Título: Caramuru revê resistência a transgênicos
Autor: Bouças, Cibelle
Fonte: Valor Econômico, 11/07/2006, Agronegócios, p. B14

A Caramuru Alimentos, que sempre optou pela produção de soja convencional, começa a repensar sua tradicional resistência aos transgênicos. A empresa, maior processadora de grãos de capital nacional, reuniu-se recentemente com clientes europeus e avalia a possibilidade começar a utilizar grãos geneticamente modificados (OGMs) a partir da próxima safra.

"Houve um arrefecimento na cobrança por não-OGMs em alguns mercados. Vamos procurar saber como se dará a oferta desses produtos para definir a melhor estratégia", adianta César Borges de Sousa, vice-presidente da Caramuru. Na semana passada, o executivo visitou alguns de seus principais clientes na Holanda, na Itália e na Alemanha.

O mercado europeu, segundo ele, continua impondo fortes restrições a produtos destinados ao consumo humano produzidos a partir de transgênicos. No caso da lecitina de soja, por exemplo, os europeus chegam a pagar por um produto sem OGMs o dobro do valor de uma lecitina que contenha algum índice de transgenia. "E é essa combinação de produtos não transgênicos e de alto índice de proteínas é o que tem nos salvado até agora em termos de rentabilidade", pondera Sousa.

Ele observa, porém, que os produtores de carnes arrefeceram a cobrança por produtos não-transgênicos. "Como as carnes não são rotuladas por uso de ração transgênica, os produtores ficaram menos exigentes". Mas, segundo Sousa, o mercado europeu ainda paga prêmio de até 10% sobre o preço internacional de óleo e farelo produzidos com soja convencional.

A empresa definirá, no mês que vem, se começará a aceitar soja transgênica na safra 2006/07. Tudo dependerá da relação de oferta e demanda internacionais pelos produtos não-transgênicos e os prêmios pagos por esses itens. "Hoje os não-OGM são um nicho rentável. Quando deixarem de oferecer prêmios, a saída para o Brasil será exportar grãos massivamente", prevê Sousa.

A Caramuru também está atenta ao desenvolvimento do mercado de biodiesel, também considerado estratégico. O grupo já tem aval da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) para instalar uma usina em Itumbiara (GO) com capacidade para 110 milhões de litros de por ano, mas, por enquanto, prefere não detalhá-lo.

Neste ano, a empresa prevê investir, no total, R$ 45 milhões, ante os R$ 35,2 milhões de 2005. Conforme Sousa, os recursos serão dirigidos principalmente à consolidação de projetos nas área de logística e gestão de vendas. Ele destaca a construção de um armazém em Itumbiara (GO), que centralizará cargas que depois serão distribuídas em todo o país. Em abril, a empresa também anunciou gasto de R$ 9 milhões, em parceria com a Ferronorte, para elevar a capacidade de um de seus terminais no porto de Santos de 135 mil para 180 mil toneladas - projeto que será concluído em 2007.

"Os investimentos na área de logística têm como principal objetivo facilitar o transporte e reduzir custos de produção", diz. Mesmo com as obras em andamento, a Caramuru prevê para o ano um crescimento de 28% nos embarques de produtos pelos terminais, passando de 2,5 milhões para 3,2 milhões de toneladas.

No caso das exportações de soja, afirma Sousa, a previsão é de redução, em consequência da queda da demanda por produtos brasileiros no exterior decorrente da menor competitividade em relação à Argentina e aos Estados Unidos.

A expectativa da empresa é processar 1,05 milhão de toneladas de soja em 2006, ante 1,026 milhão no ano passado. Mas, desse total, 907,4 mil toneladas devem ser embarcadas a clientes no exterior, ante 949 mil em 2005 - o que corresponde a uma redução de 4,4%.

"A exportação de farelo e óleo brasileiros torna-se cada vez menos competitiva em relação ao produto da Argentina, o que se deve às diferenças cambiais, tributárias e ao custo menor no país vizinho por conta da escala de produção maior", avalia Sousa. No longo prazo, a Caramuru faz parte do grupo que acredita que o Brasil será um exportador de grãos ainda mais expressivo. Mas as indústrias esmagadoras só se manterão no país, de acordo com seu vice-presidente, se houver expansão na produção interna de carnes e uma demanda firme por biodiesel.

Nesse cenário, a empresa não descarta a possibilidade de construir uma fábrica no exterior nos próximos anos. O país com melhor potencial, segundo Sousa, são os EUA, devido à forte demanda por biocombustíveis em seu mercado.

Ainda no campo dos investimentos, Sousa diz que parte deles será destinada à mudança das embalagens da linha de óleos vegetais. A meta, segundo o vice-presidente da Caramuru, é que 80% do óleo refinado comercializado no país seja envasado em embalagens pet. Há dois anos, eram 40%. A empresa também fará aportes em marketing para divulgar uma linha de bebidas à base de soja lançada em maio. No ramo, a meta é abocanhar 10% do mercado em três anos.

Sobretudo em razão dos resultados de sua aposta nos produtos não-transgênicos, a Caramuru deverá faturar R$ 1,517 bilhão em 2006, ante R$ 1,369 bilhão em 2005. A empresa tem capacidade para esmagar 1,2 milhão de toneladas de soja e 677 mil toneladas de milho e refinar 230 mil toneladas de óleos vegetais por ano. O grupo emprega 2,4 mil pessoas e opera cinco fábricas - Itumbiara e São Simão (GO), Apucarana (PR), Petrolina (PE) e Fortaleza (CE).