Título: Produtividade sustenta aumentos reais
Autor: Lamucci, Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 03/08/2006, Brasil, p. A3

No primeiro semestre deste ano, os salários reais pagos no país foram 4,4% superiores àqueles pagos no mesmo período do ano passado, segundo a pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) que abrange seis regiões metropolitanas. Pelo menos desde 2002 (quando passou a valer a nova série histórica do IBGE) este é o maior aumento real pago aos ocupados neste período do ano. Na indústria paulista, o ganho acima da inflação foi ainda maior e ficou em 6,1% no primeiro semestre - o maior aumento semestral desde o começo da série, em 2001.

Mesmo com aumentos reais tão expressivos, os salários não estão sendo fator de pressão sobre a inflação. Para os economistas, os ganhos de produtividade da economia - e especialmente da indústria - ajudam a explicar por que os índices de preços continuam comportados neste cenário de robusto aumento da renda real. Também contribuem para a inflação baixa neste ano, o câmbio valorizado, o pequeno reajuste dos preços administrados e o choque agrícola.

Estimativas do economista-chefe do Credit Suisse, Nílson Teixeira, para a produtividade na indústria de transformação mostram que nos cinco primeiros meses do ano em relação ao mesmo período de 2005, a produção física por trabalhador cresceu 3,6% e a produção por hora trabalhada, 3,3%. Nesse período, a produção física da indústria de transformação cresceu 3%, enquanto houve queda de 0,6% do pessoal ocupado e de 0,2% das horas pagas.

Para o gerente da pesquisa mensal de emprego do IBGE, Cimar Azeredo, a maior formalização no mercado de trabalho, o reajuste de 16,6% do salário mínimo e a inflação baixa explicam a alta do rendimento dos trabalhadores. Azeredo nota que, em junho de 2005, 40,4% da população ocupada tinha carteira assinada; em junho deste ano, o número era de 41,2%. Empregos formais pagam salários mais altos, lembra ele.

A evolução do custo unitário do trabalho (CUT) também sugere que os aumentos salariais não vão jogar a inflação para cima. Segundo cálculos do Credit Suisse e do Bradesco, o CUT - uma medida que mostra a relação entre o salário médio e a produtividade da mão-de-obra - recuou nos cinco primeiros meses do ano. O Bradesco, por exemplo, avalia que, em maio, o CUT apurou queda de 0,7% em relação ao mesmo mês de 2005. Já o Credit Suisse estima um recuo de 2,5% do CUT na indústria de transformação nos cinco primeiros meses do ano em relação a igual intervalo do ano passado.

"A evidência de que os salários reais na indústria de transformação estão sendo reajustados por um índice igual ou inferior aos ganhos de produtividade sugere ausência de pressão inflacionária proveniente dos custos de mão-de-obra", diz Teixeira. Um aumento do CUT indicaria que os salários crescem a um ritmo superior ao da produtividade, o que afetaria a competitividade na indústria e traria riscos de pressão inflacionária.

Para os analistas do Bradesco, o bom comportamento do CUT "reforça o quadro favorável para a inflação neste ano, o que deve se manter com a continuidade dos ganhos de produtividade observados na indústria brasileira".

Segundo Teixeira, as medidas de produtividade são, em geral, influenciadas pelo comportamento dos investimentos. "Desde o começo do atual ciclo de crescimento do PIB, no terceiro trimestre de 2003, os investimentos se destacaram como um dos componentes mais dinâmicos", explica. Da segunda metade de 2003 até o primeiro trimestre deste ano, o PIB cresceu 10,4%, na série livre de influências sazonais, enquanto o investimento subiu 24%.

Com produtividade crescente, as empresas podem conceder reajustes salariais mais altos sem muitos problemas. "Os ganhos evitam que as companhias tenham que elevar preços para preservar a margem de lucro", diz Teixeira. Além da melhora de eficiência, o crescimento mais forte da economia e as perspectivas de que o PIB continue em expansão nos próximos meses também permitem que as empresas dêem aumentos reais para seus funcionários, avaliam os analistas.

Para o segundo semestre, a expectativa é que a renda continue a crescer a um ritmo razoável. O supervisor do escritório de São Paulo do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioecômicos (Dieese), José Silvestre Prado de Oliveira, diz que, com inflação mais baixa, fica mais fácil para as categorias negociarem a reposição da inflação passada e a obtenção de aumentos reais de salário.

Em 2005, de 604 negociações salariais analisadas pelo Dieese, 71,7% tiveram ganhos reais. Para Silvestre, esse percentual vai subir em 2006, em um cenário de PIB maior, queda dos juros, expansão do crédito e alta do investimento.