Título: Governo quer ampliar acesso das ZPEs ao mercado interno
Autor: Villaverde ,João
Fonte: Valor Econômico, 31/03/2012, Brasil, p. A4

O Brasil conta com 23 Zonas de Processamento de Exportação (ZPE), e a 24ª deve sair do forno nos próximos dias, quando a Casa Civil autorizar a criação da ZPE de Uberaba, em Minas Gerais. Nenhuma delas, no entanto, existe efetivamente - a maior parte sequer saiu do papel. Apenas uma, no Acre, conta com infraestrutura básica pronta.

Agora, o governo Dilma Rousseff definiu as seis ZPEs em que vê potencial para funcionar a partir do fim de 2014 e prepara uma força-tarefa para impulsionar os negócios. Isso inclui desde esforços junto a prefeitos para que acelerem (ou retomem) as obras de infraestrutura, até interceder junto ao Senado para aprovar projeto que amplia de 20% para 40% o percentual do que é produzido numa ZPE que pode ser destinado ao mercado interno.

São seis as zonas de processamento de exportação que recebem atenção total do governo: Senador Guiomard (Acre), Bataguassú (Mato Grosso do Sul), Parnaíba (Piauí), São Gonçalo do Amarante (Ceará), Jaboatão dos Guararapes (Pernambuco) e Barcarena (Pará). A única que já está pronta é a ZPE do Acre, como antecipou o Valor em janeiro. Entre as demais, a principal aposta do governo é a ZPE de Bataguassú - a única dentre as 24 ZPEs que não pertence ao poder público, mas sim a um grupo de seis empresários.

Criadas em 1988 por decreto do então presidente José Sarney, as ZPEs tiveram seu marco regulatório atualizado pela Lei 11.508, de 2007, que, segundo técnicos do governo, "já nasceu velha". Das 11 ZPEs criadas de 2007 para cá, apenas a do Acre foi inaugurada, mas ainda não há nenhuma indústria no local - há, sim, três projetos produtivos básicos, um deles do grupo peruano Glória, em análise no governo acreano.

O principal responsável pela política de "aceleração das ZPE" é Gustavo Fontenele, que desde o ano passado é o secretário-executivo do Conselho Nacional das Zonas de Processamento de Exportação (CZPE). Vinculado ao Ministério do Desenvolvimento, o CZPE é formado pelos ministérios da Fazenda, do Planejamento, de Integração Nacional, do Meio Ambiente e Desenvolvimento.

"Não faz mais sentido manter as regras dos anos 80. Quando as ZPEs surgiram, tinham também a função de trazer dólares, por meio das exportações, e auxiliar no equilíbrio do balanço de pagamentos", afirma Fontenele. Segundo ele, "o mercado doméstico é robusto, e foi fortalecido nos últimos anos pelo próprio governo, então as empresas que se instalarem lá poderiam reverter ao mercado interno uma parcela maior do que produzem", afirma o secretário.

Responsáveis pelas ZPEs que fazem parte da estratégia de aceleração do governo identificaram, ao Valor, as dificuldades para prospectar empresas. Pela legislação em vigor, as companhias instaladas em uma ZPE devem exportar no mínimo 80% do que produzem no local para ficarem isentos do recolhimento de tributos, como IPI, Cofins e PIS-Pasep, sobre os insumos adquiridos do mercado doméstico e importados. Isto é, apenas 20% da produção pode ser comercializada internamente.

O projeto para "destravar" as ZPEs reduz fortemente a exigência de conteúdo mínimo produzido pelas fábricas instaladas nas ZPEs que obrigatoriamente deve ser exportado. Caso o esforço do governo dê certo, o novo marco regulatório vai reduzir essa exigência mínima a 60%, podendo chegar a 50% para empresas que desenvolvem softwares ou que prestem serviços ligados à tecnologia da informação. O restante, vendido internamente, continuaria com a incidência dos impostos, tal qual previsto na lei atual.

No ano passado, o Palácio do Planalto fez chegar à senadora Lídice da Mata (PSB-BA) que o Projeto de Lei do Senado (PLS) 764, que altera o marco regulatório das ZPEs, apresentado pela senadora, contava com apoio da presidente. O ministro Fernando Pimentel, do Desenvolvimento, disse, em depoimento ao Senado no fim do ano, que era amplamente favorável às alterações. O projeto está na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado.

Os dirigentes ligados às ZPEs mais avançadas defendem fortemente as alterações. "Exigir que apenas 20% do que é produzido nas ZPEs possa ser vendido internamente, num momento em que o mercado doméstico é robusto e o mundo vive crise mundial, o que restringe a demanda por exportações, é muito pouco atrativo para as companhias", afirma Otávio Cançado, diretor-executivo da ZPE de Bataguassú, a "ZPE privada". Edvaldo Magalhães, secretário de Indústria do governo do Acre, concorda. Para ele, as negociações com as empresas seriam "facilitadas" com uma exigência menos rigorosa de nível de exportação.

Além disso, o governo conta com um trunfo jurídico. Há duas semanas, a 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que as vendas de produtos entre empresas instaladas na Zona Franca de Manaus são equiparadas à exportação, isto é, sobre elas não incide PIS e Cofins. O entendimento vale para as empresas que se instalarem nas ZPEs.