Título: O Estado e as despesas com o funcionalismo
Autor:
Fonte: Correio Braziliense, 06/10/2010, Opinião, p. 16

Não derivam apenas de desperdícios na utilização de recursos, em parte devido ao paralelismo de órgãos com idênticas funções e de projetos malconduzidos, os gastos perdulários da administração pública. Contribuem com maior intensidade para a anomalia as rubricas orçamentárias para cobertura das despesas com o funcionalismo. Não há aparato seguro para identificar quais as necessidades do Estado quanto ao contingente de pessoal que deve servi-lo. Simples indicações do gestor de que é insuficiente o quadro disponível é bastante para ensejar nomeações.

Ocupa-se, agora, o Congresso de deliberar sobre projetos de lei há tempos em debate para colocar em nível racional o custeio da burocracia. O mais polêmico ou, dir-se-ia melhor, o mais exposto a reações enérgicas da classe é o que prevê a demissão de servidor admitido por concurso público. A insuficiência de desempenho, sustenta a proposta, é causa legítima para o ato extremo da dispensa.

Segue-se na ordem de inconformidade das representações classistas a iniciativa de alterar a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101/2000). O objeto da mudança é colocar ordem no desembolso do Estado com recursos humanos, mediante revisão salarial pelo índice de inflação do ano anterior e mais 2,5%. Também causa repulsa aos assalariados governamentais o Projeto de Lei nº 1.992/2007, que põe fim à aposentadoria integral e cria a Previdência Complementar.

O conjunto das medidas desponta como imperativo institucional. Não há mais paciência da sociedade com o descontrole dos gastos correntes da administração. Mas não apenas em relação ao excesso de quadros chamados a movimentar a engrenagem estatal. Cabe também fazê-lo no tocante aos saques no Tesouro para financiar inovações dispensáveis umas, inúteis outras. No lado oposto, está a população privada de políticas eficazes de saúde pública e de educação de qualidade.

A possibilidade de demissão para servidores concursados não constitui novidade nenhuma. Portanto é irrelevante o clamor em condená-la. O artigo 41 da Constituição, § 1º, III, estabelece que o servidor público estável perderá o cargo mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei complementar. O que falta para tornar efetiva a punição é a regulamentação do dispositivo a cargo do Congresso.

É obrigação do Legislativo não cuidar apenas de limitações aos dispêndios públicos com a folha de pagamento. Cumpre-lhe criar os meios para o treinamento constante dos servidores, promover o acesso horizontal dos mais capazes, modernizar e melhorar a organização do sistema remuneratório e proporcionar-lhes ambiente digno de trabalho. A falta de avanços do gênero fomentará a impressão de que os projetos abrigam apenas a ideia de cortar direitos da classe.