Título: Programas livres colocam o Brasil no centro da estratégia da Sun
Autor: Cesar, Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 12/04/2006, Empresas, p. B1

Quando Jonathan Schwartz tirou a camisa preta com o logotipo da americana Sun Microsystems e revelou o uniforme da seleção brasileira que vestia por baixo, a platéia que lotava o Transamérica Expo Center, em São Paulo, aplaudiu com entusiasmo. O presidente mundial da fornecedora de equipamentos, software e serviços de tecnologia retribuiu: "O próximo Google será uma empresa brasileira".

Foi uma frase para causar impacto, mas não apenas isso. Durante conversa com o Valor após a palestra, Schwartz voltou a mencionar o mecanismo de busca na web. "Os negócios mais atraentes do mundo são baseados em um modelo gratuito. O Google é um exemplo perfeito", disse.

O objetivo de Schwartz é aplicar a mesma estratégia em sua área de atuação: os softwares e equipamentos que compõem a infra-estrutura tecnológica das empresas.

Nos últimos meses, a Sun tornou todos os seus programas gratuitos para desenvolvedores. A idéia é cooptar esses profissionais, que são responsáveis por construir os sistemas que rodam nas companhias. Os desenvolvedores que aderem às ferramentas da Sun voltam a seus ambientes de trabalho - seja no governo, em uma empresa privada ou no meio acadêmico - e levam a preferência pela tecnologia da fornecedora americana.

Para provar sua teoria, Schwartz afirma que desde que abriu o código do Solaris, o sistema operacional da Sun, há doze meses, foram distribuídas mais de 4,5 milhões de cópias. O volume é superior ao que a companhia obteve em toda sua história.

A estratégia de distribuir gratuitamente seus produtos para ampliar a base de usuários fez com que o Brasil se movesse para o centro das atenções da Sun. Isso começou a ficar evidente em fevereiro de 2005, quando Schwartz - o número dois da empresa, atrás apenas do executivo-chefe Scott McNealy - escreveu uma carta aberta em seu blog para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A mensagem elogiava os programas de inclusão digital e a atitude do governo brasileiro de fomentar a adoção de software livre, sistemas cujos códigos podem ser copiados e alterados. Exatamente o tipo de tecnologia que a Sun oferece.

Ontem, após a palestra em São Paulo, Schwartz voou para Brasília, onde tinha encontro agendado com Lula para fechar acordos de cooperação com o governo. Foi mais do que uma estocada na rival Microsoft, referência do modelo de softwares proprietários, que têm o código fechado e sobrevivem com a cobrança de licença de uso. O mercado nacional é um dos mais entusiastas em relação às tecnologias de código aberto.

Aqui também estão cerca de cem mil técnicos em Java, uma linguagem de programação criada pela Sun e que é defendida por alguns com fervor quase religioso - o público a quem Schwartz dirigiu-se ontem no evento em São Paulo. A Java é usada para desenvolver programas que rodam em diversos dispositivos, de computadores pessoais a telefones celulares. É nessa comunidade técnica que a Sun quer investir.

Mas, se os sistemas são gratuitos, de onde virá a receita? No caso do Google, da publicidade sustentada pelo público que usa o serviço sem pagar por isso. O modelo da Sun é um pouco mais complicado. A aposta é que as grandes empresas fazem questão de ter garantia de suporte técnico para sistemas essenciais a sua operação e não se importam em pagar por isso. Mas escolherão erguer seus programas sobre tecnologias testadas e com um vasto contingente de profissionais qualificados à disposição.

"De graça é para a comunidade de desenvolvedores. Mas os grandes negócios estão muito interessados em usar esse conhecimento para construir sistemas em que investirão centenas de milhões de dólares", disse. "O fato de nossa tecnologia ser gratuita não leva as receitas para baixo, mas eleva sua adoção."

Resta saber se a estratégia funcionará tão bem para a Sun como para o Google. Desde 2001 os resultados da fornecedora deixam a desejar e suas ações, que já valeram mais de US$ 50, estão no patamar de US$ 5.

Talvez apenas coincidência, os fundadores do Google, Sergey Brin e Larry Page, também apresentaram-se este ano no Brasil trajando a camisa verde-e-amarela da seleção. Os truques de marketing da empresa de buscas podem estar fazendo escola, mas a importância declarada do país para a Sun parece ser legítima.