Título: Senhora do primeiro turno
Autor: Rizzo, Alana; Sassine, Vinicius
Fonte: Correio Braziliense, 04/10/2010, Política, p. 6

Marina Silva deixa a disputa eleitoral com votação expressivaearesponsabilidade de ter prolongado a escolha do próximo presidente

São Paulo e Brasília¿Desafeto atravessado na garganta da petista,Marina Silva (PV) empurrou Dilma Rousseff (PT) para a disputa emsegundo turnocomJosé Serra (PSDB). A candidata verde deixa a disputa presidencial como a responsável por adiar a definição do novo presidente da República.

Marina teve votação superior à previsão de todas as pesquisas, arrancou votos de Dilma, provocou o segundo turno e dá uma nova perspectiva ao discurso na etapa final da campanha: obrigatoriamente, Dilma e Serra precisarão defender a sustentabilidade, bandeiradeMarina, para conquistar os votos da onda verde.

Commais de 19,5 milhões de votos¿19,4% dos votos válidos¿, Marina foi decisiva para evitar a vitória deDilma em primeiro turno.

A importância da senadora para o processo eleitoral não se encerra com o fim da apuração das urnas.

Tucanos e petistas disputam o apoio da candidata do PV na segunda e última etapa da disputa presidencial. Lideranças do PV já assediam o PSDB há pelo menos 40 dias,quandocomeçoua se delinear uma aproximação entre cúpulas partidárias. Ao mesmo tempo, emissários do PT do Acre¿ terra natal deMarina¿passaram a sustentar que ela estaria ao lado deDilma no segundo turno.

Já naquela fase da campanha, Marina irritou-se com as especulações e desautorizou que correligionários ou aliados petistas falassem em seu nome. No primeiro pronunciamento como candidata derrotada nas urnas, a senadora não manifestou apoio a Dilma ou Serra, mas não disse que vai se manter neutra no segundo turno. ¿A intenção e o gesto revelam o início de um processo que inclui plenárias e que, de fato, sinaliza a nova política que estamos preconizando. Foi nessa política que as pessoas votaram e que aos poucos estão se comprometendo¿.

Marina disse que o PV, agora, discute o melhor posicionamento, que faça ¿jus¿ aos votos recebidos nas urnas.

¿A nossa decisão não terá relação com a velha política que se manifesta só por se manifestar e vislumbrando pontos lá na frente¿, disse, informando que, durante a semana, vai se reunir com dirigentes da legenda e com¿núcleos vivos da sociedade¿ que a apoiaram para o início de um processo interno de discussão.

Independentemente de sua posição, os 19,5 milhões de votos obtidos na disputa presidencial fortaleceram o nome deMarina no atual cenário político. Pela postura de embate demonstrada na fase final da campanha, ao bater em Dilma e Serra, a senadora se coloca no campo da oposição, mesmo sem saber quem vai se sentar na cadeira de presidente a partir de 1º de janeiro de 2011.

Semcargo a partir de então, Marina deve ganhar força dentro do PV e atuará no terceiro setor fará da defesa do meio ambiente a mesma bandeira que lhe garantiu uma votação expressiva ontem.

No pronunciamento à noite, ela e o candidato a vice, Guilherme Leal, disseram ser ¿maiores que as circunstâncias¿, ao falarem sobre o futuro político dos dois.

Desde a saída do PT, emagosto do ano passado, e a filiação poucos dias depois ao PV,Marina construiu uma aliança com diferentes setores da sociedade. Primeiro, aproximou-se do empresariado alinhado à defesa da sustentabilidade.

Depois, assumiu dentro das igrejas evangélicas umaposição de liderança política, apesar dos rachas partidários existentes em cada matiz protestante.

O apoio espontâneo de movimentos suprapartidários compensou a completa ausência de coligação a outros partidos.

Mesmo derrotada nas urnas e forado segundo turno,Marina comemorou os quase 20 milhões de votos. E não é para menos. Em 2006, a então candidata à PresidênciaHeloísaHelena (PSol) obteve 6,5 milhões de votos.Há quatroanos, Heloísa gerouumamovimentação semelhante à provocada porMarina,mas foi perdendo forças até o dia da votação. Chegar a quase 20% dos votos é uma conquista surpreendente para a própriaMarina.Em1988, quando foi eleita pela primeira vez para o cargo de vereadora emRioBranco (AC), ela obteve 2,5 mil votos.

Não à toa, ela comemorou o segundo turno das eleições brasileiras.

Com os olhos marejados e praticamente sem voz,Marina afirmou que seu projeto foi vitorioso.

¿O eleitor brasileiro quebrou o plebiscito. Escolheu ouvir duas vezes, olhar duas vezes¿, disse, completando que, mesmo percebendo todas as melhorias na vida do brasileiro, o eleitor mostrou que¿nem só de pão vive o homem¿.