Título: Para o milagre do crescimento não há fórmula milagrosa
Autor: Carvallho Filho, Arthur
Fonte: Valor Econômico, 13/04/2006, Eu & Investimentos, p. D2

Devemos aproveitar o atual período eleitoral para entender os reais problemas da economia brasileira. Assim sendo, podemos avaliar quais são os candidatos que melhor executarão as reformas, essenciais à solução destes problemas. Costumo ficar bastante intrigado com a obsessão de alguns economistas em criticar a as decisões do Comitê de Política Monetária (Copom) e as taxas de juros vigentes como o maior problema da atual política econômica. Na verdade, no meu entender, a política monetária é o sintoma de uma série de problemas distintos.

Existe uma gama de problemas que acarreta em uma falta de produtividade, que gera pressões inflacionárias com taxas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) nada impressionantes. Um deles é, sem sombra de dúvida, o tamanho do Estado na economia e a sua situação fiscal. Apesar da sensação de responsabilidade fiscal, devido ao cumprimento da meta de superávit primário, devemos ser um tanto quanto cautelosos ao comemorarmos esse sucesso.

Grande parte do ajuste fiscal do governo Lula foi baseado no aumento de arrecadação, porém, o ritmo de aumento da receita tende a diminuir, uma vez que as falhas nos sistemas são corrigidas. Para se ter uma idéia, as receitas de impostos e contribuições registraram um crescimento real de 11,9% entre fevereiro de 2005 e o mesmo mês do ano anterior. Já se compararmos com o mesmo mês de 2006, notamos que houve um crescimento real de 6,9%. No estado estacionário, a arrecadação do governo deve acompanhar o ritmo do PIB nacional - acredito que taxas de crescimentos como essas não são imaginadas para a economia brasileira.

Contudo, enquanto o governo aumentava significativamente a arrecadação, suas despesas foram ampliadas quase na mesma proporção. No mesmo mês de fevereiro de 2005, as despesas registraram um crescimento real de 11,4%. No entanto, a desaceleração dessa categoria entre fevereiro de 2005 e de 2006 foi menor, neste período, estes cresceram a taxa de 9,6%. Vale ressaltar que nessas despesas não estão incluídos os pagamentos de juros que, com a queda da taxa básica de juros (Selic) devem reduzir sensivelmente.

Estas despesas que vêm se expandindo incluem não só os gastos discricionários - que podem ser interrompidos ou tem data para serem terminados -, mas também os gastos fixos, que são deixados como herança para as próximas gerações. São inúmeros os exemplos desta última categoria como novos funcionários públicos, com pensões astronômicas e estabilidade de emprego, programas de incentivos aos produtores agrícolas, ao exportador, ao setor industrial, etc. Estes gastos são de difícil redução e são fontes de grande preocupação.

Não existem dúvidas de que são necessários mais investimentos em infra-estrutura, educação e saúde, entre outras áreas. No entanto, estes investimentos têm um custo, que por sua vez expandem mais ainda os gastos públicos. Se o contribuinte brasileiro já é sufocado por uma das maiores cargas tributárias do mundo, de onde virá o dinheiro para as tão necessárias reformas?

Devemos analisar propostas milagrosas de gastos com bastante ceticismo, uma vez que não há muito mais espaço para uma expansão rápida dos gastos. Obviamente, o que é necessário é uma melhoria da qualidade dos gastos, além da redução deles. Só assim, será possível fazer uma reforma tributária decente. São essas reformas que impulsionarão o crescimento e o ganho de produtividade que, conseqüentemente, possibilitarão a queda de juros sem a criação de pressões inflacionárias. Portanto, fica claro que este processo fiscal não só é maléfico, como impossibilita o desenvolvimento do país de longo prazo.

É necessário entender que o conceito de superávit primário não é uma prova cabal de austeridade fiscal. Este cálculo exclui as despesas com o pagamento de juros da dívida brasileira. No entanto, estas despesas, em um ano, chegam a computar por 6% do PIB. Apesar de ser uma boa medida de ajuste fiscal, especialmente em um ano de altos juros (como 2005), para mantermos a dívida PIB em trajetória constante, devemos superar a meta de 4,25% do PIB. Note que estamos falando aqui de números para simplesmente manter a dívida em trajetória não explosiva. Para o "milagre do crescimento" não há fórmula milagrosa, há uma reforma fiscal e tributária que tirariam o país de um marasmo de décadas. Portanto, devemos analisar com bastante cuidado o quão conscientes estes candidatos estão de suas restrições orçamentárias.

Arthur Carvalho Filho