Título: Rolagem de dívida antiga à espera de 'garantia' política
Autor: Zanatta, Mauro e Góes, Francisco
Fonte: Valor Econômico, 13/04/2006, Agronegócios, p. B14

O governo quer incluir os líderes partidários na costura política para permitir uma nova rolagem das dívidas agrícolas repactuadas nos programas de securitização, recuperação das cooperativas (Recoop) e de saneamento de ativos (Pesa). Até agora, as negociações restringiam-se aos líderes da bancada ruralista no Congresso.

Escaldado com a posição dos ruralistas, a maior parte ligada a partidos de oposição, o governo quer um compromisso formal para restringir os benefícios apenas aos produtores de regiões que tiveram problemas climáticos ou de comercialização e que pagaram em dia seus empréstimos até dezembro de 2004. Segundo apurou o Valor, o governo quer evitar tanto o uso eleitoral da medida como o eventual ônus de ter que vetar alguma medida mais abrangente.

Para prorrogar parte dos R$ 7,7 bilhões em débitos atrasados e já renegociados entre 1995 e 2001, o governo federal deve usar a Medida Provisória nº 289, publicada na última segunda-feira, que está em análise no Congresso. A MP liberou R$ 738 milhões para a comercialização da atual safra (2005/06).

O Ministério da Fazenda continua contra as discussões dessa nova rolagem por entender que a concessão abriria um precedente a outros setores e programas, como, por exemplo, de recuperação fiscal (Refis). Mas as negociações internas avançaram no governo e têm sido discretamente conduzidas pelo ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues.

O presidente Lula deu sinal verde às discussões que serão coordenadas pela ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff. Está prevista para a próxima terça-feira uma reunião para tratar do tema.

A nova rolagem ficou de fora do pacote agrícola porque o governo não queria dar sinais de que admitiria um "perdão" generalizado a "maus pagadores". Por isso, busca agora restringir o benefício com a adoção de um corte com base na adimplência dos produtores. O governo também não queria misturar medidas conjunturais - como dívidas de curto prazo e recursos para a comercialização - com um questão considerada estrutural.

As pressões pela medida aumentaram porque têm apoio de micro, pequenos e médios produtores da agricultura familiar e da reforma agrária. A bancada do PT também é favorável porque sofre fortes pressões do seu Núcleo Agrário, composto por parlamentares ligado ao tema.

Enquanto a nova rolagem de dívidas antigas é alinhavada, os impactos do pacote de socorro ao campo já anunciado são digeridos. No caso do BNDES, por exemplo, é consenso que a medida reduzirá os retornos nos empréstimos ao setor agropecuário em 2006. O fluxo de caixa do banco na agricultura deve ser menor porque a proposta de rolagem das dívidas recente apresentada prevê que o banco estenda por 12 meses o prazo de vencimento das dívidas nos seus programas agrícolas.

O BNDES não se pronuncia oficialmente sobre o assunto pois espera que a renegociação seja formalizada por resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN). Mas entre técnicos do banco existe preocupação em relação à elevada exposição ao setor agropecuário. Há dúvidas, por exemplo, se o banco estaria preparado para enfrentar uma demanda crescente por crédito nos programas agropecuários.

Em 2005, o BNDES desembolsou para a agricultura, via agentes financeiros, R$ 4,2 bilhões. O valor foi 35% inferior aos R$ 6,5 bilhões desembolsados pela instituição para o setor em 2004. A queda foi motivada pela crise na agricultura. Segundo uma fonte, o banco trabalhava com a expectativa de repetir este ano o desempenho de 2005 no apoio à agricultura. Com a renegociação, essa previsão parece agora otimista demais, avaliou uma fonte.

O principal programa administrado pelo banco, em termos de desembolsos para o setor, é o Moderfrota, que financia máquinas agrícolas e implementos com juros fixos. Em 2005, o BNDES desembolsou R$ 1,9 bilhão no Moderfrota, ou 45,2% do total destinado pelo banco à agricultura.

Assim como o Moderfrota, a maioria dos demais programas gerenciados pelo banco também têm juros fixos para o tomador e contam com equalização de juros pelo Tesouro Nacional. É o caso das linhas voltadas para a agricultura familiar (Moderagro, Moderinfra, Prodeagro, Prodecoop, Prodefruta e Propflora). Nestas linhas o custo para o agricultor é de TJLP (8,15%) mais 1% de spread básico do banco. Uma fonte avaliou que os agentes financeiros do BNDES tentarão "apertar" os tomadores evitando ao máximo a renegociação.