Título: Marina na contramão do PV
Autor: Sassine, Vinicius; Rizzo, Alana
Fonte: Correio Braziliense, 06/10/2010, Política, p. 3

Senadora tem apoio de 10 dos 58 integrantes da executiva nacional. A legenda prefere o tucanato, mas há outras vozes em jogo na decisão

Enviada especial

Brasília e São Paulo O grupo da senadora Marina Silva é minoria dentro do Partido Verde (PV) corresponde a menos de 20% dos integrantes da executiva nacional e vem encontrando dificuldades para fazer prevalecer a decisão política mais desejada por Marina e seus aliados: a neutralidade no segundo turno da eleição presidencial, sem declaração de apoio a José Serra (PSDB) ou a Dilma Rousseff (PT). Depois de enfrentar petistas e tucanos e sair das urnas com 19,6 milhões de votos, o que despertou uma corrida pelo apoio da candidata verde, Marina trava agora uma disputa com os dirigentes que dominam o PV.

Dos 58 membros da executiva nacional, 10 são do grupo da senadora. Eles se filiaram ao PV com Marina, em agosto de 2009, e não têm poder suficiente para barrar o apoio do partido a José Serra, como desejam as antigas lideranças verdes de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. A votação expressiva obtida por Marina e o ganho de capital político o apoio da senadora passou a ser considerado decisivo para a eleição do novo presidente da República evidenciaram o racha existente no PV desde a chegada dos ex-petistas. Indicados para cargos na executiva, na secretaria e na coordenação nacional, Marina e aliados chegaram à legenda sob a promessa de mudanças no estatuto e nos programas do partido, o que não ocorreu.

A ala da senadora discorda e critica, por exemplo, as chamadas comissões provisórias, em que o presidente da sigla nomeia dirigentes nos estados e nos municípios. Em troca, esses dirigentes regionais validam as escolhas da executiva nacional, como o Correio constatou em entrevista com as lideranças. Questionadas sobre qual deve ser a posição de Marina no segundo turno, a resposta é quase unânime: vão seguir a decisão da executiva nacional.

O PV é um partido sem unidade regional. Em decisões nacionais, segue a cartilha ditada pelas lideranças de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Partiram de líderes do Rio, 40 dias antes da eleição, as primeiras iniciativas de apoio do partido a José Serra no segundo turno. A dois dias da votação, foi a vez de o presidente nacional do PV, José Luiz Penna, manifestar a intenção de apoio a Serra. Nas duas ocasiões, a coordenação da campanha de Marina à Presidência negou qualquer aproximação nesse sentido. Os coordenadores da candidatura pertencem ao grupo recém-filiado ao PV.

Representação Com exceção do desempenho de Marina na disputa presidencial, o partido não obteve êxito nestas eleições. Nenhum dos 11 candidatos próprios aos governos estaduais foi eleito. Juntos, obtiveram menos de 3,5 milhões de votos. O PV elegeu 15 deputados federais, mesma quantidade de parlamentares da atual legislatura. A partir de fevereiro de 2011, quando Marina encerrar o mandato, a legenda não terá senador.

Em outros 14 estados onde a sigla fez parte de coligações para as disputas pelos governos, as composições foram as mais diversas. Seis alianças eram encabeçadas pelo PT ou por partidos da base governista. Outras quatro eram capitaneadas pelo PSDB e, em quatro estados, o PV integrou composições que duelaram com petistas e tucanos. Para driblar essa configuração dentro do PV, Marina e aliados se agarraram a uma resolução interna que determina a realização de convenção em caso de segundo turno na disputa presidencial. Entre a convocação dos filiados com direito a voto e a convenção, são necessários dez dias. Por isso Marina convocou a imprensa para dizer que uma decisão só será anunciada em 15 dias.

A data da convenção será definida nesta semana, afirma João Paulo Capobianco, que coordenou a campanha de Marina. Cerca de 200 filiados teriam direito a voto. Eles escolheriam entre o apoio a Serra, a Dilma ou a neutralidade. Mesmo correndo o risco de perder o capital político conquistado, adiar a decisão e envolver os núcleos vivos da sociedade foram as armas de Marina para barrar uma decisão apressada do PV. Ela vai ouvir a sociedade, os movimentos sociais e o partido, diz o ex-deputado federal Luciano Zica, que ingressou no PV com Marina, saídos do PT.

"Ela vai ouvir a sociedade, os movimentos sociais e o partido

Luciano Zica, ex-deputado federal

O número 11 Quantidade de candidatos a governos estaduais do PV. Nenhum ganhou.

Ex-petista no time de Serra

O grupo no PV que quer apoiar o candidato José Serra ganhou reforço ontem. O deputado federal Luiz Bassuma, que disputou o governo da Bahia, declarou voto ao tucano. Segundo ele, a decisão é pessoal. O PT fechou a questão da legalização do aborto e Dilma Rousseff tem posições favoráveis a isso. Como essa é uma questão importante, decidi me posicionar logo, afirma o deputado, que vai ajudar o tucano na Bahia. Bassuma deixou o PT no ano passado, depois de ter sido suspenso por se posicionar contra uma resolução aprovada no 3º Congresso do partido, que defende a descriminalização do aborto.

Depois do pronunciamento na Câmara ontem, alguns petistas subiram na tribuna para dizer que tinham apoiado Bassuma na polêmica. Ele negou. O parlamentar criticou ainda a demora do PV em tomar decisão. Quanto mais cedo, melhor. Para ele, Marina e o partido podem tomar rumos diferentes. Marina é além do PV. A proposta dela reúne movimentos sociais, ambientalistas, a juventude. É complexo.

Jamais Marina passou o dia na capital paulista discutindo com aliados e interlocutores a melhor forma de driblar a pressão do PT, do PSDB e do próprio PV. O presidente do PV, José Luiz Penna, nega que o partido e Marina tenham posições diferentes. Jamais. Para mim é a última das últimas hipóteses, disse.

Nos chamados núcleos vivos, que envolvem pastores de igrejas evangélicas, movimentos em defesa do meio ambiente e antigos companheiros de militância, Marina encontra divisão de opiniões. Há defesas pelo apoio a Serra, pela composição com Dilma ou pela neutralidade.

Para o diretor da organização não governamental SOS Mata Atlântica, Mário Mantovani, a senadora não deve declarar apoio. Ela precisa tocar para frente esse movimento criado. Convocado para fazer a interlocução entre o PT e Marina, o senador eleito Jorge Viana (PT-AC) afirma que ainda não tem posição sobre a aproximação. Estou preocupado em fazer a campanha de Dilma no Acre. O governador do Acre, o petista Binho Marques, já ligou para a senadora em busca de apoio ao PT. Lideranças locais do PV vão a São Paulo nesta semana.