Título: Acaba o processo de execução cível
Autor: Teixeira, Fernando
Fonte: Valor Econômico, 23/06/2006, Legislação & Tributos, p. E1

Principal proposta da reforma infraconstitucional do Poder Judiciário, a nova lei para a execução de títulos judiciais - a Lei nº 11.232, de 22 de dezembro de 2006 - entra em vigor a partir deste sábado prometendo maior celeridade nas ações de cobrança, queda no spread bancário e uma nova onda de disputas judiciais. Juízes e advogados já divergem na interpretação de alguns dos pontos fundamentais da nova lei, o que deve motivar um longo enfrentamento entre devedores e credores a partir da próxima semana.

Segundo o jurista Petrônio Calmon, secretário-geral do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBPT) e um dos autores da nova lei, vários livros e artigos recentes revelam a difusão de posturas conservadoras, interpretando a nova lei de forma a manter as antigas garantias dos devedores. Nas mãos de bons advogados, as divergências podem se tornar uma arma dos inadimplentes para escapar das novas regras.

A disputa deve envolver dois dos principais nós do processo de execução que foram desatados pela nova lei. O primeiro é o próprio processo de execução, transformado em uma simples fase de execução. A maior vantagem da nova regra é evitar a necessidade de uma nova citação do devedor - exigência responsável pela maior parte dos fracassos das cobranças judiciais. Segundo um levantamento do Banco Mundial (Bird) sobre a cobrança judicial no Brasil, 48% dos processos são extintos porque não é possível encontrar o devedor para ser citado.

De acordo com Petrônio Calmon, há uma série de interpretações segundo as quais a nova lei não extingue a necessidade de intimar novamente o devedor. Pela nova lei, depois da condenação o devedor tem 15 dias para pagar o que deve ou é aplicada uma multa de 10%. Segundo as interpretações divergentes, o juiz deve intimar de ofício o devedor ou seu advogado para começar a contar o prazo de 15 dias, ou esperar o credor solicitar a intimação. Para Calmon, esta interpretação traz de volta as regras anteriores ou pode criar uma situação ainda pior.

Outra divergência perigosa para o funcionamento das novas regras é a interpretação do que significa o termo "condenação". A intenção do texto é a de que condenação significa a sentença de primeiro grau, mas há uma divergência segundo a qual o termo significa o trânsito em julgado da ação. A diferença entre uma interpretação e outra implica na espera por recursos aos tribunais locais, superiores e vários anos a mais de tramitação das ações judiciais. Para Petrônio Calmon, se fosse escrito hoje, o termo "condenação" teria sido substituído por "sentença" para evitar as dúvidas.

De acordo com o jurista, o sentido da nova lei é aperfeiçoar o sistema de execução, e não necessariamente promover mais celeridade. Para isso, foram retiradas garantias exageradas concedidas aos devedores. No processo penal, explica, há uma série de garantias para evitar a condenação de um inocente, o que traria um dano irreparável. Já em questões patrimoniais, essas garantias são desnecessárias, pois o dinheiro é um bem perfeitamente substituível. Caso uma condenação seja revertida mais tarde, o devedor prejudicado terá as mesmas facilidades agora concedidas ao credor para recuperar o dinheiro.

Um exemplo deste princípio está no fim do efeito suspensivo dos embargos à execução. De acordo com Calmon, esta é a novidade de maior impacto, ao lado do fim do processo de execução. Pela nova regra, mesmo com a apresentação de embargos, o processo segue correndo sob conta e risco do credor. A exceção é quando há evidência de um grave dano de difícil reparação. Mesmo nessa situação, o credor pode prosseguir com a execução se apresentar uma caução. Segundo o jurista, a regra deve beneficiar principalmente os bancos, que possuem grandes quantidades de ativos financeiros para oferecer como garantia.

Segundo Calmon, a proposta de reforma do processo de execução foi dividida em duas para facilitar sua tramitação. A outra parte da proposta foi batizada de "projeto de execução de títulos extrajudiciais" e deve acelerar mais ainda a execução, inclusive dos títulos judiciais, ao criar novas regras para a penhora e para o leilão de bens. Esta parte da reforma, contudo, ainda aguarda aprovação no Senado.

O projeto de execução de títulos extrajudiciais se aplica a títulos como cheques, duplicatas e todos os tipos de contratos bancários. Mas a proposta de execução de títulos judiciais é vista como mais importante porque, em geral, os créditos problemáticos acabam virando ações judiciais, em processos revisionais.

As regras já aprovadas para os títulos judiciais, diz o jurista, se aplicam imediatamente a todos os processos em trâmite na Justiça, mas só para sentenças prolatadas a partir de segunda-feira. Assim, não será possível aplicar a multa de 10% para sentenças proferidas anteriormente.