Título: Lula reafirma que governo não irá socorrer a Varig
Autor: Leo, Sérgio e Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 12/04/2006, Empresas, p. B3

Funcionários da Varig estiveram ontem em Brasília para pedir ajuda ao governo em mais uma tentativa de salvar a aérea "Não é papel do governo salvar empresa falida", disse o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na mais forte declaração do governo, até agora, sobre a crise da Varig e os pedidos de ajuda ao Palácio do Planalto. Ao lado da recém-eleita presidente do Chile, Michele Bachelet, com quem acabava de almoçar, Lula foi categórico: não admite ajuda oficial que envolva dinheiro público na salvação da Varig. "Ela pode apelar para a Lei de Falências", exemplificou Lula.

"Ela tem que cumprir o acordo com que se comprometeu judicialmente", afirmou Lula, referindo-se ao pedido de recuperação judicial da empresa, feito em meados de 2005, pelo qual ela se comprometeu a ajustar despesas e dar soluções para as dívidas com fornecedores. "Quando o Brasil nunca teve tanta gente viajando dentro do país e para o exterior, a TAM e a Gol estão crescendo, por que a Varig tem déficit operacional?", comentou o presidente da República.

A Varig é uma empresa privada, e precisa fazer ajustes, para se tornar viável, sugeriu o presidente. Se o governo usasse recursos públicos para salvar a empresa, desencadearia uma onda de pedidos por outras firmas em dificuldades, comentou Lula, para descartar a idéia de financiamento com recursos oficiais. "Há oito anos ouço falar do problema da Varig, e, a cada vez, os números são maiores."

Virando-se para a presidente chilena, Lula explicou que falava de uma grande companhia aérea brasileira em dificuldades. "O problema é que ninguém quer assumir as dívidas", disse. O acordo citado por Lula foi o que levou ao adiamento na cobrança de dívidas da empresa com estatais como a Infraero, a BR Distribuidora e o Banco do Brasil. Com liminares, a empresa conseguiu adiar o pagamento de tarifas aeroportuárias, mas não chegou a uma solução para equilibrar suas finanças. "A Varig tem prejuízo voando", criticou o presidente. Ao se despedir da presidente chilena, evitou estender-se sobre o assunto com os jornalistas que os esperavam à saída do Itamaraty, e se limitou a fazer um gesto de negativa com a cabeça quando lhe perguntaram se haveria dinheiro do governo para a Varig.

Enquanto esperava a comitiva presidencial para o almoço, no Palácio do Itamaraty, o ministro da Defesa, Waldir Pires, conversou por telefone com a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, a quem insistiu na defesa de uma solução para a empresa. Ladeado pelo comandante do Exército, Francisco Albuquerque e outros convidados, disse ter carinho especial com a empresa, mas ver muitos obstáculos legais para uma eventual ajuda do governo. Qualquer solução precisa ser encontrada com rapidez, em no máximo 48 horas, comentou Pires para os convidados, em referência aos efeitos danosos do noticiário sobre a situação da Varig.

Dilma Rousseff, que chegou depois, com a comitiva presidencial, falou rapidamente à saída sobre as dificuldades do governo para ajudar a encontrar uma saída para a dívida de pelo menos R$ 7,7 bilhões da Varig. Disse ser "sempre favorável" a uma solução que não inclua dinheiro público.

Waldir Pires se mostrou mais entusiasmado com as perspectivas da empresa. "Achamos que seja possível uma ação de governo para salvar a Varig", afirmou. "A esperança é que encontremos uma solução. Um governo democrático precisa buscar o êxito de todos os organismos". O ministro ressalvou, porém, que não poderia apresentar uma "posição conclusiva". Ele mostrou dúvidas sobre a possibilidade legal de atender à reivindicação dos funcionários, de permitir o uso de cerca de US$ 100 milhões em recursos do fundo de pensão dos funcionários da Varig, o Aerus, para capitalizar a empresa. "Precisamos ver os fundamentos legais disso, senão chegaremos a um nível de voluntarismo ruim para as instituições", comentou.

"Todos os funcionários da ativa contribuem para um fundo de pensão da Varig, mas, se a empresa quebrar, não teremos nem presente nem futuro e não teremos como manter nossos empregos nem tampouco alimentar nossos filhos", argumentou o comandante da Varig, Márcio Marsillac, presidente da TGV, que reúne sindicatos e associações de funcionários da aérea. "Estamos dispostos a fazer outras alterações nas condições de trabalho para colocar a Varig em condições de operar novamente."

O ministro da Defesa afirmou que a empresa não poderia esperar duas semanas pela solução da crise, e lamentou a "situação difícil, paralisante" da companhia, com problemas na manutenção dos aviões e interrupção dos vôos. "O melhor é que encontremos uma solução o mais rápido possível, duas semanas é um tempo demasiado", disse.

Funcionários da Varig e sindicalistas do setor fizeram uma caravana a Brasília e foram ao Palácio do Planalto acompanhados de parlamentares. Em documento protocolado no Planalto, os funcionários reivindicam a extensão dos prazos de pagamentos dos compromissos com fornecedores estatais. Os funcionários tinham expectativa de serem recebidos pela ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, mas, da portaria, foram encaminhados ao ministério da Defesa. Entre os parlamentares que os acompanharam estavam Eduardo Suplicy (PT-SP), Beto Albuquerque (PSB-RS), Fernando Gabeira (PV-RJ), Jandira Feghali (PCdoB-RJ), Darcísio Perondi (PMDB-RS) e Yeda Crusius (PSDB-RS).

No documento entregue ao governo, pedem folga de 60 dias para pagamento do combustível à BR Distribuidora e 90 dias de moratória no pagamento das taxas aeroportuárias, devidas à Infraero. "Além disso, concordamos com a demissão de 2,9 mil dos 11 mil funcionários da empresa e os que permanecerem terão uma redução de 30% nos salários", relatou Marsillac. Cerca de US$ 30 milhões retirados do fundo de pensão serviriam para pagar os direitos trabalhistas dos demitidos: os demais US$ 70 milhões e a economia com pessoal constituiriam garantias para as estatais como a BR e Infraero aceitarem a moratória nos pagamentos até se encontrar um sócio que assuma a empresa.

Como já haviam feito, anteriormente, com outras empresas aéreas em dificuldades, a Vasp e a extinta Transbrasil, desde o pedido de recuperação judicial, a BR e a Infraero passaram a exigir o depósito diário dos pagamentos devidos, para evitar o acúmulo de dívidas, que comprometem os balanços das estatais.