Título: Setor público gasta R$ 530 bi com juros desde começo do governo Lula
Autor: Lamucci, Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 06/07/2006, Finanças, p. C2

Lopes: gastos com juros devem cair lentamente nos próximos anos Os gastos com juros no Brasil continuam absurdamente elevados, ainda que a taxa Selic esteja em queda desde setembro do ano passado. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve encerrar os quatro anos de seu governo com despesas financeiras de 8% do Produto Interno Bruto (PIB) ao ano, um percentual próximo dos 7,96% do PIB no primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso e acima dos 6,39% do PIB da primeira administração do tucano.

Em 2006, com a queda dos juros e o maior crescimento da economia, a relação entre os gastos do setor público com juros e o PIB devem cair para 7,5%, um patamar ainda muito alto. Em termos absolutos, o valor assusta mais, devendo ficar na casa de R$ 150 bilhões. Desde o começo do governo Lula até maio deste ano, o setor público pagou R$ 530 bilhões, em valores corrigidos pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).

A pesada carga de juros se explica basicamente por dois fatores, de acordo com o economista-chefe do Pátria Banco de Negócios, Luís Fernando Lopes: o tamanho da dívida pública e o nível dos juros reais. A dívida líquida do setor público fechou maio em 50,7% do PIB, bem acima do nível de outros emergentes. A do México, por exemplo, está na casa de 30% e a do Chile, em 15%.

O problema, como lembra Lopes, é que juros muito elevados incidem sobre essa dívida, que supera R$ 1 trilhão. Neste ano, mesmo com o afrouxamento da política monetária, a taxa real deve ficar em 10,9%, na comparação da expectativa do mercado para a taxa Selic média, de 15,38%, e o IPCA esperado para 2006, de 3,98%. Do ponto de vista das contas públicas, essa é a medida mais importante de juro real, por comparar a taxa básica com a inflação acumulada no ano, diz o economista Fábio Akira, do JP Morgan.

Lopes e Akira consideram que o país está preparado para testar juros reais mais baixos daqui para a frente, devido à melhora significativa de indicadores de solvência do país, principalmente nas contas externas. A definição da meta de inflação para 2008 em 4,5%, o mesmo nível de 2006 e 2007, também devem ajudar a economia brasileira a conviver com taxas reais menores, avalia Akira, por não estabelecer uma trajetória excessivamente ambiciosa para os índices de preços nos próximos anos.

Para Lopes, um dos pontos que explicam o nível dos juros elevados no Brasil foi justamente a definição de metas muito ambiciosas. Ao manter o alvo em 4,5% para 2008, a tendência é que seja possível ter uma política monetária menos rigorosa. Ele acredita que a carga de juros tende a cair a um ritmo de 0,5 ponto percentual do PIB por ano, o que não é um ritmo dos mais rápidos.

Para reduzir as despesas financeiras de modo mais incisivo, seria necessária uma política fiscal mais apertada, avalia ele. Segundo Lopes, o ideal seria que o resultado das contas públicas fosse positivo mesmo considerando o pagamento de juros. "Com isso, a dívida do setor público começaria a encolher em termos absolutos, e não apenas como proporção do PIB", diz ele. "Mas, sendo realista, não parece haver condições políticas para isso".

Akira também avalia que uma política fiscal mais rigorosa, com base em cortes de gastos correntes, seria o caminho mais indicado para reduzir o nível das despesas financeiras do setor público como proporção do PIB. "Os juros cairiam mais e a economia cresceria mais, reduzindo a relação entre gastos financeiros e PIB". Mas, em termos absolutos, não devem ocorrer quedas significativas das despesas com juros, lembra Lopes. Isso se daria apenas se houvesse uma redução da dívida em valores absolutos. Ele acha difícil que as despesas anuais com juros fiquem significativamente abaixo de R$ 150 bilhões nos próximos anos.

Nos quatro anos do governo Lula, os juros reais devem ficar, em média, em 11,1%, um pouco acima dos 10,3% registrados no segundo mandato de FHC, mas bem abaixo dos 21,6% da primeira administração do tucano. Entre 1995 e 1998, as despesas financeiras foram relativamente mais baixas (6,39% do PIB contra 7,96% do período de 1999 a 2002, por exemplo) porque a dívida pública era menor, diz Lopes. Em 1995, era de 30% do PIB.