Título: EUA temem ações contra seus subsídios na OMC
Autor: Landim, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 25/07/2006, Brasil, p. A4

O governo dos Estados Unidos teme que o colapso da Rodada Doha estimule outros países a adotar táticas mais agressivas contra seus subsídios agrícolas, movendo ações que levem a Organização Mundial do Comércio (OMC) a analisar a legalidade dos benefícios e acabem forçando os americanos a retirá-los sem ganhar nada em troca.

"Isso parece inevitável", afirmou ontem o secretário de Agricultura dos Estados Unidos, Mike Johanns, em teleconferência com jornalistas baseados na capital americana. "Mas não estaremos sozinhos", ele acrescentou, referindo-se ao risco de que ações semelhantes sejam propostas contra a União Européia.

Os Estados Unidos sempre viram a Rodada Doha como uma alavanca para reformar seus subsídios agrícolas. Com as novas regras que seriam estabelecidas na OMC, eles planejavam redesenhar os vários programas que beneficiam os agricultores americanos, para manter o conforto no campo e tornar os subsídios imunes a contestações.

Com a suspensão das negociações e a possibilidade de que não sejam retomadas tão cedo, os EUA se tornam mais vulneráveis a ações como a movida pelo Brasil contra os subsídios dos produtores de algodão. A OMC deu razão ao Brasil e há um ano mandou o governo americano retirar os subsídios. Alguns foram extintos e outros continuam em uso porque o Congresso hesita em acabar com eles.

Na teleconferência, Johanns reconheceu que os subsídios pagos aos produtores de arroz poderão ser o próximo alvo de uma ação na OMC. Dois terços dos subsídios que o governo americano distribuiu no campo nos últimos cinco anos apoiaram quatro mercadorias: milho, trigo, arroz e algodão.

Os Estados Unidos atribuíram o fracasso das negociações à falta de disposição de outros países para abrir seus mercados. Para os EUA, a eliminação de tarifas e outras barreiras enfrentadas por empresas americanas na Europa e em países como o Brasil e a Índia seria uma compensação para os novos limites que um acordo imporia aos subsídios agrícolas.

"Não podemos ficar negociando com nós mesmos", disse a representante comercial dos EUA, Susan Schwab. "São necessárias duas pessoas para dançar um tango e 149 para a Rodada Doha avançar", acrescentou, referindo-se ao número de países que integram a OMC. Ela apontou a União Européia e a Índia como os "mais relutantes" em fazer concessões.

Johanns citou dois exemplos para demonstrar como as propostas de abertura de novos mercados postas na mesa de negociações são tímidas. Segundo ele, a oferta da União Européia permitiria um acréscimo de apenas 160 mil toneladas anuais na quantidade de carne que o bloco importa atualmente, o equivalente a um aumento de 2%.

Quanto aos países em desenvolvimento, Johanns disse que a proposta defendida pelo grupo do qual participam Brasil, China e Índia na prática manteria protegidos contra a competição estrangeiras mais de 95% dos produtos agrícolas desses países. "É uma proposta desoladora para nós", disse ele.

A proposta defendida pelos Estados Unidos provocaria cortes em vários programas que beneficiam os agricultores americanos, mas permitiria que o governo continuasse gastando mais de US$ 20 bilhões por ano com esses subsídios, que distorcem o comércio ao reduzir os preços artificialmente.

O colapso da Rodada Doha provocou frustração e alívio no Congresso americano, onde representantes dos interesses dos agricultores têm muita influência. "Sempre disse que era melhor não fazer acordo nenhum do que fazer um acordo ruim", afirmou o senador Chuck Grassley num comunicado. "Estou contente porque nossos negociadores ficaram firmes. Eles entendem que ambição de menos não atende nossos interesses."