Título: Ausência do presidente irrita Agronegócio
Autor: Felício, César
Fonte: Valor Econômico, 03/08/2006, Política, p. A10

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva marcou ontem o seu afastamento do empresariado rural, ao não comentar no Congresso Brasileiro do Agronegócio as demandas do setor para o próximo mandato presidencial, ao contrário do que fizeram os candidatos do PSDB, Geraldo Alckmin, P-SOL, Heloísa Helena e PDT, Cristovam Buarque.

Os três oposicionistas gravaram depoimentos em vídeo com comentários sobre reforma tributária, incentivo às parcerias público-privadas (PPPs), reforço do poder político do Ministério da Agricultura, garantias contra invasão de terras e desenvolvimento sustentável, entre outros pontos. As entrevistas foram separadas em tópicos, como se os candidatos estivessem debatendo sobre si. Foi este formato que desagradou o comando da campanha de Lula, que decidiu não participar de debates no primeiro turno da eleição presidencial.

A atitude de Lula enfureceu a platéia. "Se este fórum fosse do MST, teria patrocínio do governo federal e o presidente teria vindo gravar. A ausência mostra a importância que ele dá ao agronegócio", afirmou, sob aplausos, o presidente da Sociedade Rural Brasileira, João Sampaio Filho. "A não manifestação já é uma posição. O presidente colocou deste modo a sua posição e a sua estratégia", disse o presidente da Organização das Cooperativas Brasileiras, Márcio Freitas.

"Registro a frustração. Negociamos esta participação por cinco meses, com diversos interlocutores. A decisão certamente veio do presidente, ou do líder de sua campanha (referência ao presidente do PT e coordenador da campanha, deputado Ricardo Berzoini ). Endosso totalmente os comentários dos meus pares", disse o presidente da Associação Brasileira de Agribusiness (Abag), Carlo Lovatelli.

Os empresários reagiram de forma irônica ou hostil aos depoimentos de Heloísa Helena e Cristovam Buarque e não pouparam elogios a Alckmin. A senadora do P-SOL foi rotulada como "divertida" por Lovatelli e "folclórica" por Sampaio Filho. Cristovam foi descrito como "prolixo, querendo agradar a todos" por ambos os dirigentes. Já Alckmin "está com a lição de casa na ponta da língua, sabe o que está falando", segundo Sampaio Filho; "tem uma posição estratégica firme", de acordo com Márcio Freitas e "está se afeiçoando cada vez mais aos temas do agronegócio brasileiro", para Lovatelli.

O candidato tucano foi cauteloso no depoimento, evitando se comprometer com as demandas mais específicas das entidades. Não assumiu o compromisso, por exemplo, de criar uma agência de defesa sanitária. Mas foi enfático ao afirmar que não irá tolerar invasões de terra, caso eleito presidente. Alckmin vinculou a redução de juros com o corte de gastos públicos e prometeu o envio de uma reforma tributária ao Congresso ainda em janeiro, sem detalhar que pontos da legislação sobre impostos desejaria mudar. Mencionou as reduções de ICMS por setores que promoveu quando governador de São Paulo.

"Hoje a política fiscal é ruim e a política monetária é muito dura. Quero inverter esta equação, o que certamente tornará o câmbio mais competitivo", disse o tucano. Alckmin fez uma promessa pontual: pagar metade do prêmio de seguro rural para pequenos agricultores e criar um fundo contra intempéries para os grandes produtores.

No seu primeiro pronunciamento público para o setor patronal, Heloísa Helena demonstrou consciência da distância de suas posições em relação ao agronegócio. "Sou democrática. Gosto de quem me enfrenta", afirmou a candidata do P-SOL, ao agradecer o convite. A senadora acenou com a concessão de subsídios aos agricultores que cumprirem metas de produtividade e com a desapropriação para os que não cumprirem.

"Quando não se faz reforma agrária, se faz ocupação de terra. No meu governo, não haverá ocupação de terra porque se fará reforma agrária", disse. Declarou-se contra as parcerias público-privadas e contra "qualquer diminuição do Custo Brasil que implique na redução de direitos trabalhistas".

Cristovam Buarque fez um apelo contra o estabelecimento de compromissos pactuais entre candidatos e setores organizados. "Robotizamos os candidatos, que perderam a capacidade de liderança e se tornam prisioneiros do imediatismo, dos segmentos e das corporações. Não podemos pensar só o setor", afirmou, discorrendo em seguida sobre suas propostas para a área da educação.