Título: Aliança Renault-GM não trará benefícios para filiais no Brasil
Autor: Olmos, Marli
Fonte: Valor Econômico, 07/07/2006, Empresas, p. B8

Se alguém duvida que a aliança da General Motors com a Renault venha a se concretizar no mundo, no Brasil e na América do Sul esse casamento parece ainda mais improvável. Nada indica, até o momento, que a aliança possa beneficiar algum dos dois lados, seja ela na área de compras ou de manufatura. Em todos os aspectos, franceses e americanos teriam mais a perder do que a ganhar numa sinergia das operações na região.

A começar pelo tamanho, GM e Renault são completamente diferentes. A participação da marca francesa equivale a 13% da fatia da montadora americana no mercado brasileiro. A produção da GM é sete vezes maior, visto ainda que o peso da sua exportação a partir do Brasil é muito maior do que a da provável parceira. O mesmo serve para o tamanho do quadro de empregados. Seguindo orientação das matrizes, as subsidiárias locais não comentam o assunto.

Poderia se pensar na possibilidade de ganhos no caso de uma sinergia em compras. Quando anunciou o plano de reestruturação mundial, em fevereiro, o presidente da Renault/Nissan, Carlos Ghosn, mostrou disposição em cortar os custos de compras globais da Renault em 14%.

No Brasil, os fornecedores de peças não gostam nem de lembrar dos tempos da aliança GM-Fiat. A fusão das duas empresas resultou num cliente que ficava com metade da produção de componentes no país. Por outro lado, há quem lembre no setor que mesmo com essa força, havia desavenças entre os gerentes das duas empresas, que tinham receio de "entregar o ouro para o bandido".

A possibilidade de a aliança se desfazer no futuro, como aconteceu com a Fiat, pode deixar o pessoal de compras da GM ainda mais inseguro para compartilhar com a equipe francesa técnicas de negociação comercial.

O acordo entre Fiat e GM também trouxe troca de tecnologia em motores. A Fiat passou a usar o motor 1.8 fabricado pela GM. Mas o consultor de empresas do setor automotivo Richard Dubois lembra que a GM está em plena fase de desenvolvimento de uma nova família de motores. Isso significa que o investimento já foi feito e não haveria ganhos significativos em parcerias nessa área antes de cinco anos - prazo mínimo para um novo ciclo de investimentos.

Na área de produtos, o quadro também não favorece uma união. O projeto de carro em que a Renault e todo o mercado automotivo aposta para reerguer a operação da montadora francesa no Brasil é o Logan, cujo lançamento está marcado para 2007. Mas esse modelo vem para brigar num espaço de mercado em boa parte ocupado pelo Celta, da GM. O Brasil é, aliás, o único mercado do mundo em que a GM vende um carro tão compacto.

Outros produtos disputam faixas iguais. Caso do Clio (Renault) e Corsa (GM). A Nissan, já parceira da Renault, concentra a atuação na América do Sul nas vendas de utilitários, outro segmento em que a GM é forte e do qual dificilmente abriria mão.

A situação se complica ainda mais na área de manufatura. Ambas têm capacidade de sobra. A GM pode produzir até 650 mil unidades por ano no Brasil. Mas não chega 570 mil e anunciou recentemente que fechará um turno na fábrica de São José dos Campos (SP). Com apenas um turno, a Renault produz hoje pouco mais de um terço do que comporta a fábrica em São José dos Pinhais (PR).

A situação não é diferente no restante da América do Sul. Com uma fábrica mais antiga que a brasileira, a Renault da Argentina conta com estrutura mais do que suficiente. O mesmo acontece com a GM que, há poucos anos até fechou uma das duas fábricas localizadas na Argentina. Nos demais países, ambas contam com instalações de montagem ou de importação de carros, fornecidos, sobretudo, pelo Brasil.

Existe uma vantagem na negociação da possível aliança entre as duas companhias. Todos os executivos envolvidos conhecem bem o Brasil. Ghosn é brasileiro, Rick Wagoner, presidente mundial da GM, e Frederick Henderson, o homem de finanças da montadora americana, já ocuparam a presidência da GM do Brasil. E os três falam português.