Título: Diante da crise na UE, economia russa estável é trunfo
Autor: Rose,Scott
Fonte: Valor Econômico, 02/03/2012, Internacional, p. A16

As pesquisas mostram que Putin, 59 anos, poderá obter 60% dos votos na eleição domingo, suficientes para evitar um segundo turno. Embora esse percentual seja inferior aos 71% que ele conquistou em 2004 e aos 70% obtidos por Dmitri Medvedev na eleição realizada quatro anos depois, isso sugere que os protestos iniciados após a eleição parlamentar em dezembro não minaram sua autoridade.

Enquanto problemas de endividamento derrubam governos - em Portugal, na Grécia e na Roménia -, Putin está dizendo aos eleitores que usará as receitas petrolíferas do país para aumentar os gastos, inclusive de programas sociais e militares. Isso ampliou suas chances eleitorais, fomentando uma alta de 18% no índice russo de ações Micex desde 12 de dezembro, quando os protestos anti-Putin tinham levado o indicador a um mínimo em dois meses.

"O desemprego e a inflação estão em níveis excepcionalmente bons, neste momento, os melhores em muito tempo", diz Valery Fedorov, diretor da VTsIOM, agência estatal de pesquisas, em entrevista por telefone, falando em Moscou. "Isso cria um cenário totalmente auspicioso para uma reeleição de Putin."

Putin chama a atenção para uma economia que continua crescendo, no mesmo momento em que a crise da dívida soberana na região do euro ameaça empurrar um dos maiores mercados importadores da Rússia para a recessão. O Produto Interno Bruto (PIB) per capita (em paridade de poder de compra) mais que duplicou desde quando ele assumiu a Presidência pela primeira vez, no fim de 1999, para US$ 16.687,38, no fim do ano passado, segundo dados do Fundo Monetário Internacional.

A economia russa cresceu 1,5% no quarto trimestre em relação aos três meses anteriores e expandiu-se 4,9% em base anual, estima o Ministério da Economia. O PIB dos 17 países da área do euro se contraiu, no quarto trimestre, pela primeira vez em 2,5 anos, encolhendo 0,3% em comparação com os três meses anteriores.

Suas promessas de campanha implicam um aumento dos gastos governamentais de 4,8 trilhões de rublos (US$ 164 bilhões), ou 5% do PIB, até 2018, segundo estimativa da Capital Economics, uma empresa de pesquisas londrina.

A região do euro e os EUA estão agora "curtindo uma ressaca", depois de embebedarem-se de endividamento para fomentar crescimento, disse Putin em uma conferência para investidores em Moscou em 2 de fevereiro. A dívida do governo russo estava em torno de 10% do PIB em 2011, a menor relação dívida/PIB entre todos os países com "grau de investimento", disse a Moody"s Investors Service em relatório de 29 de fevereiro.

"A Rússia é, tradicionalmente, um Estado paternalista, onde as pessoas gostam de ser cuidadas", disse Mikhail Shamolin, diretor executivo da AFK Sistema, uma holding controlada pelo bilionário Vladimir Evtushenkov, em entrevista. "Estabilidade neste momento é melhor do que mudança. Isso permitirá que a classe média cresça em tamanho, criando pessoas capazes de assumir responsabilidades."

Os mercados russos se estabilizaram depois dos primeiros protestos, alimentados por acusações de supostas fraudes numa eleição parlamentar em dezembro que deixou o partido de Putin com estreita maioria.

O custo do seguro da dívida russa contra calotes por cinco anos - usando swaps de risco de crédito (CDS, sigla em inglês) - caiu quatro pontos base, ontem, para 182, ou seja, abaixo do pico registrado no ano passado, de 338 pontos, em 4 de outubro, segundo a provedora de dados CMA, de propriedade do CME Group Inc, que compila preços fornecidos por traders que operam em mercados de balcão.

Os CDS subiram 75 pontos base num mês em que manifestações de protesto anti-Putin tomaram conta do centro de Moscou, chegando a 290 pontos base em 5 de janeiro. Um ponto base é 0,01 ponto percentual.

O governo Putin também implementou medidas de estímulo fiscal para sustentar o crescimento, depois que uma alta nos preços de commodities deixou o orçamento russo superavitário, enquanto outros países europeus buscavam colocar em vigor medidas de austeridade. O petróleo bruto dos Urais, o principal mix petrolífero exportado pela Rússia, custava em média US$ 109 por barril, no ano passado, ou seja, 40% mais que em 2010, e estava sendo negociado acima de US$ 120 nesta semana.

Os críticos de Putin dizem seus planos de gastos podem ser vítima de oscilações no preço do petróleo. Planos de gastos militares colocam em risco a estabilidade econômica do país, disse o ex-ministro das Finanças Alexei Kudrin antes de ter sido demitido por Medvedev em setembro.

O custo do petróleo dos Urais mais que quadruplicou desde que Putin se tornou presidente em 2000. A dependência russa das exportações de commodities para custear "gastos extravagantes" implica um nível "excessivamente elevado e insustentável" para o preço do petróleo necessário para equilibrar o orçamento, disse o BNP Paribas SA em relatório de 14 de fevereiro.

O país poderá necessitar que o preço médio do petróleo fique em até US$ 200 por barril em 2018, em comparação com US$ 125 neste ano, segundo o BNP.

"Eu acho que toda uma série de promessas feitas recentemente são irresponsáveis e claramente populistas", disse Sergei Guriev, reitor da Nova Escola Econômica, em Moscou.

Apesar disso, pesquisas estão mostrando que Putin vencerá a eleição presidencial no primeiro turno, tornando desnecessário um segundo turno pela primeira vez desde 1996. Dois terços dos prováveis eleitores pretendem votar em Putin, informou o Levada Center, firma de pesquisas independente em 24 de fevereiro. Projeções do Centro Panrrusso de Estudos da Opinião Pública (VTsIOM) e da Fundação de Opinião Pública dizem, respectivamente, que Putin deverá vencer com 59,9% e 60,3%.