Título: Thomaz Bastos dirá que não tratou de sigilo em reunião
Autor: Romero, Cristiano
Fonte: Valor Econômico, 13/04/2006, Política, p. A15

O ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, dirá a deputados e senadores, em sessão conjunta do Congresso que deverá acontecer na quinta-feira, que presenciou toda a reunião do ex-ministro Antonio Palocci com o advogado Arnaldo Malheiros Filho, mas que em nenhum momento os dois trataram da quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa.

Esta é a versão que o ministro, segundo apurou o Valor, apresentou em sua defesa ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a ministros do núcleo político do governo. Por essa versão, Palocci, alegando enfrentar um "problema grave" no âmbito do Ministério da Fazenda e da Caixa Econômica Federal, pediu a Thomaz Bastos que lhe indicasse um advogado. O ministro da Justiça sugeriu, então, que Palocci conversasse com o criminalista Arnaldo Malheiros.

No dia 23 de março, Palocci, Malheiros, Thomaz Bastos e o então presidente da Caixa, Jorge Mattoso, se reuniram na residência do ministro da Fazenda, em Brasília. "Fiz essa indicação para ele (Palocci) e o advogado me pediu que fosse lá para apresentá-lo. Eu fui, apresentei e eles fizeram uma reunião que eu presenciei, onde eles contaram do que se tratava, de uma maneira geral. Não houve nenhuma confissão do tipo 'eu fiz isso, estou numa fria', esse tipo de coisa, nada disso'", confidenciou Thomaz Bastos em reuniões no governo, segundo relato de um ministro.

Palocci e Mattoso, ainda segundo esse relato, não teriam mencionado, na presença de Thomaz Bastos, a quebra do sigilo bancário do caseiro, que testemunhou contra o ministro da Fazenda na CPI dos Bingos. Na presença do ministro da Justiça, os dois teriam dito apenas que tinham uma "coisa grave" em suas áreas e que isso precisava ser apurado. Daí, explicou Thomaz Bastos a um ministro, a necessidade de consulta a um advogado experiente que desse uma orientação jurídica a Palocci e Mattoso.

"Eles queriam saber os aspectos jurídicos. Isso foi objeto de uma exposição do Malheiros. Depois, o Malheiros e o Mattoso saíram para conversar com outros diretores da Caixa sobre essa mesma coisa. Aí, eu fui embora", teria relatado Thomaz Bastos a interlocutores dentro do governo. É com essa versão que o ministro da Justiça pretende desmontar, no Congresso, a tese de que teria atuado para proteger Palocci, acusado de ter ordenado a quebra do sigilo bancário do caseiro para desmoralizá-lo - em depoimento à CPI, Francenildo Costa testemunhou ter visto o ex-ministro da Fazenda freqüentando mansão em Brasília, alugada por seus ex-assessores para realizar atividades de lobby e festas com garotas de programa.

"Estou absolutamente consciente da licitude da minha conduta. Estou tranqüilo em relação a isso e vou fazer uma exposição desses fatos de acordo com o que eles (deputados e senadores) queiram saber. Tenho grande respeito pelo Congresso", disse ontem Thomaz Bastos durante conversa com um ministro. "Tudo isso é fruto de uma disputa política."

Ontem, ficou praticamente acertado que o ministro da Justiça prestará esclarecimentos ao Congresso na próxima quinta-feira. O presidente da Câmara, Aldo Rebelo, chegou a agendar o depoimento para terça-feira, mas, no fim da tarde, diante da irritação do presidente do Senado, Renan Calheiros, com o fato de não ter sido consultado sobre esse acerto, definiu-se que Thomaz Bastos falará no plenário da Câmara, numa sessão conjunta com o Senado, ou nas comissões de Constituição de Constituição e Justiça das duas Casas.

Thomaz Bastos disse aos líderes do governo no Senado e na Câmara que prefere falar numa sessão conjunta. "A desvantagem é que é muito solene, mas tem a vantagem de esgotar o tema de uma vez", comentou ele com os líderes. Renan e Aldo só deverão definir o formato do depoimento na segunda-feira.

O ministro da Justiça, segundo amigos e ministros, se diz "muito magoado" com as denúncias que vem sofrendo. "O que está acontecendo é injusto. Primeiro, porque não estou acostumado. Já passei mais de 40 anos da minha vida 'numa boa' e, de repente, entrei num furacão que eu tenho certeza que tem aspectos de disputa política e que visam à eleição presidencial", teria dito ele a um amigo. O objetivo da oposição, na avaliação do ministro, é derrubar a última linha de defesa do presidente Lula para, então, enfraquecê-lo em plena disputa eleitoral. "Mas, eles não vão conseguir não", disse o ministro em conversa com um interlocutor.

Thomaz Bastos negou que esteja demissionário. Disse que, em nenhum momento, pediu demissão do cargo e que goza da confiança do presidente. "Nem de brincadeira. Não pensei nisso nem pretendo", reagiu ele ontem à indagação de jornalistas na Câmara. "Tenho conversado diariamente com o presidente. Ele está firme em minha defesa, está me prestigiando."

Abatido pela crise que enfrenta, o ministro passará os próximos dias numa praia do litoral paulista, provavelmente, Iporanga. (Colaborou Thiago Vitale Jayme)