Título: A diversidade chega ao trabalho
Autor: Boarini, Margareth
Fonte: Valor Econômico, 25/07/2006, Suplementos, p. F3

O Brasil é um país que exibe imensa diversidade cultural, étnica e racial. Mas apenas de uns anos para cá é que o ambiente corporativo começou a sinalizar de maneira gradual a incorporação e assimilação da cultura da diversidade, estimulado principalmente por empresas multinacionais que, muitas vezes, importam de suas matrizes programas bem-sucedidos e os adaptam à nossa realidade. São poucos ainda os casos de companhias que criaram áreas específicas, mas as ações ganharam um caráter contínuo tão forte que impulsionaram o surgimento de empresas prestadoras de serviço importantes para o desenvolvimento desse setor.

A DuPont Brasil é uma das empresas com um programa de diversidade com ações mais abrangentes do país. Ele existe desde 2002 e teve como ponto de partida a implantação do Programa Aprendiz. A partir daí, o guarda-chuva foi crescendo para abrigar ações desenvolvidas especialmente para a inclusão de deficientes, mulheres e negros. "A intenção da empresa sempre foi a de criar ações que fossem ao encontro de um dos principais valores da companhia, o de respeito e trato justo às pessoas, e, para nós, teriam que estar relacionadas entre si para gerar valor e favorecer interação com esse público", afirma Flávia Zuanazzi, coordenadora de diversidade e ambiente de trabalho.

Os resultados colhidos desde então têm sido surpreendentes. A relação da empresa com seus stakeholders tornou-se muito melhor. Do amplo guarda-chuva implantado pela DuPont, fazem parte ações que propiciam maior contratação de negros e mulheres e programa com foco no respeito à sexualidade do funcionário. Internamente, a difusão do tema diversidade é também presente. Um treinamento batizado de Expect Respect discute entre funcionários o cotidiano de pessoas com deficiência, como representantes de diferentes etnias sofrem preconceitos e como é a relação de jovens excluídos do mercado de trabalho com a sociedade, por exemplo.

Em favor da diversidade, a empresa impôs-se a meta de dobrar o número de colaboradores afrodescendentes no período de 2000 a 2007 e implementou uma série de medidas para levar a cabo essa meta. Firmou parceria com a consultoria Qualiafro, especializada na área de recrutamento e seleção de afrodescendentes, tornou flexíveis pré-requisitos de preenchimento de vagas, criou processo seletivo de estagiários e monitoramento de resultados e desempenho desses profissionais, entre outros. "É importante ter ações afirmativas para que essa população resgate o atraso causado por prejuízos históricos", sentencia a coordenadora.

"Não sou diferente porque sou negra ou porque comecei como estagiária. O racismo existe na sociedade, mas nunca senti qualquer ponta de racismo aqui na empresa. Sempre fui reconhecida pelo meu trabalho e acho isso muito importante", afirma Claudia Carneiro, que deve ser promovida de customer service representative para analista de importação na DuPont.

A executiva ingressou na empresa através de um programa de estágio, aos 16 anos. Hoje, aos 24 e formada em administração com apoio da companhia, lembra com carinho do suporte que recebeu para obter bons resultados. "A cultura aqui é a do suporte."

Outra companhia com trabalho bem estruturado na área da diversidade é a Microsoft. A discussão sobre esse tema deu os primeiros passos na matriz, nos EUA, cerca de seis anos atrás, e desembarcou no Brasil em 2004, lembra Claudio Neszlinger, diretor de recursos humanos. A conscientização e sensibilização à área foram imediatas. "Lançamos o programa internamente e logo tivemos mais voluntários que vagas para participar do grupo de discussão para gerar ações", afirma o executivo.

O grupo já conta com 16 funcionários e segue um trabalho alinhado com o da América Latina.

Ao longo deste ano, a Microsoft Brasil decidiu manter o objetivo do ano passado: a maior inclusão da mulher tanto no quadro de colaboradores da companhia como em cargos de liderança. Embora apresente os melhores índices com relação ao emprego da mulher no quadro da Microsoft latino-americana, a intenção do grupo de diversidade daqui é ampliar a participação feminina, que hoje representa 28% do quadro geral e 25% do quadro de lideranças.

"Cada área terá que definir um escopo de trabalho para melhorar essa proporção. Sempre que houver dois candidatos para uma mesma vaga, absolutamente empatados em qualidade, a prioridade será da mulher. Também tentaremos buscar mais mulheres entre estudantes de formação técnica", explica Neszlinger.

Na Wal-Mart, a gerência de diversidade foi implantada há dois anos dentro da área de recursos humanos e instituiu cinco frentes de atuação: para deficientes, menor aprendiz (o foco mais forte), valorização da mulher, etnias e primeiro emprego. Segundo Marcelo Vienna, vice-presidente de RH, o primeiro ponto a ser trabalhado fortemente foi a sensibilização ao tema junto ao quadro de colaboradores. "Aceitar as diferenças e trabalhar culturalmente isso sempre fez parte dos valores da companhia, mas reforçamos esse ponto para tornar as ações mais eficazes", explica o executivo.

O bom resultado do trabalho não demorou a se refletir na pesquisa de clima organizacional. "As pessoas sentem-se mais orgulhosas de trabalhar aqui e de repartirem seu convívio, de acordo com relatos de nossos profissionais", diz Vienna. O programa para deficientes da Wal-Mart brasileira serviu de benchmarking para a operação mexicana da rede e recentemente foi apresentado como case na feira do setor supermercadista.

No Grupo Pão de Açúcar, o tema diversidade não exigiu a criação de departamento, mas nem por isso deixou de tomar vida através de uma postura da companhia. Marília Gonçalves de Oliveira Parada, diretora de planejamento e desenvolvimento de RH, conta que a disseminação interna da prática da diversidade começou a tomar força em 1997, com a contratação de idosos, que somam hoje 1250 pessoas acima de 50 anos trabalhando nas lojas do grupo. Outro perfil contemplado é o de jovens egressos da Febem que estagiam nas lojas com possibilidade de contratação. Essa ação, batizada "Gente de Futuro", é fruto de uma parceria entre o Pão de Açúcar, a Febem e a ONG Jeame.

A HP é outro exemplo de que não é preciso constituir uma área específica para diversidade para estimular sua prática. Jair Pianucci, diretor de RH, conta que mulheres e inclusão de deficientes norteiam as ações. A empresa, que tem 22% de mulheres em seu quadro gerencial, quer expandir esse percentual para no mínimo 26%. "Embora o prazo para esse crescimento não tenha sido estabelecido, a HP está firme nesse propósito", afirma o diretor. A inclusão de deficientes na HP obedece ao preenchimento de cotas por exigência legal, mas encontra respaldo do executivo.

O Grupo Itaú, além de um trabalho com deficientes, tem ações voltadas para funcionários negros. O Programa de Diversidade Corporativa é formado por um comitê de funcionários que se reúne a cada dois meses para discutir e gerar ações. Valéria Veiga Riccomini, superintendente de atração e integração das pessoas, conta que esse programa inclui trabalhos voltados para a inclusão de deficientes, negros, jovens carentes e que é questão de tempo o início de discussões referentes a idosos e sexualidade.