Título: Socialista francês quer IR de 75% para supersalários
Autor: Carnegy ,Hugh
Fonte: Valor Econômico, 29/02/2012, Internacional, p. A11
François Hollande, o candidato socialista à Presidência francesa, desfechou uma surpreendente ofensiva contra pessoas de alta renda, propondo uma alíquota de imposto de 75% sobre rendimentos anuais superiores a € 1 milhão - uma alíquota muito acima das mais altas em outros países na Europa.
Rapidamente criticado pelo presidente Nicolas Sarkozy, que Hollande pretende destronar nas eleições de maio, o desafiante disse que o crescente nível de remuneração de executivos em grandes empresas, que chega, segundo ele, a € 2 milhões em média por ano, é inaceitável.
"Eu ponderei a questão e estou anunciando aqui que [para rendimentos] acima de € 1 milhão [por ano] a taxa de imposto deveria ser de 75%, porque não é possível ter esse nível de remuneração", declarou ele durante um programa de televisão na noite de segunda-feira.
A proposta, que surge na esteira da declaração de Hollande, no mês passado, de que o mundo financeiro é o seu "verdadeiro adversário", foi manifestada pouco antes de uma visita a Londres, prevista para hoje, durante a qual Hollande tentará conquistar os votos de cerca de 300 mil franceses que vivem no capital britânica - muitos deles trabalhando no setor financeiro.
Sarkozy, cujo ataques contra os excessos dos bancos e contra a alta remuneração de dirigentes estão muito aquém das propostas de Hollande, disse que a mais recente iniciativa de seu rival cheira a "improvisação" e "preocupante amadorismo", apontando para a enorme divergência que a medida iria criar com outro países europeus.
De acordo com números da Organização para a Cooperação Económica e Desenvolvimento (OCED), a Suécia tem a maior alíquota de imposto de renda na Europa, de 56,5%. A maior alíquota da Alemanha chega a 47,5%. A maior alíquota na França é de 41%, com uma taxa adicional temporária de 3 e 4 pontos percentuais sobre rendimentos superiores a € 250 mil euros e € 500 mil, respectivamente.
A proposta de Hollande, que claramente deixou alguns altos membros de seu partido "numa saia justa", alimentará acusações de que ele é instintivamente hostil aos ricos, apesar dos esforços, dele e de seus correligionários, em insistir que um governo socialista prosseguirá com políticas em favor da iniciativa privada. Com frequência, Hollande ainda tem de tentar se desembaraçar de uma situação constrangedora decorrente de um comentário feito alguns anos atrás, segundo o qual que ele não gosta dos ricos.
Críticos disseram que a proposta tributária, que se aplicaria a apenas 0,01% dos contribuintes - de acordo com um estudo do Senado sobre faixas de renda no país-, arrecadaria um valor relativamente pequeno de dinheiro, mas criaria o risco de expulsar os ricos da França, repetindo um êxodo dos ricos ocorrido quando François Mitterrand, mentor político de Hollande, assumiu o poder em 1981.
Mas Hollande manteve-se firme em sua posição, dizendo ontem: "Isso envia um sinal, uma mensagem de coesão social. Há um esforço a ser feito, também de patriotismo. É patriótico aceitar pagar um imposto adicional para restaurar o país".
A posição atual de Hollande vai muito além de sua plataforma de campanha, que inclui uma alíquota máxima de 45% sobre os rendimentos superiores a € 150 mil, eleva os impostos sobre ganhos de capital em níveis correspondentes aos do imposto sobre a renda e impõe um teto para isenções tributárias que beneficiam os ricos.
As declarações parecem ter por objetivo consolidar o apoio da esquerda, quando Hollande procura defender sua posição de liderança nas pesquisas às vésperas do primeiro turno da eleição, em 22 de abril.
Três pesquisas nos últimos dois dias mostraram que Sarkozy está estreitando a defasagem para um intervalo entre 1,5 e 4,5 pontos percentuais, mas Hollande mantém uma saudável liderança para o segundo turno, em 6 de maio.