Título: Inquietação da base vai aumentar, diz líder do governo na Câmara
Autor: Costa,Raymundo
Fonte: Valor Econômico, 12/03/2012, Política, p. A7

Numa semana em que a presidente Dilma Rousseff foi derrotada no Senado e o PMDB acusou literalmente o governo de privilegiar o PT com vistas às próximas eleições, o líder Cândido Vaccarezza (PT-SP) diz que não há risco de desestabilização da base aliada no Congresso, mas que a inquietação na coalizão de 14 partidos sem dúvida vai aumentar. Motivo? As eleições municipais de outubro.

No início do governo Dilma, Vaccarezza era favorito para presidir a Câmara. Perdeu a disputa no PT para um deputado desconhecido, Marco Maia (RS). Hoje ele reconhece que foi muito autossuficiente e falhou ao não tentar agregar companheiros de outras tendências. Sem a presidência da Câmara, virou candidato do campo majoritário petista ao cargo de coordenador político do governo, ministério (Relações Institucionais) que Dilma preferiu entregar ao deputado Luis Sérgio (RJ).

Como prêmio de consolação, restou a Vaccarezza a liderança do governo (Luis Sérgio durou pouco na coordenação e foi substituído pela ex-senadora Ideli Salvatti). Até agora, Vaccarezza teve sucesso nas votações de interesse do governo na Câmara, com a exceção da emenda do Código Florestal que anistia desmatamentos, derrota que não pode ser propriamente atribuída à Dilma, como foi o caso da recusa do nome de Bernardo Figueiredo para presidir a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), uma indicação pessoal da presidente.

Ocorridos no início do governos, os episódios envolvendo Vaccarezza são um bom exemplo dos problemas de divisão numa base aliada extensa. Além do tamanho e dos interesses divergentes, o líder do governo na Câmara registra um outro fato para explicar a luta interna: a fragilidade da oposição, que não dispõe de um candidato definido com o qual os governistas possam terçar as armas. Situação que ficou pior com a entrada do tucano José Serra na corrida sucessória de São Paulo, o que divide também os oposicionistas.

"Tem uma situação política de uma força imensa do governo e uma oposição sem rumo e perspectivas clara do que vai fazer", afirma o líder de Dilma.

Vaccarezza evita comentar a derrota de Dilma na no Senado, Casa de origem da ministra Ideli Salvatti. Mas adverte que a decisão dos senadores surpreendeu a todos, inclusive a oposição.

O líder do governo começa a semana tentando amarrar o acordo para a votação do Código Florestal. Acha que é possível isolar os mais radicais. Ele não está preocupado com o manifesto do PMDB da semana passada. Acha que se trata mais de um assunto interno dos pemedebista do que uma rebelião contra o governo. "A aliança com PMDB é de sucesso, é um partido leal, reconheço. O PMDB tem a segunda maior bancada um papel determinante".

"Temos 14 partidos na base. Todos cumprem sua função. Até agora nenhum partido desestabilizou essa maioria governista. Aprovamos praticamente tudo.

Salário mínimo, Desvinculação das Receitas da União, Funpresp (mudança no regime de aposentadoria dos servidores", contabiliza. Mas o próprio Vaccarezza reconhece: "Houve quem votasse contra".

A partir desta semana é que o líder poderá avaliar com precisão se a promessa de melhorar a relação com a base ou a nomeação do senador Marcelo Crivella (PRB) para o Ministério da Pesca, entre outras coisas, mudaram o humor dos deputados. Há vários princípios de incêndio na coalizão, como a votação do PDT contra o novo regime de aposentadoria dos servidores.

A seguir, os principais trechos da entrevista de Vaccarezza ao Valor:

Valor: Por que a base aliada está desestabilizada?

Cândido Vaccarezza Não há essa desestabilização. O governo foi vitorioso em quase todas as votações. O que há é uma situação política de uma força imensa do governo e de uma maioria bastante expressiva. Junto disso, há uma oposição ainda sem rumo e sem perspectiva clara do que vai fazer, o que traz tensão para a base. Muito disso vem de debates internos da base do governo que temos que considerar como salutar, porque o governo é muito amplo.

Valor: Na sua visão então a fragilidade da oposição colabora com a tensão interna da base?

Vaccarezza: A oposição teve uma derrota política muito grande, maior do que a derrota eleitoral. Ficou sem uma liderança, sem um centro político que a atraísse. Isso provocou um racha e fez com que a base aliada, que já era grande, fosse ampliada. Consequentemente, começou a haver polarizações nessa base. As ameaças de derrota saem sempre de dentro dela. A crise não é um problema de emenda, é muito mais profundo.

Valor: Mas agora com a candidatura de José Serra em São Paulo a oposição não tem um novo alento?

Vaccarezza: Não, é o contrário. Quando a oposição começa a tentar encontrar a sua força no Aécio, também se vê novamente prejudicada porque o Serra declara que entrará na disputa na Prefeitura de São Paulo. Isso acaba com a hipótese de unificar a oposição e os conflitos continuam sendo na base.

Valor: Há solução para essa tensão na base aliada?

Vaccarezza: A inquietação da base vai aumentar.

Valor: Por que?

Vaccarezza Porque vamos entrar na conjuntura eleitoral. Isso aumenta a disputa na base. Certamente vai ter prefeitura com dois ou três blocos governistas brigando. Isso é um fator. Outro é que a aproximação da eleição traz a população para discutir temas políticos. Ao fazer isso, os deputados e senadores, para dialogar melhor com suas bases, vão aumentar as reivindicações, trabalhar para conquistá-las e trazer resultados para os segmentos que representam. Tudo isso reflete no debate no Congresso. Tudo é potencializado.

Valor: No PT também?

Vaccarezza: O PT sempre está insatisfeito, mas não vai acontecer nada. É o partido da presidente, a espinha dorsal do governo. E é um partido muito forte. Tem a figura do Lula e tem história. Mas o PT não está no governo para criar caso. Está para liderar a estabilidade da base.

Valor: Mas os outros partidos reclamam justamente dessa liderança, da hegemonia petista na base. O que fazer?

Vaccarezza: Eu, como líder do governo, vou ter mais paciência, ouvir mais a base e todos os deputados, aumentar meu dialogo com a oposição e tentar ganhar as votações pelo convencimento. Não posso partir do princípio de que o governo tem a maioria e que passa o trator em quem está na frente. O fato de ter uma grande maioria não deve nos levar à certeza de que qualquer votação está ganha. Ao contrário, as votações serão mais demoradas e complexas com a proximidade das eleições.

Valor: Tem que liberar mais emenda?

Vaccarezza: Votamos tudo na Câmara sem emenda. Quando foi votada a DRU, não tinha nada de liberação de emenda. Salário mínimo também foi zero. Essa base tem um projeto político. Não é conquistada à base de emenda. Isso de um lado é bom, mas por outro é ruim porque quando se compromete com o governo discute mais e quer interferir. Então discute-se mais a composição do ministério e, se não gosta, se tem partido que se acha preterido em relação a um cargo ou a um ministério, há reação. Esse grande bloco é de governo e quer participar dele.

Valor: Então o há risco de novas derrotas, como a do Senado semana passada?

Vaccarezza: Não tenho informação de como foi a discussão do Senado. Na minha contabilidade, era votação líquida e certa. É uma derrota que não tem explicação. Ninguém esperava, nem a oposição.

Valor: Isso não pode influenciar na votação, por exemplo, do Código Florestal?

Vaccarezza: A base da Câmara mostra grau de fidelidade maior. Não tem nenhum projeto complicado que tenha começado na Câmara. Nos temos inclusive consertado muitas coisas do que chega do Senado. Não é adequado imprimir uma derrota ao governo.

Valor: Não há uma derrota iminente na votação do Código? Na emenda 164 (regularização de desmatamento ilegal)?

Vaccarezza: Não acredito que passe a 164. Tem movimento, mas ela não voltará.

Valor: O acordo PT e PMDB para a eleição da Câmara é institucional, entre os dois partidos, ou entre os líderes da época?

Vaccarezza: Não é acordo de governo. É entre PT e PMDB.

Valor: Inclui os outros partidos?

Vaccarezza: Não incluiu outros partidos.

Valor: O PT vai cumprir?

Vaccarezza: O PT tem tradição de cumprir seus acordos. Mas temos 86 deputados. Alguém pode de repente querer se candidatar por fora. Mas acho difícil sair candidatura de dentro do PT. Nossa posição é apoiar o PMDB.