Título: Só para clientes
Autor: Cotias, Adriana
Fonte: Valor Econômico, 04/08/2006, EU & Investimentos, p. D1

Os bancos querem o cliente por inteiro e bater às portas de uma agência com o intuito de manter só aplicações é uma tarefa inglória, pouco disseminada no mercado brasileiro. A menos de dois meses para que a conta-investimento passe a valer também para as os recursos aplicados antes de outubro de 2004, a percepção é de que o mecanismo tirou a anomalia da CPMF nas trocas de investimentos, mas a livre mobilidade não estimulou a concorrência entre os principais administradores de recursos, como chegou a pregar o governo. A tributação regressiva atrapalhou e nesse meio tempo os juros reais estiveram num nível alto o suficiente para desencorajar mudanças de curso.

Conta-corrente, cartão de crédito, seguros, fundos e previdência - e toda a receita de serviços que advém desse relacionamento - compõem o cardápio completo exposto ao cliente. Nas estratégias de vendas cruzadas dos gigantes do sistema financeiro, sobra pouco espaço para o investidor de varejo barganhar taxas de administração menores ou retornos mais atraentes como poderia fazer, por exemplo, no supermercado, comprando só produtos em liquidação.

Ao visitar em São Paulo agências dos maiores bancos do país - Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Bradesco, Itaú, Santander Banespa e Unibanco - só na Caixa é que o gerente topou de cara abrir uma conta exclusiva para investimentos, sem tarifa. A condição era seguir o roteiro de abertura de uma conta convencional, apresentando CIC, RG, comprovantes de residência e de renda, conforme determina a Lei 10.892/04 que criou a conta-investimento.

No BB, um assistente de negócios disse não numa primeira abordagem, mas depois de uma consulta afirmou ser possível ter só a conta-investimento, que receberia depósitos exclusivamente em cheques ou por meio de Transferência Eletrônica Direta (TED). No Bradesco, a argumentação foi dirigida para as vantagens de se manter um relacionamento completo com o banco, quase não deixando fôlego para a aspirante a aplicadora sonhar com algo menos do que toda a cesta de serviços bancários.

Já no Itaú, Santander Banespa e Unibanco, os funcionários foram categóricos em afirmar que a conta-investimento tem de ser necessariamente vinculada a uma conta-corrente na mesma instituição.

"O Itaú optou por habilitar a conta-investimento apenas para quem tivesse conta-corrente, porque o banco é co-responsável pela documentação que poderia estar guardada em outra instituição", diz o diretor de Fundos, Moacyr Castanho. Mesmo entre os aplicadores que já estavam com o banco, não houve mudança significativa de comportamento. Ele lembra que em janeiro de 2005, poucos meses depois de a conta-investimento entrar em vigor, surgiram as regras de tributação regressiva, premiando o dinheiro aplicado no longo prazo com alíquotas menores - 15% acima de dois anos, até os 22,5% para até seis meses - o que inibiu a mobilidade.

Para Castanho, será a conjuntura de juros mais baixos que estimulará o trânsito de recursos via conta-investimento. Ganhando menos na renda fixa, o aplicador tende a buscar retornos extras, aceitando um pouco mais de risco.

O fim do pedágio da CPMF não era mesmo para provocar movimentações relevantes, defende o superintendente-executivo da Santander Banespa Asset Management, Edvaldo Morata. "A experiência internacional mostra que em países onde nunca existiu a limitação, não se observa grandes migrações entre as diversas formas de poupança ou entre administradores de recursos", diz. "O capital do investidor de longo prazo segue um fluxo mais ou menos conhecido e ser livre não significa supervalorizar a mudança."

Nos Estados Unidos, exemplifica, médico de família, advogado, contador e assessor de investimentos são os mesmos a vida inteira. Ele afirma que na rede do Santander Banespa é possível, sim, ter apenas a conta-investimento, mas que essa não é uma demanda trivial. Isso porque como o setor de investimentos é largamente dominado pelos grandes bancos, só uma pequena parcela da população é que trata a assessoria financeira como tema independente da prestação de serviços bancários.

Mesmo com a liberação da conta sem ônus da CPMF para todas as aplicações em dois meses, Osvaldo Mateos, da área de Investimentos do Unibanco, não espera mudanças. Segundo relata, o investidor de varejo costuma mexer no dinheiro mais por uma necessidade de fluxo, com resgates parciais, do que pela intenção de alterar a carteira. "A conta-investimento só pesa nos casos em que as quantias aplicadas são maiores e o investidor é mais especializado, tem uma relação mais próxima com o mercado."

Ele também afirma que no Unibanco é possível ter só a conta-investimento, reconhece que esse é um pedido incomum, mas que já há casos na rede, de investidores que gostam de distribuir a poupança pessoal entre várias instituições financeiras.

No jogo de rouba-montes do setor de fundos, a conta-investimento serve como isca para atrair novos clientes, diz o diretor-executivo do Bradesco José Munhoz. Para ele é errado, porém, o cliente manter apenas aplicações em determinada instituição. "A gente trabalha pela fidelização, para que o investidor tenha acesso a todo portfólio que o banco oferece." Em plena sintonia com o discurso da diretoria, a gerente da agência havia mostrado a cesta de serviços do banco, apontando que acima de R$ 14 mil aplicados, haveria isenção de tarifas.

Ter o dinheiro livre do ônus da CPMF não quer dizer que o aplicador deva pular de galho em galho na busca de retornos adicionais. O investidor tem de colocar na balança a alíquota de tributação e estimativa de retorno do investimento atual versus a rentabilidade esperada para a nova aplicação, sugere o presidente da BB DTVM, Nelson Rocha Augusto. "A diferença de imposto, na grande maioria dos casos, é maior do que a CPMF", diz. "E cada vez que muda de aplicação, o prazo decorrido para efeitos da tributação passa a contar do zero, na alíquota maior de 22,5%."