Título: Congresso pede medidas enérgicas
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Fonte: Valor Econômico, 03/05/2006, Lyra, Paulo de Tarso, p. A9

Um dia depois da decisão do presidente boliviano Evo Morales de nacionalizar reservas, refinarias, dutos e operações de gás e petróleo daquele país, o Congresso Nacional reagiu com pedidos de explicação e de medidas enérgicas por parte do governo brasileiro na solução do impasse. O presidente da Petrobras, Sérgio Gabrielli, e o ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau, foram convocados para audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. Hoje, a Comissão de Fiscalização da Câmara também deverá convidá-los, além de chamar o chanceler Celso Amorim. A Comissão de Relações Exteriores do Senado votará requerimento para audiência com o embaixador da Bolívia no Brasil, Edgar Carmacho Omister.

"O governo brasileiro tem que reagir, tem que ser duro na defesa dos interesses do Estado brasileiro. Não dá para ser condescendente com a insegurança jurídica e um devaneio como esse", afirmou o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). O senador prometeu enviar um grupo de parlamentares à Bolívia para debater o tema. O presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), estuda fazer o mesmo.

"Temos de procurar a arbitragem internacional para resolver isso e exigimos uma postura firme do governo brasileiro", disse ontem o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio. O tucano fez duras críticas ao bom tratamento dado pelo presidente Lula a Morales quando da eleição do boliviano: "Avisamos que era um equívoco dar toda essa demonstração de simpatia no pleito. É uma nova demonstração de incapacidade do presidente Lula. Temos que avisar a ele que as relações bilaterais não são greve de sindicato, onde se conversa de 'compañeiro' para 'compañeiro'. Os interesses do Brasil devem estar acima."

"Evo cometeu um erro muito grande porque é uma atitude contra um parceiro econômico responsável por 20% do PIB boliviano. Ele se precipitou", afirmou o presidente do PT, Ricardo Berzoini (SP). Para Aldo Rebelo, é preciso respeitar "a soberania boliviana e defender energicamente os interesses do Brasil". Ele conversou com Lula e com políticos bolivianos. "Temos a segurança no abastecimento e que não haverá alteração do preço". Ele acredita em uma negociação de sucesso. "Nós precisamos do gás boliviano, mas a Bolívia precisa do nosso mercado."

O senador Rodolpho Tourinho (PFL-BA), ex-ministro de Minas e Energia do governo Fernando Henrique Cardoso, discorda de Aldo em relação ao preço do gás. "É claro que vai aumentar o preço e será algo contrário ao contrato. Precisamos procurar os fóruns internacionais apropriados para discutir isso", afirmou. Segundo ele, o Brasil tem posição muito duvidosa em relação ao tema, "ora tratando Morales como companheiro, ora tentando proteger os interesses da Petrobras. A mistura de ideologia com negócio nunca deu certo".

Eliseu Rezende (PFL-MG), ex-ministro da Fazenda e dos Transportes e relator do projeto que criou a Agência Nacional de Petróleo (ANP), classificou a nacionalização como "uma quebra de contrato". Rezende prega a procura da "esfera judicial, na OMC, para arbitrar a questão". A curto prazo, imagina Rezende, não haverá prejuízos. "Se houver renegociação do preço do gás, quem vai sofrer será o consumidor."

O deputado Luciano Zica (SP), especialista do PT em questões energéticas, faz a mesma reivindicação. "Temos de investir na procura de fontes internas, garantir a maioria de abastecimento daqui e depois procurar opções no mercado externo". O petista pede uma repactuação do contrato bilateral. "Os bolivianos têm razão em desconfiar do acordo firmado. É preciso ter controle social do acordo e isso não há".

O presidente da comissão que estuda a aprovação da nova lei do gás, deputado João Almeida (PSDB-BA), classificou a atitude de Morales como uma "sandice". Para ele, o presidente teria de debater com Morales o assunto antes da nacionalização, já que o tema era parte da promessa de campanha do boliviano. "Mas o Lula achou que o Morales ia descumprir as promessas de campanha, como ele mesmo fez".

O candidato do PSDB à Presidência, Geraldo Alckmin, criticou a política externa do governo Lula diante da nacionalização das reservas de gás e as refinarias pela Bolívia. "A estratégia internacional do governo brasileiro tem sido errática", disse ele, em palestra para empresários em Fortaleza (CE). "A administração Lula tem o dever de defender os interesses internos", afirmou.