Título: Crescimento e redução da pobreza
Autor: Arbache ,Jorge
Fonte: Valor Econômico, 23/03/2012, Opinião, p. A15

No seu discurso de posse, a presidente Dilma deixou claro que o combate à pobreza é a principal meta do seu governo. As armas para a guerra foram definidas: crescimento econômico e políticas sociais, tais como o Programa Brasil Sem Miséria. Essas políticas são indispensáveis, mas, para que os indicadores sociais avancem de forma permanente e consistente, será preciso, primordialmente, crescimento sustentado.

Um exame dos dados dos últimos 50 anos mostra o porquê. O crescimento econômico brasileiro é caracterizado por ser altamente volátil e acompanhado por períodos de aceleração e desaceleração. O problema é que a pobreza e outros indicadores sociais são bastante sensíveis a essa volatilidade.

Os indicadores sociais melhoram durante os períodos de aceleração e pioram durante os períodos de desaceleração do crescimento. Ou seja, eles são pró-cíclicos. Mas, muito mais relevante do que a sensibilidade à volatilidade é a reação assimétrica dos indicadores sociais ao ciclo econômico. Isto ocorre porque os indicadores sociais são mais sensíveis aos períodos de desaceleração do que aos de aceleração. A taxa de crescimento do índice de Gini, por exemplo, que mede a concentração da renda, tende a piorar bastante mais durante os períodos de desaceleração do que melhorar durante os períodos de aceleração do crescimento. Como consequência, a concentração da renda deteriora rapidamente durante períodos de estagnação, mas recupera-se lentamente durante os períodos de crescimento.

Indicadores sociais são mais sensíveis aos períodos de desaceleração do que aos de aceleração

Situação qualitativamente semelhante ocorre com a participação do jovem no mercado de trabalho, crescimento da taxa de desemprego, entre outros indicadores sociais relevantes. Essa relação assimétrica ajuda a explicar porque vários indicadores sociais avançaram vagarosamente nas últimas décadas, em especial nas décadas de 1980 e 1990, e está por detrás da persistência da ainda bastante desigual distribuição da renda no Brasil. Sugere, também, que, da perspectiva do pobre, tão ou mais importante que crescimento elevado é crescimento sustentado.

Simulações mostram que, tivera o Brasil evitado os mais severos anos de colapso do crescimento das últimas décadas, crescendo apenas 0% (zero) nesses anos ao invés dos valores efetivamente observados, em 2010 o PIB per capita teria sido 31,8% maior do que o registrado. Outra simulação mostra que, tivera o Brasil evitado o mais longo ciclo de desaceleração do crescimento do produto das últimas décadas, observado entre 1988-1993, em 2010 o PIB per capita seria 24,2% maior do que o registrado.

São muitos os fatores por detrás da reação assimétrica dos indicadores sociais à volatilidade do crescimento econômico. Um deles é a inflação. A inflação tende a ser mais elevada durante os períodos de desaceleração do que durante os períodos de aceleração e corrói especialmente as rendas dos grupos mais vulneráveis.

Outros fatores são a tendência de deterioração dos serviços públicos, como educação e saúde, e a piora das condições do mercado de trabalho durante os períodos de desaceleração. Como os grupos mais vulneráveis são mais dependentes desses serviços e da renda do trabalho, eles tendem a ser especialmente prejudicados. A concentração dos ativos (terra, imóveis e ativos financeiros) e o limitado acesso dos mais pobres ao crédito, seguros e outros instrumentos financeiros também colaboram para explicar a assimetria.

Muito se avançou na área social nos últimos anos no Brasil, mas ainda é cedo para se baixar a guarda, especialmente quando se levam em conta os novos desafios, riscos e incertezas, internas e externas, que nos rodeiam e que podem ter substanciais impactos na taxa média e na volatilidade do crescimento.

Jorge Arbache é assessor da Presidência do BNDES e professor da UnB.