Título: Investidores da Vale fazem pressão por direito a voto
Autor: Durão, Vera Saavedra
Fonte: Valor Econômico, 12/07/2006, Empresas, p. B3

Investidores e analistas da Companhia Vale do Rio Doce vêm se movimentando para convencer a empresa a adotar uma estrutura societária unificada, seguindo modelo mundial das grandes grupos internacionais, convertendo suas ações preferenciais em ordinárias e passando, assim, a ter uma única classe de ações.

Essa nova estrutura, argumentam, colocaria a mineradora em pé de igualdade com suas principais competidoras, a Rio Tinto e a BHP Billiton, que só possuem ações votantes. Assim, mineradora brasileira passaria a ser avaliada de forma equânime com suas concorrentes.

Hoje, a ordinária da Vale negocia a 80% do "valor justo" (algo em torno de US$ 30 por ADR), enquanto a BHP e a Rio Tinto negociam com cerca de 20% de prêmio em relação ao seu valor econômico.

No Brasil, atualmente há uma tendência cada vez mais forte de grandes empresas - como Embraer e Perdigão - optarem pela unificação (e posterior pulverização de seu capital) como forma de caminhar para uma ação só, pondo fim aos privilégios de uma estrutura de preferenciais e ordinárias que traria mais vantagens ao controlador e prejudicaria a empresa.

O que causa estranheza aos investidores da Vale é que a Previ, maior fundo de pensão do Brasil e maior acionista da Vale, líder desse processo, não adote a mesma estratégia para a Vale. O presidente da Previ, Sérgio Rosa, foi procurado pelo Valor, mas não retornou a ligação.

Um dos argumentos mais fortes usados por analistas na defesa da unificação é que a Vale passaria a ter uma moeda forte (uma única ação) para ter mais criatividade no campo das aquisições de ativos. Atualmente, os movimentos de consolidação globais, com destaque para os setores de mineração e siderurgia, passam por dezenas de bilhões de dólares, exigindo que as ações das empresas compradoras tenham valor e entrem como moeda de pagamento na negociação.

Como exemplos recentes, a mineradora canadense Falconbridge, avaliada em US$ 20 bilhões, vem sendo disputada pela mineradora suiça Extracta e pela canadense Inco. Por sua vez, a americana Phelps Dodge propôs a compra de Inco e da Falconbridge. A oferta é avaliada em US$ 40 bilhões. Na siderurgia, a Mittal Steel vai pagar 26,9 bilhões de euros para se fundir com a européia Arcelor, sendo que desse total, 69% são ações e 31%, dinheiro vivo.

Para um analista que acompanha a Vale há vários anos, mas prefere não ser identificado, a empresa acaba sendo prejudicada por não atuar em pé de igualdade com suas concorrentes por conta dessa desvantagem. Para esse especialista, seria interessante a empresa ter uma estrutura de capital que lhe permitisse fazer esses megamovimentos. A ação preferencial é um capital muito barato. O que tem que ser debatido, na opinião desse analista, é qual o benefício que a Vale tem com esta estrutura atual de capital?

A empresa prefere não se pronunciar sobre o assunto. O presidente-executivo, Roger Agnelli, negou, por meio de sua assessoria, que existam na Vale estudos sobre a unificação de ações. E completa: "Provavelmente, a Vale vai fazer este tipo de operação ainda neste século". Seu diretor financeiro, Fábio Barbosa, indagado sobre a unificação de ações foi lacônico: "Isso é com os acionistas".

Um acionista procurado pelo Valor, que não quis ser identificado, adiantou que o tema ainda não foi colocado na mesa da empresa para discussão e que sequer existem estudos sobre esse tipo de operação. A fonte reconhece que os investidores até gostariam disso, mas não crê que haja descontentamento entre eles, pois a ação da Vale estaria bem avaliada.

Para os investidores e analistas, a Vale não avança nessa questão porque o maior temor dos seus acionistas é perder o prêmio de controle pelo qual pagaram quando a empresa foi privatizada. Hoje, esses acionistas - Previ, Bradespar, Mitsui, BNDES e Opportunity - reunidos na Valepar detêm 53% das ordinárias (de um total de 65,25% de capital votante ) e 32% do capital total da empresa.

Um relatório do banco americano Merrill Lynch sobre a Bradespar, uma das controladoras da Vale, da analista Andrea Weinberg, enumera vários vantagens para a Vale com a unificação. O trabalho mostra que a Valepar não perderia o controle da Vale, podendo até aumentar sua participação no capital total dos atuais 32% para aproximadamente 37% ou até 39%, dependendo do prêmio de controle a ser atribuído às suas ações nessa operação. Com isso, poderia qualificar-se como acionista controladora da companhia, de acordo com as leis brasileiras. Além disso, seu movimento diário de ações, hoje em US$ 369 milhões, poderia ser muito maior.

O primeiro passo para a unificação, segundo a tese de Andrea, em relatório sobre a Vale, seria dar tratamento igual para preferenciais e ordinárias por terem as PNs direito de voto em assembléia, conforme estatuto. Para a analista, se as preferenciais ganhassem esse reconhecimento e o direito a tag-along estaria aberto o caminho para a Vale ter uma ação única.

Fábio Barbosa adiantou que não está prevista nenhuma mudança no estatuto da Vale. Para ele, a empresa tem duas classes de ações absolutamente distintas (a ON tem direito a voto no conselho e a PN a pagamento de dividendos). "O estatuto só dá direito a tag-along para as ordinárias", disparou.

Para um especialista de banco, que não quis ser identificado, a Vale demonstra uma posição societária conservadora. Essa mentalidade de controle no mundo globalizado engessa as perspectivas de crescimento de qualquer empresa, que acaba perdendo terreno em âmbito global por estar fragilizada por uma estrutura de capital antiga, o que pode impedi-la de fazer um movimento maior no mercado internacional, apesar de estar bem focada no crescimento orgânico. No cenário do interlocutor, quem não se posicionar fortemente nesse processo de consolidação pode virar alvo fácil de assédio.