Título: Para analistas, efeito da política fiscal sobre demanda será menor
Autor: Oliveira ,Ribamar
Fonte: Valor Econômico, 22/02/2012, Brasil, p. A3

A contribuição da política fiscal para o controle da demanda agregada da economia neste ano será bem menor do que em 2011, de acordo com avaliações feitas por economistas ouvidos pelo Valor. Na semana passada, o governo anunciou o corte de R$ 55 bilhões das despesas do Orçamento para, com isso, obter a meta de superávit primário "cheia" de R$ 139,9 bilhões, sem descontar os investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

O entendimento que predomina entre os economistas é que se o governo conseguir obter a meta, equivalente a 3,1% do Produto Interno Bruto (PIB), o efeito da política fiscal sobre a demanda será neutro. Caso não consiga, como alguns analistas e consultores acreditam que venha a acontecer, o efeito será expansionista. O economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central, acha que com despesas mais altas este ano, mesmo que o superávit fique do mesmo tamanho do de 2011, o resultado final será expansionista.

Recentemente, Schwartsman questionou o cálculo do efeito do superávit primário sobre a demanda, ao mostrar que algumas das receitas do governo, como os dividendos pagos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) ao Tesouro, não retiram recursos do setor privado, como ocorre com os impostos e contribuições. Ou seja, dependendo da composição da receita, o efeito do superávit sobre a demanda pode ser menor do que se imagina.

No ano passado, a política fiscal foi contracionista, segundo os economistas consultados. "O governo retirou mais das famílias e das empresas, na forma de impostos e contribuições, do que devolveu", disse Mansueto Almeida, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). "O superávit primário foi elevado em 1,2 ponto percentual do PIB no ano passado, em comparação com 2010, e isso teve um impacto contracionista sobre a demanda da economia", explicou.

A mesma avaliação é feita pelo economista Felipe Salto, da Tendências Consultoria, que vê uma situação diferente para 2012. "Para este ano, o governo anuncia um esforço fiscal igual ao de 2011. Ou seja, não está programando uma elevação do superávit primário. Assim, a política fiscal será neutra ou expansionista", afirmou. Salto estima um superávit primário de 2,6% do PIB para este ano.

Para comparar as políticas fiscais executadas pelo governo nos últimos dois anos, os economistas partem do pressuposto de que é necessário excluir a operação de capitalização da Petrobras feita em 2010. Nela, o governo vendeu cinco bilhões de barris de petróleo para a estatal, tendo recebido R$ 74,8 bilhões. Deste total, usou R$ 42,9 bilhões para capitalizar a empresa e os R$ 31,9 bilhões restantes foram utilizados para cumprir a meta fiscal daquele ano.

O problema é que toda a operação foi feita por meio da emissão de títulos do Tesouro. Assim, uma operação financeira (a emissão de títulos) deu origem a uma receita primária de R$ 31,9 bilhões que o governo utilizou para cumprir a meta fiscal. Parte substancial do superávit primário de 2010, portanto, não foi feita com recursos que o governo tirou da sociedade.

Se os R$ 31,9 bilhões forem excluídos do cálculo, o superávit primário de 2010 passa de 2,7% do PIB para 1,85% do PIB. Como o superávit de 2011 ficou em 3,1% do PIB, o esforço fiscal adicional feito pelo governo no ano passado foi de 1,26 ponto percentual do PIB (3,1% menos 1,85%).

A grande questão entre os economistas é saber se o superávit de 3,1% do PIB será suficiente para permitir que o Banco Central (BC) faça movimentos mais ousados na redução dos juros e continue a reduzir a inflação. Mansueto Almeida acha que sem os 3,1% do PIB de superávit ficaria difícil para o BC buscar a taxa de juro de um dígito este ano. Mas ele considera que esse superávit não será suficiente para que o BC "faça apostas mais arriscadas" e, ao mesmo tempo, mantenha a inflação em queda.

Felipe Salto considera que o BC continuará reduzindo os juros este ano para uma taxa de um dígito e acha que o cumprimento da meta de superávit de 3,1% do PIB o ajudaria a fazer isso. Mas ele adverte que dependendo da trajetória de queda dos juros, o mercado poderá começar a apostar em inflação mais alta em 2013. Para Schwartsman, a política fiscal de maior gasto deste ano cria restrições importantes para a redução da taxa de juro pelo Banco Central. "Cria sim, mas o BC finge que não", disse.