Título: Pacote cambial ajuda na queda dos spreads
Autor: Lucchesi, Cristiane Perini
Fonte: Valor Econômico, 28/07/2006, Finanças, p. C1

O pacote cambial do governo vai ajudar empresas exportadoras a obterem crédito externo mais barato em operações estruturadas. Como 30% das receitas com exportação agora podem ficar fora do país para pagamento de importações ou outras dívidas, será possível criar operações estruturadas de financiamento à importação ou para capital de giro sem o chamado "risco de conversibilidade ou de transferência de recursos", um dos importantes componentes do "risco político" de um país. É o risco de, em uma moratória ou centralização cambial, o governo impedir que suas empresas façam operações de câmbio ou de transferência de recursos para fora do país.

Até hoje, só as operações de financiamento à exportação, os chamados pré-pagamentos à exportação, possuíam esse tipo de característica e, por isso, tornavam-se mais baratas para a empresa. Os bancos emprestavam o dinheiro ao exportador e criavam uma conta no exterior onde recebiam o pagamento diretamente dos compradores dos produtos, os clientes da empresa exportadora. O risco para os credores, nesse caso, era o de a empresa não exportar - o chamado "risco de perfomance". Não há risco político, o chamado "risco-Brasil".

Mas, para pagar as operações de capital de giro em dólar ou de financiamento à importação, a empresa necessariamente tinha de fechar contratos de câmbio - entrar com seu dinheiro no Brasil para depois sair. O credor ficava sujeito, portanto, ao "risco de conversibilidade".

Agora, 30% de suas receitas no exterior podem ficar em dólar, em contas no mercado internacional. Os bancos podem realizar operações de financiamento à importação ou até mesmo de capital de giro vinculando o pagamento às receitas de exportação que ficam lá fora. "A tendência é de que, em operações estruturadas dessa maneira, o custo de um financiamento à importação ou de um empréstimo para capital de giro se torne cada vez mais próximo ao custo de um empréstimo à exportação", disse Ernesto Meyer, responsável pela área de empréstimos estruturados do banco francês BNP Paribas.

"As operações terão uma redução do risco político, com possível melhoria nos níveis de taxas de juros pagas pelas companhias", afirma Deborah Vieitas, diretora vice-presidente do BNP Paribas. Marcelo Marangon, chefe da área de corporate finance e de corporate banking do Citigroup, acredita que, no caso de empresas que são grau de investimento - têm o selo de investimento não especulativo -, a melhoria nos spreads dos financiamentos será "marginal", pois essas companhias já conseguiram uma redução de custos grande nos últimos meses. "As empresas exportadoras que estão próximas de chegar ao grau de investimento serão as mais beneficiadas", acredita Marangon. Deborah Stern Vieitas concorda.

As empresas que são grau de investimento já conseguiram classificação de risco de crédito externo superior à do Brasil justamente porque, com um grande volume de caixa, ativos ou liquidez disponível no exterior, conseguiram "mitigar" o risco de conversibilidade e de transferência, lembra Ricardo Carvalho, diretor da área de empresas da agência de rating FitchRatings.

Ele diz que o pacote é positivo para as empresas exportadoras, pois vai trazer maior flexibilidade à sua administração de caixa ao permitir que 30% das receitas com exportação fiquem no exterior. Além disso, as novas estruturas de empréstimos podem permitir redução no custo de financiamento e maior volume de crédito disponível. Ele acrescenta que um rating diz respeito à capacidade e vontade de pagamento de uma dívida empresa na mesma moeda na qual ela foi contraída e o pacote cambial amplia essa capacidade.

Ele não prevê, no entanto, nenhuma ação geral de elevação no rating das empresas e disse que vai acompanhar caso a caso. "Muitas empresas terão de continuar a ingressar no país com suas receitas, pois usam esse dinheiro para capital de giro e investimentos", disse o especialista.

O tamanho da dívida externa e outros compromissos em relação ao total de receitas que ficarão no exterior também serão observados, segundo ele, para a decisão de rating. "É preciso verificar qual a política que cada uma das tesourarias vai adotar", diz o especialista. "Não sei se a mudança será realmente relevante para algumas empresas - se não vai passar de uma mera economia de custos, sem impacto no rating", diz ele.