Título: Minirreforma eleitoral é ineficaz para baixar previsão de despesas
Autor: Basile, Juliano e Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 06/07/2006, Política, p. A10

Os candidatos à Presidência aumentaram suas previsões de custos de campanha exatamente no ano em que o Congresso aprovou uma extensa legislação para coibir os gastos milionários nas eleições. O presidente Lula, que formalizou ontem a sua candidatura à reeleição, ao lado do vice José Alencar (PRB), informou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que poderá gastar até R$ 89 milhões na eleição deste ano. O tucano Geraldo Alckmin e seu candidato à vice, José Jorge (PFL), apresentaram um número próximo: R$ 85 milhões.

Em ambos os casos, os aumentos são consideráveis em relação à campanha de 2002. Naquele ano, Lula previu custos de, no máximo, R$ 56 milhões e gastou pouco mais de R$ 39 milhões. O então candidato tucano à Presidência, José Serra, estimou a campanha em R$ 65 milhões, mas declarou despesas de R$ 35 milhões. Ou seja, Lula subiu em 60% a sua previsão de gastos. E o PSDB, em 30%. Somadas, a previsão dos dois principais candidatos é 43% superior à de 2002.

A elevação do teto da campanha surge depois de o Congresso barrar uma série de práticas que oneravam os partidos. Na campanha, que começa oficialmente hoje, será vedada a distribuição de camisetas e brindes, a realização de showmícios e as propagandas em outdoors, faixas e até pichações. Os candidatos não podem contratar artistas ou trios elétricos. As restrições foram impostas pela minirreforma eleitoral, aprovada no início do ano exatamente para coibir o excesso de gastos e o caixa 2.

Segundo o presidente do PT. Ricardo Berzoini, isso não significa que a campanha petista chegará a esse valor. "É um teto. Em 2002 previmos R$ 56 milhões, mas gastamos R$ 39 milhões " .

Estimativas do corregedor-geral eleitoral, ministro Cezar Rocha, indicam que a proibição dos brindes pode gerar uma economia de 30% a 50% nos gastos. Somente o fim das camisetas pode levar a uma redução de 20%. Logo, a previsão de gastos deveria ser reduzida. Por que não foi?

"Esse valor é apenas uma estimativa", disse ao Valor o advogado da campanha de Lula junto ao TSE, Márcio Luiz Silva. "O teto serve apenas para cumprir a lei". Até a semana passada, o PT pretendia estimar em R$ 55 milhões a campanha. O que mudou? "O partido está preocupado em cumprir a lei. Nada mais", explica Luiz Silva.

A avaliação do PSDB é semelhante. José Eduardo Alckmin, advogado do candidato tucano - de quem é primo -, aponta dois fatores para a estimativa "alargada". Primeiro, o fato de ser apenas uma previsão. "Não significa que o gasto será esse", explica. "A previsão deve ser feita de forma prudente, sem que signifique gasto efetivo", continua. E, em segundo lugar, o fato de a campanha à Presidência ser totalmente diferente das campanhas locais. "O gasto é muito maior com a preparação de programas eleitorais, com os deslocamentos do candidato, com a estrutura de apoio", explica Alckmin.

Uma outra explicação é que, com a proibição dos brindes e outdoors, a campanha teria ficado excessivamente concentrada na TV, o meio mais caro de campanha.

Tanto o PT quanto o PSDB fizeram estimativas prevendo um segundo turno. Os partidos sabem que será difícil arrecadar neste ano, após as denúncias de caixa 2 que atingiram os partidos no ano passado. Por outro lado, acreditam que, num segundo turno, há um engajamento maior dos apoiadores nas campanhas.

Além disso, o rigor do TSE, que já cassou tempo de TV do PT e do PSDB mesmo antes de a campanha começar oficialmente, levou ambos a elevar a previsão de despesas para a eleição. Os partidos não querem se arriscar com uma estimativa que não se confirme no final. Então, chutaram alto.

Lula está na coligação "Força do Povo", formada por PT, PRB e PCdoB. Alckmin, na coligação "Por um Brasil Decente", de PSDB e PFL.

Com as novas proibições na campanha deste ano, a atenção deverá ser redobrada no horário gratuito de rádio e na televisão. Proibidos de usar os métodos tradicionais de campanha, como camisetas e showmícios, os candidatos terão de centrar forças nos programas gratuitos - um dos únicos focos de campanha que não foram atingidos pela minirreforma.

Nesse contexto, ganha importância o trabalho dos advogados dos partidos junto ao TSE. É no tribunal que os candidatos perdem ou ganham mais espaço na TV e no rádio. Essa variação depende da defesa jurídica feita no tribunal nos pedidos de direito de resposta e nas ações em que se requer o corte de tempo de TV devido a ofensas do adversário. "A campanha ficará focada totalmente na TV", disse Luiz Silva. "O trabalho no TSE será importantíssimo para resguardar o tempo de TV", completou.

Já Eduardo Alckmin acredita que as novas regras irão afetar mais as campanhas para o Congresso. No caso dos deputados, explica, os brindes e as faixas são mais importantes, afinal, eles têm menos tempo na TV. Já no caso da campanha presidencial, a tônica sempre foi o horário gratuito. "O principal sempre foi o rádio e a TV. É lá que se decide". A campanha gratuita no rádio e televisão começa em 15 de agosto. O primeiro turno será em 1º de outubro. O segundo, em 29 de outubro.

Ontem, Berzoini apresentou oficialmente o tesoureiro da campanha, José de Filippi Júnior, na sede do partido, em Brasília, que anunciou o primeiro doador da campanha: é o empresário José Alberto de Camargo, ex-presidente da Companhia Brasileira de Mineração e Metais (CBMM), uma empresa do grupo Moreira Salles em associação com a multinacional Molycorp. Camargo hospedou Lula em sua fazenda depois da campanha de 2002 e patrocinou o Instituto da Cidadania. Filippi não revelou o valor da doação.

O presidente do PT disse que a campanha deste ano marcará uma mudança na relação do PT com os partidos aliados. Ele garantiu que, no máximo, haverá compartilhamento de gastos de material nos casos de comícios e eventos em comum, sem repasses de dinheiro para os aliados

Berzoini afirmou, ainda, que que a grande dívida do PT impedirá a legenda de fazer doações à campanha de Lula.