Título: País deve ser intransigente em Doha, diz especialista
Autor: Landim, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 12/04/2006, Brasil, p. A3

O Brasil precisa ser "intransigente" nas negociações da Organização Mundial de Comércio (OMC) e deve rejeitar um acordo "medíocre". O alerta é de Pedro de Camargo Neto, um experiente negociador brasileiro, que hoje ocupa o cargo de presidente da Associação Brasileira da Indústria Exportadora de Carne Suína (Abipecs).

Ele teme que a falta de ambição conduza a um acordo de pouca substância nas negociações da Rodada Doha. Para ele, as atuais propostas sobre a mesa são ruins. O especialista está cobrando menos pessimismo do setor privado e um apoio mais explícito para que o Brasil endureça suas posições.

"Não é hora de desistir, desanimar. O momento é do setor privado estimular o governo a se manter firme", afirma. "Vamos apoiar nossos negociadores mesmo que voltem de mãos vazias. Mas vamos criticá-los se trouxerem para casa algo medíocre."

Camargo Neto está preocupado com a pressão dos Estados Unidos para encerrar as negociações da Rodada Doha este ano. Em 2007 expira a Trade Promotion Authority (TPA), autorização concedida pelo Congresso americano para que o Executivo conduza as negociações. Em entrevista ao Valor, o representante comercial americano, Robert Portman, ressaltou que, da última vez, o governo dos EUA levou dez anos para prorrogar a TPA. "E daí se demorar dez anos? O que não tem cabimento é negociar 20 anos e sair sem nada", diz Camargo Neto, lembrando que as negociações sobre agricultura começaram em 1986. "Se atrasar a Rodada Doha, o Brasil não perde nada. Desta vez, o relógio está do nosso lado", completa.

Ele avalia que os EUA têm interesse em concluir a Rodada, porque estão acuados por contenciosos. A União Européia também teria que enfrentar a pressão das ONGs, que cobram uma abertura mais efetiva para os produtos agrícolas dos países pobres. Negociadores se reúnem em Genebra na próxima semana para tentar avançar na discussão da agricultura. "O governo vendeu a idéia que o Brasil é um líder da negociação agrícola. Mas o que adianta criar o G-20 (grupo de países que pede o fim dos subsídios agrícolas) se a negociação acabar com um resultado medíocre?", questiona Camargo Neto.