Título: MPF entra com ação por crime na ditadura
Autor: Resende,Thiago
Fonte: Valor Econômico, 14/03/2012, Política, p. A8

O Ministério Público Federal entra hoje com a primeira ação penal por crime cometido durante a ditadura militar. A denúncia contra um militar por sequestro durante a repressão à guerrilha do Araguaia, na região Amazônica, na década de 1970, vai ser protocolada na Justiça Federal em Marabá, no Pará. Até hoje só ações civis foram abertas por crimes na ditadura.

Na denúncia, o coronel aposentado do Exército Sebastião Curió é acusado de supostamente sequestrar cinco militantes: Maria Célia Corrêa (Rosinha), Hélio Luiz Navarro (Edinho), Daniel Callado (Doca), Antônio de Pádua (Piauí) e Telma Reina Cordeira (Lia). De acordo com investigação do MP, eles foram submetidos a agressões físicas e morais, e até hoje não foram localizados. Se condenado, Curió pode pegar até 40 anos de prisão.

Os procuradores envolvidos no caso afirmam que a ação não fere a Lei de Anistia, pois esta vale para crimes cometidos até agosto de 1979. "O sequestro tem natureza permanente e só termina quando a vítima é libertada ou localizada", explica o procurador da República Sérgio Gardenghi. O entendimento, segundo ele, é o mesmo do Supremo Tribunal Federal que mandou extraditar dois militares argentinos acusados de crimes durante a ditadura do país.

Com arquivos históricos e depoimentos recentes de testemunhas e ex-militares, por exemplo, a investigação concluiu que as vítimas foram levadas às bases militares comandadas por Curió, conhecido como Dr. Luchini. Esse é o "tipo de prova que cabe no momento, considerando as peculiaridades dos fatos", afirma o procurador Tiago Rabelo.

Curió é acusado de "participação material e intelectual" no desaparecimento dos cinco militantes. Além disso, ele é um dos poucos que ainda têm o conhecimento da localização das vítimas sequestradas, diz a denúncia. A apuração dos fatos seguirá e "há previsão legal para que outras pessoas sejam incluídas na mesma ação ou em outra ação", ressalta Rabelo.

Há menos de um ano, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) determinou que o Brasil deve investigar "eficazmente" os fatos ocorridos no caso Araguaia a fim de esclarecê-los. A sentença foi uma resposta a pedido de famílias brasileiras que recorreram à Corte diante da "ineficiência" da Justiça brasileira, diz Gardenghi.