Título: Indústria elevou sua capacidade produtiva
Autor: Neumann, Denise
Fonte: Valor Econômico, 13/04/2006, Brasil, p. A2

Desde 2004, quando o país cresceu 4,9% e a produção industrial subiu expressivos 8%, a indústria brasileira acumulou capacidade para elevar a oferta de bens e suportar um crescimento maior da demanda. É essa a conclusão simples e direta que é possível extrair do gráfico abaixo.

Esse quadro mostra que, quando tomamos 2004 como base 100 (um ano de forte crescimento da indústria, recorde de utilização da capacidade produtiva e elevado nível de investimento, pois os gastos em máquinas e equipamentos e na construção civil cresceram 10,9%, segundo o IBGE), a indústria brasileira elevou sua produção com um menor grau de utilização da capacidade instalada. Uma das razões vem sendo apontada pelo departamento econômico da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e aparece confirmada na outra linha do gráfico: o consumo de bens de capital sem rodas (basicamente máquinas e equipamentos para fins industriais, construção e geração de energia, segundo critério desenvolvido pelo BNDES) cresceu 11% na mesma base de comparação. Seja com máquinas nacionais, seja com equipamentos importados, as fábricas instaladas no Brasil modernizaram-se e elevaram sua capacidade produtiva.

-------------------------------------------------------------------------------- Espaço para crescer sem pressões na inflação --------------------------------------------------------------------------------

O gráfico sugere, portanto, que há uma folga para que a demanda interna cresça sem riscos de estrangulamento de oferta e, portanto, sem pressões inflacionárias. Economistas de diferentes formações concordam com essa avaliação, mas consideram necessária alguma cautela e um pouco de moderação no otimismo com que o BNDES "vendeu" a idéia de que há uma onda vigorosa de investimentos produtivos e de modernização, semelhante à dos anos 90, após a primeira fase da abertura econômica.

Mesmo com as ressalvas, todos os sinais deste começo de 2006 são muito bons do ponto de vista do investimento. Fernando Montero, economista-chefe da corretora Convenção e ex-secretário de Política Econômica, calcula que a taxa de investimento (medida pela formação bruta de capital fixo, que considera a demanda por máquinas e equipamentos e construção civil) vai crescer 5% neste primeiro trimestre em relação ao último trimestre de 2005 e pouco mais de 10% na comparação com o começo do ano passado. O cálculo considera que março terá um comportamento semelhante ao do primeiro bimestre para estes bens.

Montero partilha da avaliação de que a indústria ampliou a capacidade de produção. Além de consumir mais bens de capital, também contratou mais, argumenta. O emprego formal no setor aumentou 8,5% no acumulado de 12 meses até fevereiro, segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho.

A CNI vem apontando a queda no nível de utilização da capacidade produtiva em seus boletins mensais. Paulo Mol, economista da entidade, ressalva que o forte uso da capacidade instalada registrado em 2004 (em outubro daquele ano o índice bateu em 84%, recorde da série) não significa que, naquela oportunidade, a indústria bateu no limite de sua oferta. "Ocorreu uma mudança estrutural no modo de produzir e hoje as empresas são muito mais ágeis em atender a um aumento de demanda", observa, explicando que, além disso, as companhias podem usar horas extras, novos turnos de produção, e fazer contratações. Para Mol, 2004 não foi um limite para a indústria, mas naquela oportunidade algumas decisões de investimento foram tomadas. Com o aperto monetário iniciado pelo BC e a contração que se seguiu na economia, projetos foram postergados.

O crescimento no consumo de bens de capital sem rodas começou no segundo trimestre do ano passado, justamente quanto a economia desabava após 12 meses consecutivos de juros em alta. O que explica esse movimento? Os economistas apontam três razões possíveis e simultâneas: bens de capital não-seriados foram encomendados em 2003/2004 e agora estão sendo produzidos e entregues; investimentos adiados após a retração de 2005 foram retomados e, a principal delas, a valorização do câmbio abriu uma janela de oportunidade para os empresários. "Mas nenhuma empresa colocaria uma expansão em andamento se o cenário da economia ainda fosse frustrante", observa Mol. A renda em alta e a inflação controlada abrem um cenário positivo, que ajuda a explicar a aceleração recente dos investimentos produtivos. Mol também arrisca outra hipótese: a concorrência com os importados acaba funcionando como um estímulo para que o empresário local seja mais produtivo e eficiente. Está em jogo sua fatia de mercado.

O professor Mariano Laplane, da Unicamp, olha com mais cautela para os indicadores. "Tivemos quase uma estagnação dos dois indicadores", argumenta, referindo-se à produção e ao uso da capacidade. Para ele, é importante saber que setor está aumentando a demanda por bens de capital. "Quem está comprando máquinas? O setor exportador ou quem atende a demanda interna?", questiona. Mesmo assim, ele vê um bom sinal para o futuro. "Um investimento não influencia o nível o nível de produção corrente, mas o de alguns meses a frente", observa.