". Elas procuram conselheiros com ampla experiência como executivos e de preferência que tenham ocupado a presidência de grandes empresas. É desejável também atuação internacional, trabalho em diversos setores da economia, visão estratégica e de liderança. Tudo isso somado a um bom conhecimento da área financeira.

Só em 2005, a demanda por conselheiros externos - sem qualquer vínculo com a companhia - praticamente dobrou entre as empresas de recrutamento de executivos instaladas no país e promete se intensificar ainda mais daqui para frente. Extremamente valorizados, esse profissionais ganham, em média, R$ 8 mil por participação mensal em conselhos e exercem um papel fundamental, já que em geral são contratados para serem "big brothers" dos acionistas controladores e da diretoria. "As empresas buscam executivos seniores que possam complementar as atividades do CEO ou dos demais participantes do 'board' em relação a sua área de atuação", afirma Luís Giolo, diretor da Egon Zehnder no Brasil, que no ano passado teve 10% dos negócios ligados a conselhos de administração .

Segundo ele, é comum que muitas dessas empresas queiram, por exemplo, alguém de consumo para integrar o conselho de uma empresa de telecomunicações. "E conhecer o setor em que a empresa atua torna-se importante na hora de avaliar se a estratégia adotada funciona ou que decisões devem ser tomadas", diz. Ao contrário do que se via no passado, quando os presidentes convidavam amigos ou nomes conhecidos do mundo empresarial para fazer parte do 'board', hoje a escolha se dá pelo currículo que ele possui e os resultados alcançados ao longo da carreira. "Existe também um maior rigor no processo de seleção, já que com a Sarbanes aumentou a responsabilidade de quem faz parte dos conselhos e dos comitês de auditoria ", ressalta Giolo.

Diante desse cenário, a participação de altos executivos do mercado nos conselhos é objeto de desejo de muitas empresas e deve crescer ano a ano, provocando importantes mudanças na formação atual dos conselhos de administração. Estudo feito no fim do anos passado pelo Instituto de Governança Corporativa (IBGC) em parceria com a Watson Wyatt mostrou que entre 17 grandes empresas instaladas no país 33% já possuíam conselheiros externos em suas estruturas. "E a tendência é que esse índice seja ainda maior nos próximos anos", afirma Marcos Morales, diretor da consultoria. Segundo ele, além da transparência exigida pela Sarbanes, as empresas que abrem capital no Novo Mercado da Bovespa precisam ter conselheiros independentes em seus conselhos para legitimar sua imagem e reputação. "Esse tipo de gestão faz diferença tanto para o mercado quanto para os acionistas minoritários", diz.

Os salários para lá de atraentes e a alta demanda por conselheiros independentes estão levando diretores e presidentes a trocarem a carreira executiva por uma cadeira no "board". É o caso de Walter Janssen Neto, 50 anos. No início de 2005, ele deixou a presidência do grupo Weg nos Estados Unidos para se dedicar exclusivamente a atividade de conselheiro. "Os escândalos financeiros envolvendo empresas como Enron e Tyco vêm obrigando as empresas a buscarem profissionais sem qualquer vínculo com a empresa", avalia. "O que abre inúmeras oportunidades para profissionais com uma grande bagagem no mundo corporativo".

Paulo Pampolin/VAlor Luciano Carvalho Ventura é um dos pioneiros. Sempre dividiu seu tempo entre a carreira executiva e de conselheiro Tudo começou em 2003, quando Neto começou a se envolver com questões ligadas à governança. Estudando o assunto, percebeu que muitas empresas iriam precisar de conselheiros externos num futuro próximo. Dois anos depois, iniciava uma nova trajetória em sua vida profissional. Sua experiência adquirida por mais de 30 anos - em finanças, vendas, recursos humanos e marketing -, o levou a integrar o "board" de duas empresas de capital fechado, instaladas no sul do país. Hoje, mora nos Estados Unidos, onde abriu uma consultoria especializada em governança corporativa.

Disputado pelo mercado, Neto revela que passou a receber inúmeros convites nos últimos meses, desde que travou contato com headhunters e fundos de investimentos. Ao abandonar o dia-a-dia do mundo dos negócios, o ex-executivo acabou tornando-se alvo de empresas que querem oxigenar seus conselhos. Isso porque as companhias têm procurado evitar que seus executivos atuem em conselhos externos. Ação que, segundo Axel Werner, sócio-diretor da Keseberg & Partners, visa deixá-los mais focados em suas funções e impedi-los de se envolverem em escândalos de outras empresas. "Há todo um cuidado no processo de seleção desses profissionais, que são extremamente valorizados", diz.

Para ele, o que se vê são oportunidades para diretores também, principalmente os egressos da área financeira. "Tivemos uma reunião recente com o presidente de uma multinacional, que se mostrou preocupado em perder profissionais de finanças por conta dessa demanda", lembra Werner. Nos últimos 12 meses, a Keseberg & Partners reportou um aumento de 20% na atividade que envolve a colocação de posições para conselheiros.

O mercado para conselheiros, no entanto, não se restringe apenas ao Brasil. De acordo com Fátima Zorzato, gerente geral da Russell Reynolds no país, em 2005 houve uma procura acentuada por profissionais da América Latina para fazer parte do conselho mundial de alguns dos maiores grupos. "Cresce o interesse de multinacionais, que têm grande parte de seus negócios no país, em levar brasileiros para o board internacional", revela. Dados da Korn/Ferry mostram que a participação de latinos nos "boards" mundiais mais do que dobrou, passando de 9% em 1995 para 19% em 2005.

Por outro lado, a busca por conselheiros profissionais torna-se uma verdadeira caça a talentos para os headhunters, que além de irem atrás de executivos seniores, se deparam com outro problema: a indisponibilidade da maioria em exercer uma atividade como essa em paralelo. "As reuniões de conselho geralmente acontecem uma vez ao mês e em alguns casos são realizadas fora do Brasil, exigindo tempo e dedicação", explica Giolo . Além disso, com as novas regras de governança apertando o cerco às empresas e aos responsáveis pelos dados financeiros publicados nos balanços, muitos executivos rejeitam convites para ingressar em conselhos. "O conselheiro passou a correr mais riscos".

Pesquisa mundial da Korn/Ferry International reflete bem esse comportamento. Entre os entrevistados na região da Austrália e Ásia, 83% disseram ter recusado pelo menos um convite para fazer parte do conselho por terem medo do risco associado ao negócio. "As pessoas estão sendo mais cuidadosas", afirma Sérgio Averbach, presidente da empresa de "hunting". Mesmo assim, ele afirma que no Brasil a demanda por conselheiros independentes ainda é pequena. Mas reconhece que a procura crescerá mais cedo ou mais tarde. "Lá fora, em contrapartida, a situação é bem diferente", aponta. O levantamento acena para uma dificuldade real em recrutar conselheiros de alto nível. Na Alemanha, 79% dos entrevistados disseram encontrar poucos profissionais que atendam o perfil desejado, enquanto na Suíça esse número é de 64%.

Averbach ressalta que o caminho se abre para aposentados. Há 10 anos, a escolha de profissionais que haviam encerrado suas carreiras era de 75%. Em 2005, subiu para 95%. As mulheres, por sua vez, também começam a ser mais convidadas para integrar "boards". "Além da profissionalização dos conselhos, as empresas buscam a diversidade", explica Averbach. No estudo, em 1995 apenas 69% das companhias queriam integrantes do sexo feminino. Hoje, esse índice saltou para 84%.

A carreira de conselheiro profissional não é nova. Que o diga Luciano Carvalho Ventura, 59 anos. Após dividir seu tempo entre funções executivas exercidas em grandes empresas e atividades em diversos "boards", ele decidiu há 15 anos viver apenas como conselheiro independente. "É um experiência enriquecedora, porque você tem a missão de criar valor para a companhia", defende. Sua primeira experiência aconteceu em 1985, na Perfumarias Phebo - adquirida posteriormente pela Procter & Gamble. Tomou tanto gosto pelo trabalho que fazia que não largou mais.

Hoje, integra o conselho de administração de quatro empresas: Telesp/Telefônica, Tavares de Melo Açúcar e Álcool, Agrofértil e Takaoka. Mas já passou pelo "board" da Elebra, das Indústrias de Papel Simão, da Risipar, do Grupo Bompreço, da Perdigão e da Santher - Fábrica de Papel Santa Therezinha. Ele acredita que o conselheiro de empresas continuará vendo sua importância crescer no mundo dos negócios. "As maiores oportunidades aparecem nas empresas familiares que são cobradas para ter um modelo profissional de governança se quiserem melhorar os negócios com fornecedores, a imagem no mercado e obter empréstimo dos bancos", defende.