Título: Carestia vem do campo
Autor: Caprioli, Gabriel
Fonte: Correio Braziliense, 30/09/2010, Economia, p. 20

Problemas climáticos no Brasil e no exterior pressionam os preços dos alimentos e levam IGP-M a 1,15% em setembro. Brasileiro já sente os aumentos nas hortaliças, nos legumes, nas frutas e nas carnes

Os severos problemas climáticos vividos em algumas regiões do Brasil e também fora do país transformaram os alimentos, heróis dos preços nos últimos três meses, em vilões da inflação. Em setembro, o Índice Geral de Preços ao Mercado (IGP-M), utilizado como base para o reajuste de contratos de aluguel, acelerou para 1,15%, ante 0,77% registrado em agosto. A pressão deve manter o Banco Central atento e pode antecipar o retorno do ciclo de arrocho monetário para o início do ano que vem, segundo estima parte do mercado.

O resultado de setembro foi puxado pelo Índice de Preços no Atacado (IPA), responsável por captar as variações de custos ao produtor. De acordo com a Fundação Getulio Vargas, ele passou de 1,24% em agosto para 1,60% e, dentro do indicador, o subgrupo que mais avançou foi o de alimentos processados, de 1,32% para 3,99%.

Na avaliação de Rosemeire Santos, economista da Confederação Nacional da Agricultura, a influência do segmento alimentício nos preços deve ganhar força nos próximos meses. Há agora um grande temor de que esse movimento reduza o poder de compra, principalmente das famílias de menor renda, afirmou. Para ela, a próxima semana deve ser decisiva para a cultura de grãos, em especial a soja. O plantio está atrasado no Centro-Oeste (primeira região a receber o cultivo da safra 2010/2011) e não choveu o suficiente para garantir uma boa produtividade, considerou.

A possível frustração da safra brasileira, segundo a economista, pode agravar ainda mais os preços internacionais de commodities agrícolas, que já sofreram elevações por conta de problemas relacionados ao plantio de trigo na Rússia e à produção de algodão. Se o mercado internacional continuar com escassez, os preços tenderão a se manter firmes (em patamar alto), se for confirmada uma quebra de safra no Brasil, alimenta essa alta, avaliou.

No bolso Enquanto se intensifica nos custos de produção, a carestia dos alimentos começa a aparecer na prateleira do supermercado. O Índice de Preços ao Consumidor, outro componente do IGP-M, deixou de registrar queda de 0,27% e apresentou, em setembro, avanço de 0,34%. Quatro dos sete grupos que formam o indicador tiveram aumento de preços, mas o destaque ficou com alimentação, ao passar de -1,28% para 0,56%, puxado por hortaliças, legumes, frutas e carnes bovinas. Para o coordenador do IGP-M, Salomão Quadros, parte do aumento de preços já foi repassada ao consumidor, mas a tendência é de mais reajustes. A cadeia (produtiva) agropecuária está toda pressionada, desde a produção de grãos para ração, o que acaba pesando, por exemplo, nas carnes. Parte disso já está nos preços de alimentos ao consumidor, mas ainda tem mais efeitos que deverão aparecer, ressaltou.

A reviravolta nos preços alimentícios não deve alterar já a postura do BC em relação aos juros, segundo análise do economista-chefe da corretora Máxima Asset Management, Élson Teles. É um aumento associado a um choque de oferta pontual.