Título: Captações de US$ 6,1 bi no trimestre
Autor: Lucchesi, Cristiane Perini
Fonte: Valor Econômico, 13/04/2006, Finanças, p. C1

O tombo no risco Brasil neste início de ano, para o recorde de baixa de 211 pontos básicos no dia 1 º de março, abriu uma grande janela de oportunidade no mercado internacional para captações brasileiras, que foi aproveitada pelas empresas, bancos e governo. O resultado foi um volume de captações externas de US$ 6,1 bilhões nos primeiros três meses do ano, o maior para o primeiro trimestre desde 2002.

Quem captou agora, pagou taxas de juros menores e conseguiu prazos também nunca antes vistos. Só em títulos perpétuos, sem vencimento final, foram levantados US$ 1,4 bilhão no primeiro trimestre, sem considerar os US$ 325 milhões já emitidos pela Globopar e os US$ 200 milhões lançados pela Gol, com liquidação prevista para abril, e os US$ 200 milhões da Braskem que estão no mercado neste momento. Foram US$ 2,125 bilhões em perpétuos até agora neste ano, mais do que os US$ 1,863 bilhão captado pelo governo federal. "Os perpétuos viraram uma verdadeira coqueluche nacional", diz o diretor de tesouraria do BNP Paribas, Carlos Calabresi.

Segundo rumores, a Cemig estaria preparando a emissão de um perpétuo. Já os perpétuos da Braskem pagariam taxas de 8,15% ao ano, bem abaixo dos 9,75% ao ano dos US$ 150 milhões em perpétuos lançados em junho do ano passado pela empresa. São 160 pontos básicos a menos. Mas, é importante lembrar que do final de junho para agora o risco-Brasil caiu 170 pontos básicos.

"O mercado de perpétuos está bastante aquecido e ainda há muito espaço para os países emergentes alongarem seus papéis de dívida", diz Robson Galiano, da mesa de mercados emergentes da Bear Stearns. Segundo ele, somente na semana passada foram lançados US$ 3,2 bilhões pelos países emergentes.

Galiano reconhece que a volatilidade no mercado de títulos do Tesouro dos Estados Unidos, referência para o mercado de renda fixa no mundo todo, está maior agora do que no primeiro trimestre do ano. A aversão ao risco também cresceu, com o mercado em geral mais pessimista. O risco-Brasil, o prêmio pago pelo país e pela maior parte de suas empresas sobre os rendimentos dos títulos do Tesouro dos EUA, subiu. Está em 240 pontos básicos, na comparação com os 211 pontos básicos em março.

Mas, lembra Galiano, as taxas de juros dos títulos do Tesouro americano de 30 anos ainda continuam em níveis abaixo das vigentes em junho de 2004, quando teve início o aperto monetário que vem sendo promovido pelo Fed (banco central americano). Estavam ontem em torno de 5,02% ao ano, na comparação com os 5,30% e 5,40% ao ano de junho de 2004.

Mesmo os juros dos títulos de dez anos, que estavam em torno de 4,976% ontem, subiram 39,6 pontos básicos em relação a junho de 2004, bem menos do que os 375 pontos básicos de puxada nos juros básicos americanos dos chamados "Fed funds" promovida pelo Fed. Isso se explica em parte pela demanda forte por títulos longos do Tesouro dos Estados Unidos pelos bancos centrais asiáticos, de US$ 17 bilhões por mês.

"Os níveis de rendimento na parte longa da curva estão baixos em relação à parte curta, que sofreu mais o impacto do aperto monetário do Fed", diz Galiano. Como os papéis brasileiros pagam um prêmio sobre os rendimentos dos títulos americanos e os títulos longos têm juros quase iguais aos títulos curtos, vale a pena alongar prazos e chegar até os papéis perpétuos.

"Embora os preços tenham caído um pouco nas últimas semanas, o nível absoluto ainda é atrativo", diz Galiano. Márcio Pepino, diretor do Banco Finantia, concorda. "O apetite por Brasil está um pouco menor, mas ainda é forte", diz Pepino. Segundo ele, o melhor é aproveitar agora, antes que a volatilidade por causa das eleições presidenciais tome conta do mercado.

Pepino considera que os bancos pequenos e médios vão continuar a ter espaço para captar. No primeiro trimestre, esses bancos levantaram US$ 371 milhões no exterior. O BicBanco e o Modal chegaram a captar US$ 120 milhões e US$ 30 milhões, respectivamente, para dívida subordinada, que entra como capital no balanço do banco. O Banco Schahin estuda emissão desse tipo, disse Carlos Eduardo Schahin, o Cadu, diretor executivo. A Abril reabriu emissão de título de dois anos, com rendimento de 10,15% ao ano no mercado, neste momento.

Empresas e bancos que nunca haviam captado por meio de títulos no exterior ou empréstimos estruturados também aproveitaram a oportunidade. Foi o caso da Friboi, da produtora de açúcar e álcool Dedini e do Banco Panamericano. Empresas que estavam com as operações prontas em busca de uma janela, como a Vicunha Siderurgia e a Cesp, lançaram títulos no início deste ano.

"Só não houve mais captações externas porque as empresas não quiseram", diz Pepino. Segundo ele, se essa janela tivesse sido aberta em um momento de maior crescimento econômico, a movimentação teria sido ainda maior no primeiro trimestre. Na comparação com os US$ 5,495 bilhões dos primeiros três meses de 2005, o aumento no total captado foi de 11%. Mas, em relação aos US$ 7,948 bilhões do último trimestre de 2005, a queda foi de 23%.