Título: Senadores vetam recondução na ANTT
Autor: Ulhôa, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 08/03/2012, Política, p. A5

Com votos da base aliada, o Senado impôs ontem uma importante derrota à presidente Dilma Rousseff, ao rejeitar a recondução de Bernardo Figueiredo ao cargo de diretor-geral da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), por 36 votos contra, 31 a favor e uma abstenção.

A votação foi secreta, mas o resultado foi claro recado de governistas, em especial do PMDB, de insatisfação com o Palácio do Planalto. Só havia 13 senadores da oposição presentes à sessão. O resto dos votos veio da base - não somente do PMDB, que tinha 18.

"Há uma insatisfação que precisa ser entendida", afirmou o líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR). Segundo ele, o descontentamento é "generalizado" e não está restrito ao PMDB. "O governo tem que aprofundar as relações políticas [com senadores] e acabar com a defecção."

No caso específico da ANTT, Jucá avalia que a resistência ao nome de Figueiredo está atrelada à auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU), cujas críticas à agência "deram combustível para a insatisfação". Os detalhes do relatório foram divulgados com exclusividade na terça-feira pelo portal do Valor e na edição impressa de ontem do jornal.

Ao saber do resultado, Figueiredo reagiu com decepção. "A história vai esclarecer, a verdade vai prevalecer", disse Figueiredo ao Valor.

Considerando-se "injustiçado", Figueiredo não chegou a completar a resposta: "Se o TCU acha que eu sou um cara inadequado para conduzir a agência...". Ele disse que, antes da indicação da presidente Dilma Rousseff para um novo mandato, deixou claro o desejo de deixar a ANTT e dedicar-se a outros projetos. Segundo ele, só aceitou a recondução por um compromisso com Dilma, a quem assessorou desde a época em que ela era ministra-chefe da Casa Civil. "Eu agradeço o favor que me fizeram", afirmou Figueiredo.

O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), e os líderes governistas poderiam ter evitado a votação da mensagem, já que, pouco antes, ficou clara a dificuldade de aprovação, quando foi votado o requerimento do senador Roberto Requião (PMDB-PR) pedindo adiamento da decisão sobre a recondução.

Naquela votação, o plenário rejeitou o requerimento, mas 30 senadores votaram a favor, ou seja, pelo sobrestamento da decisão (outros 36 votaram contra o pedido de Requião e houve uma abstenção). Isso refletiu o desconforto com a mensagem.

Assessor da Casa Civil da Presidência da República quando Dilma era a ministra da pasta, Figueiredo foi duramente criticado na tribuna, praticamente sem defesa governista. Requião afirmou que Figueiredo "é um tecnocrata híbrido, defendendo o interesse do setor privado na associação nacional, assinando a concessão e modelando a privatização".

Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) disse que a gestão de Figueiredo não merecia a confiança para ser reconduzido. "Pelo contrário, o senhor Bernardo Figueiredo ficou muito aquém daquilo que se esperava de alguém que dirige uma agência reguladora. O senhor Bernardo Figueiredo, no meu entender, não deu conta do recado."

Segundo Requião, "o interesse que o senhor Bernardo Figueiredo defende não é, decididamente, o interesse público", disse. Ele citou a auditoria do TCU, que apontou a ociosidade nas linhas férreas concedidas para o transporte de cargas, além da não verificação pela ANTT de montantes para execução de projetos pelas concessionárias em recuperação, manutenção, conservação ou reparo de ferrovias, entre outros problemas. Em resposta encaminhada na terça-feira ao Valor, a ANTT informou que vai mudar o "manual de contabilidade" de ferrovias concedidas e que irá apertar a fiscalização.

Numa tímida defesa de Figueiredo, o líder do governo afirmou que o relatório do TCU era preliminar sem decisão contra seu nome. Lindbergh Farias (PT-RJ), relator da indicação, fez a defesa mais enfática e chegou a bater boca com Requião. O petista afirmou que Figueiredo respondeu a todas as perguntas na sabatina da Comissão de Infraestrutura, onde foi aprovado com 16 votos favoráveis e uma abstenção. Ele disse que a representação do Ministério Público que teria originado a auditoria do TCU é de 2007, anterior à gestão de Figueiredo. Requião contestou. Disse que era de 2011 e acusou o petista de "faltar com a verdade".

À frente da ANTT, Figueiredo vinha liderando brigas pesadas em diversas esferas do setor de transportes. No ano passado, depois de uma queda de braços com as concessionárias ferroviárias, a ANTT conseguiu derrubar o monopólio de décadas das concessões e abriu o direito de passagem para novas empresas operarem nas malhas. No setor de rodovias, Figueiredo comandou a realização da segunda etapa de concessões de estradas. No transporte rodoviário, liderou o processo de licitação de todas as linhas de ônibus interestaduais do país.

Com a saída de Bernardo, o Palácio terá agora que indicar um novo nome para assumir a agência vinculada ao Ministério dos Transportes.